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C A P T U L O I I
REVISO DE LITERATURA
2.1. Introduo
Embora a escola se afirme como igual para todos, ela
constitui-se como obstculo
para muitos alunos. O desempenho escolar muitas vezes no o
desejado pelos pais,
pelos professores e, como natural, pelos alunos, sendo a
matemtica muitas vezes um
problema bem presente. Esta situao, de grande complexidade,
tratada pela expresso
insucesso escolar, a qual se reveste de um mistrio de incertezas
e hipteses quanto ao
descobrimento das suas causas concretas e medidas de
remediao.
Por outro lado, surge o professor de Matemtica, pois ele que,
como educador e
matemtico, est intimamente ligado aos seus alunos. No entanto, o
professor e a sua
prtica pedaggica so resultado de um conjunto de vivncias e
acontecimentos, que
efectivamente contribuem para a sua maneira de ser e actuar
enquanto professor.
Neste captulo vamos procurar encontrar, com base em diversos
autores, um suporte
para a interpretao e anlise de toda a temtica que envolve o
presente estudo, o
insucesso escolar em matemtica e o desenvolvimento profissional
do professor de
matemtica.
2.2. Insucesso escolar
A problemtica do insucesso escolar complexa e multiforme. Os
tipos de
insucesso so diversos. Diferenciam-se, vulgarmente, o insucesso
escolar do insucesso
educativo. Sem dvida, para alm de ensinar conhecimentos, a
escola deve assumir o
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papel de educar. Deste modo, os grandes desafios incumbidos
escola, podem ser
vistos em duas vertentes: em primeiro lugar, a actualizao e a
especializao dos
saberes, ou seja, requer-se, atravs dos contedos programticos e
da sua actualizao
regular, que o conhecimento cientfico produzido chegue aos
alunos tambm pela
escola (Morgado, 1999, p.9); em segundo lugar, requerida uma
formao global e
pessoal do indivduo, isto ,
torna-se necessrio um esforo de integrao e equilbrio entre a
disperso e especializao de conhecimentos e a globalizao da aco
educativa, de forma a evitar que a educao seja simplesmente
transmitir conhecimentos mas, fundamentalmente, a construo de um
projecto vivel para chegar ao futuro (Morgado, 1999, p.9).
Na mesma linha de pensamento, Pires, Fernandes e Formozinho
(1991, pp.187-
188) atribuem educao as finalidades de instruir, estimular e
socializar os
educandos, ou seja, visa a aquisio de determinados conhecimentos
e tcnicas
(instruo), o desenvolvimento equilibrado da personalidade do
aluno (estimulao) e a
interiorizao de determinadas condutas e valores com vista vida
em sociedade
(socializao) (id. p.188). Assim, pode dizer-se que se alguma
destas dimenses no
for atingida h insucesso na educao escolar.
O insucesso educativo toma deste modo uma dimenso abrangente,
extravasando
largamente o mbito do insucesso escolar, em que o presente
trabalho se centra.
Naturalmente no se pretende descurar a importncia fulcral que a
escola desempenha
no desenvolvimento das outras dimenses. Para realar esta ideia,
Pires, Fernandes e
Formozinho (1991, p.188) dizem
que na escola valorizada a instruo em detrimento de uma concepo
mais ampla de educao onde a dimenso personalista ... a dimenso
socializadora... so claramente subalternizadas. Frequentemente,
acontece que estas dimenses no so tomadas em considerao num juzo
global sobre sucesso ou insucesso escolar, quando realmente elas so
essenciais para caracterizar a eficcia do projecto educativo.
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2.3. Os diversos conceitos de insucesso escolar
De acordo com Benavente (1990), o insucesso escolar um problema
social que
preocupa pais, professores e alunos, comeando a ser mais falado
em Portugal a partir
de 1987.
Caracteriza-se o insucesso escolar pelo baixo rendimento escolar
dos alunos, que por
razes de vria ordem, no puderam alcanar resultados satisfatrios,
no atingiram os
objectivos desejados no decorrer ou no final de um determinado
perodo escolar e, por
conseguinte, reprovam. Pode ser tambm designado pela falta de
xito/mau resultado no
processo de ensino-aprendizagem.
Pires, Fernandes e Formozinho (1991, p.187) referem que o
insucesso escolar a
designao utilizada vulgarmente por professores, educadores,
responsveis de
administrao e polticos para caracterizar as elevadas
percentagens de reprovaes
escolares verificadas no final dos anos lectivos. Tambm Iturra
(1990, p.104) frisa que
o insucesso escolar um fenmeno de falhano na escola e define-o
como a
dificuldade que a escola tem de treinar mentes que j tm um
conhecimento cultural do
real. Em consonncia, contrape que o caminho para o sucesso
consiste em
domesticar uma mente na verdade histrica, cultural e
conjuntural. (...) A escola
precisa de pr as crianas no caminho da interrogao (Iturra,1990,
p.129).
Se nos reportarmos definio de insucesso escolar preconizada por
Fernandes,
citada na Enciclopdia Luso Brasileira (1980, p.162 ), insucesso
escolar designa a no
obteno ou no realizao de objectivos predeterminados pela
organizao escolar ou
pela instruo em si. Acrescenta, tambm que o termo insucesso um
conceito que
exige, a priori, um outro comparativo: mau resultado em relao
aos objectivos
escolares, falta de xito na aprendizagem, ausncia de eficcia na
interiorizao,
apreenso e assimilao dos conhecimentos (id, p.162).
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A definio ditada pelo Ministrio da Educao (1992, p.47) Unidade
Europeia da
rede Eurydice anuncia que, em Portugal, entende-se o insucesso
escolar como a
incapacidade que o aluno revela em atingir os objectivos globais
definidos para cada
ciclo de estudos.
Podemos atribuir o insucesso escolar instruo escolar, no que
concerne
incapacidade que o sistema educativo muitas vezes apresenta em
dar resposta a um
vasto nmero de problemas com que cada aluno se debate, podendo
conduzir ao
fracasso e, at mesmo, ao abandono escolar prematuro. Para
assinalar esta posio,
Iturra (1990) afirma que o insucesso escolar consiste na
dificuldade que as crianas
tm em aprender, em completar a escolaridade no tempo previsto,
em obter notas altas
ou pelo menos satisfatrias pelo seu trabalho escolar para
poderem continuar os seus
estudos.
Segundo este mesmo autor, relativamente a opinies de professores
que com ele
conversaram, existem duas razes pelas quais este fenmeno
acontece. Uma delas que
os estudantes no esto interessados em aprender e os seus pais tm
sobre eles
expectativas que vo alm das capacidades dos adolescentes. A
outra razo afirma que o
insucesso escolar dos alunos se deve no existncia de meios para
ensinar e
inexistncia de orientao pedaggica adequada. Iturra resume estas
duas razes com a
seguinte afirmao: ou os estudantes no esto aptos para aprender,
ou os professores
no esto aptos para ensinar (1990, p.15).
Neste momento surge a dvida se haver uma discrepncia entre o
desenvolvimento
integral da criana e as exigncias do sistema educativo propostas
para a sua fase etria.
Neste mbito, Le Gall refere que uma grande percentagem de
insucesso escolar se
relaciona com a inadaptao da personalidade da criana s exigncias
escolares (1978,
p.15). O mesmo autor salienta que nas escolas do ensino bsico,
colgios particulares ou
outras instituies de ensino confrontamo-nos com uma enorme
diversidade de
personalidades infantis, e quando as escolas e as suas exigncias
no se sabem adaptar a
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essas personalidades e condicionamentos psicolgicos que algumas
crianas tm, tal
pode levar ao insucesso escolar. Tambm para Le Gall, a adaptao
da criana escola
deveria ser feita juntamente com o professor, a escola, o aluno
e a famlia, indo cada um
ao encontro dos outros, para que deste modo fossem ultrapassadas
todas as dificuldades
e possveis falhas.
Para Muiz (1989, p.9), o insucesso escolar define-se como a
grande dificuldade
que pode experimentar uma criana com um nvel de inteligncia
normal ou superior
para acompanhar a formao escolar correspondente sua idade . Para
este autor, a
criana tem inteligncia normal ou superior ao normal desde que no
sofra de qualquer
leso cerebral, que seja assdua s aulas e que no tenha origem
numa famlia com um
nvel cultural muito baixo.
Rangel (1994) d-nos uma noo mais abrangente deste conceito. Para
esta autora, o
insucesso escolar significa a falncia de um projecto, assim como
a posio difcil em
que somos colocados pelos adversrios. No campo educacional,
significa o insucesso
num exame, bem como o afastamento definitivo da escola provocado
por repetncias
sucessivas (Rangel, 1994, p.20). A mesma autora complementa que
a noo de
insucesso escolar s tem sentido dentro de uma dada instituio
escolar e num dado
momento da escolaridade.
Assim, o termo insucesso escolar utilizado na realidade escolar
como a falta de
xito dos alunos face ao seu processo de ensino-aprendizagem, ou
seja, o fraco
rendimento/aproveitamento escolar dos alunos.
2.4. Teorias explicativas do insucesso escolar
Ao longo do tempo foram surgindo diferentes teorias destacando
vises diversas
sobre o insucesso. Assim, at final dos anos 60 reinou a teoria
dos dons. Esta teoria
explica o insucesso escolar atravs de aptides, as quais tm
origem no nvel
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intelectual expresso no Q.I. (Quociente de Inteligncia). Como
refere Benavente (1989),
citada por Ministrio da Educao (1992, p.7), o sucesso/insucesso
explicado pelas
maiores ou menores capacidades dos alunos, pela sua inteligncia,
pelos seus dotes
naturais.
No final dos anos 60 aparece a teoria do handicap scio-cultural,
a qual explica o
insucesso dos alunos pela cultura de que dispem entrada na
escola. Benavente
(1989), citada por Ministrio da Educao (1992, p.7), afirma que a
teoria do
handicap scio-cultural, baseada em explicaes de natureza
sociolgica, o
sucesso/insucesso explicado pela pertena social, pela maior ou
menor bagagem
cultural de que os alunos dispem entrada na escola.
Aps o incio dos anos 70 surge a teoria scio-institucional, a
qual destaca o papel
institucional na compreenso do insucesso do aluno. Tambm
Benavente (1989), citado
por Ministrio da Educao (1992, p.7), diz que a corrente
scio-institucional sublinha
a necessidade de diversidade e de diferenciao pedaggica pondo em
evidncia o
carcter activo da escola na produo do insucesso.
Nas trs subseces seguintes sero abordadas, mais detalhadamente,
cada uma
destas teorias explicativas do insucesso escolar.
2.4.1. Teoria dos dons
Desde o final da 2 Guerra Mundial at ao final da dcada de
sessenta vigorou a
chamada teoria dos dons ou dos dotes individuais, tida como
teoria explicativa das
causas do insucesso escolar (Benavente, 1990). A teoria em causa
explica o rendimento
escolar por dons pessoais e naturais do prprio aluno, ou seja,
era a inteligncia de
cada um que ditava o sucesso na escola (Corteso e Torres,
1990).
Deste modo, a teoria dos dons assenta na origem animal do Homem
e no carcter
fisiolgico de toda a actividade psquica. Atribu-se natureza do
indivduo a
responsabilidade pelas desigualdades intelectuais e considera-se
que as mesmas eram
determinadas pela hereditariedade (Benavente e Correia,
1980).
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Nestas perspectivas hereditrias argumenta-se que a inteligncia
da criana
hereditria e que os factores genticos tm uma importncia
fundamental para se
compreender as diferenas entre classes sociais. Poder-se- dizer
que se as crianas
fracassam na escola, isso deve-se aos seus genes e no ao
contexto, contedo e
metodologia pedaggica.
Poder-se- afirmar que a perspectiva psicolgica aborda o
insucesso escolar como
sendo um problema individual respeitante a cada criana, ou seja,
ela apresenta
problemas de dislexia, disgrafia, discalculia, disortografia e
problemas congnitos que a
levam a ter dificuldades numa longa escolarizao. Como refere
Rangel (1994, p.40),
uma srie de disortografias, de discalculias, de dislexias
apareciam para tentar
explicar esse gnero de dificuldades.
Para Pereira e Martins (1987), nesta anlise explicativa do
insucesso escolar, a
criana entraria num ciclo de repetncias na escola devido ao seu
nvel intelectual no
ser compatvel com a escolaridade normal, isto , as dificuldades
escolares estavam em
grande parte associadas a dificuldades cognitivas das crianas.
Esta ideia surge da
constatao de que o Q.I. mdio nas classes mais baixas inferior ao
Q.I. mdio das
classes consideradas mdia e alta. Esta teoria explicativa
justifica a razo por que as
classes trabalhadoras no atingem percentagens altas de frequncia
no ensino superior,
j que um nvel de inteligncia baixo um obstculo ao acesso a este
nvel de ensino.
2.4.2. Teoria do handicap scio-cultural
Os inmeros estudos sobre a inteligncia e sobretudo os trabalhos
de Sociologia da
Educao contriburam para o aparecimento de uma nova teoria
explicativa do
insucesso escolar a teoria do handicap scio-cultural, em que o
sucesso/insucesso
dos alunos explicado pela sua pertena social, pela maior ou
menor bagagem cultural
de que dispem entrada na escola (Benavente, 1990, p.6).
Trata-se de uma teoria que encara o insucesso escolar como um
fenmeno social e
que o explica pela maior ou menor bagagem cultural que o aluno
dispe entrada da
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escola, ou seja, o insucesso escolar passa assim a ser entendido
como o resultado de
desigualdades sociais (Benavente, 1987).
Para Rangel (1994), nesta abordagem do insucesso escolar as
investigaes so
centradas na famlia e na sua herana ou cultura. Deste modo, esta
teoria refere que as
crianas dos meios rurais tm uma experincia diferente daquela que
caracteriza as
classes mdia e alta dos meios urbanos. Neste caso, as formas de
linguagem so as
responsveis pela possibilidade ou impossibilidade das crianas
adquirirem
competncias/conhecimentos que lhes possibilite ou condicione o
sucesso escolar e
profissional.
A linguagem , e sempre foi, indispensvel para a criana aceder
comunicao,
sendo um processo privilegiado de enriquecimento de experincias
que influenciam a
aprendizagem. E devido existncia de obstculos, tais como: um
espao fsico pouco
desenvolvido e uma pobre herana social e cultural da criana, que
estas no iro
desenvolver uma linguagem compatvel com a que promovida na
escola e,
consequentemente, todo um conjunto de experincias que podero
levar ao sucesso
escolar.
Neste contexto, a criana desfavorecida ou com handicap
sociocultural e lingustico
aquela que vem de um meio diferente e que ao entrar na educao
formal
confrontada com a linguagem utilizada pelo professor, o que a
pode perturbar, segundo
se trate de uma linguagem mais ou menos diferente da que usada
no meio onde se
encontra inserida.
Pereira e Martins (1987, p.50), referem que se a escola no
respeitar as suas ideias,
opinies e vivncias, ento a criana deixa de se sentir vontade no
universo escolar,
aparecendo-lhe este, inevitavelmente, como estranho.
Por este facto e como refere Bernstein (1975), citado por
Pereira e Martins (1987),
necessrio que o professor se esforce e compreenda melhor a
linguagem das crianas
dos meios desfavorecidos em vez de persistir em alter-la.
Pensa-se que importante o
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facto do professor compreender a linguagem destas crianas, j que
s a partir dessa
compreenso o professor poder facilitar redes comunicacionais
entre ele prprio e a
criana. Tal significa que ao existirem redes comunicacionais
slidas, o processo de
ensino e aprendizagem poder ser adaptado s realidades destas
crianas.
Neste contexto, poder-se- colocar a seguinte questo: O facto de
o professor no
se esforar por compreender a linguagem familiar da criana e
tentar alter-la, poder
levar ao insucesso dos alunos?
Naturalmente que se o professor actua em disfuno com o meio onde
est inserida a
escola, ser difcil criar um ambiente de aula que favorea a
comunicao interactiva,
assim como os mtodos pedaggicos no estaro adaptados ao meio,
reflectindo-se num
desequilbrio do processo de ensino-aprendizagem, o que pode, sem
dvida, levar os
alunos ao insucesso escolar.
Na realidade, em relao ao insucesso escolar, alm de selectivo e
precoce,
constante, massivo e cumulativo, existindo em todos os graus de
ensino, h indicadores
de que quanto mais um aluno reprova, mais facilidade tem em
voltar a reprovar
(Benavente e Correia, 1980).
Em Portugal, estatsticas referentes a 1983, apontam 43% como
mdia nacional de
repetncias na primeira fase e cerca de 30% na segunda fase
(Benavente, 1987, p.11).
Associadas noo de handicap sociocultural, para explicar o
insucesso escolar das
crianas, esto as investigaes relativas desigualdade de
oportunidades perante o
ensino. Uma criana com dficits lingusticos e culturais ter uma
menor
disponibilidade de meios, atitudes e motivao para competir com
os considerados
alunos ideais.
Seguindo esta linha de raciocnio, Bordieu e Passeron (1985,
citados em Rangel,
1994) sublinham a distribuio desigual das oportunidades
escolares segundo a origem
social. Estes autores consideram que as crianas so herdeiras da
dimenso cultural da
sua famlia e se estas so provenientes de meios sociais
desfavorecidos, onde o capital
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social e econmico baixo, tm menos possibilidades de xito na
escola e so aquelas
que mais insucesso apresentam.
Os principais problemas em lidar com crianas de diferentes meios
sociais so: a
instruo, a disciplina e a aceitabilidade moral. O problema da
instruo depende do
nvel social da famlia, logo reflecte-se em dificuldades nas
actividades escolares,
tornando-se uma tarefa difcil para o professor. Quanto
disciplina, um dos principais
problemas com que se deparam os professores, sendo mais
frequente a indisciplina no
caso dos alunos das classes sociais mais baixas. Em relao
aceitabilidade moral, a
criana das classes mais baixas so aquelas que mais ofendem a
sensibilidade moral dos
professores, isto porque so as que praticam mais frequentemente
actos como fumar,
beber e no tm hbitos de higiene considerados bsicos. Estes
factores contribuem para
a formao de expectativas relativas vida acadmica dos alunos, as
quais se
constituem como condicionantes do seu xito escolar.
Esta teoria deixa de culpar apenas os filhos para culpar tambm
os pais que, no
tendo meios para lhes assegurar condies favorveis a uma educao
adequada, os
colocam numa situao de desigualdade perante os colegas de um
meio social mais
favorecido.
2.4.3. Teoria scio-institucional
Atendendo ao facto de que nos pases ditos desenvolvidos a
melhoria do nvel de
vida scio-econmico no fez anular o insucesso escolar,
mantendo-se essencialmente
inalterado, a teoria do handicap scio-cultural comeou a perder
fora para dar lugar a
uma nova teoria a teoria scio-institucional. Nesta teoria
destacado o papel
institucional na compreenso do insucesso escolar.
Ultrapassado algum fatalismo, presente na teoria do handicap
scio-cultural, passa-
se a investir na transformao da prpria escola, nas suas
estruturas, contedos e
prticas, procurando adapt-la s necessidades dos diversos pblicos
que as
frequentam, elucidando subtis mecanismos de reproduo de
diferenas e procurando
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caminhos de facilitao das aprendizagens para todos os alunos
(Benavente. 1990,
p.7).
O insucesso escolar torna-se, assim, uma realidade cada vez mais
abrangente. Na
dcada de oitenta visto como um fenmeno relacional que envolve
factores de
natureza poltica, cultural, institucional, scio-pedaggica e
psicopedaggica; tem a ver
com as relaes que a escola estabelece com os alunos que vm de
meios mais afastados
dos saberes letrados, tem a ver com as dificuldades que a escola
(baseada na igualdade
formal e numa suposta neutralidade) tem em se relacionar com os
alunos social e
culturalmente diversos (Benavente, 1980, p.24).
Deste modo, a teoria scio-institucional explica o fenmeno do
insucesso escolar
atravs de uma abordagem conflitualista, na medida em que o
insucesso escolar
atribudo s relaes de classes. Nesta perspectiva, o professor um
agente de execuo
ao servio das classes.
Rangel (1994) defende que nenhum modelo cultural de classes , em
si, superior aos
outros e se existe um modelo dominante porque este imposto por
uma classe
dominante. A autora refere ainda que a escola considerada por
Althusser (1970) como
o aparelho ideolgico do Estado e Bordieu e Passeron (1970)
salientam o facto de que
tambm a escola a responsvel pela reproduo das relaes
sociais.
Nesta linha de pensamento encontra-se Lurart (1978, p.23) ao
referir que a escola
desempenha um importante papel como difusora da ideologia
dominante. Para esta
autora, a ideologia dominante transmitida pela escola um factor
de insucesso para
certas crianas, mais especificamente as crianas do meio rural,
porque corresponde a
uma rotura com a prtica e com a realidade a que esto
habituados.
Esta teoria atribui responsabilidades escola pelo insucesso
escolar, argumentando
que as prticas escolares e pedaggicas tm por base o modelo de
aluno ideal,
penalizando com maior frequncia os alunos mais desfavorecidos.
Corteso e Torres
(1990, p.81) consideram que de facto a cultura que a escola
ministra, nomeadamente o
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seu cdigo lingustico, aquele que predomina na sociedade. Se a
criana o no
possui, ela fica menos apta para vencer na vida e, seno se lhe
proporciona esse cdigo,
est-se a contribuir para agravar a desigualdade social. O
insucesso escolar, alm de
massivo e socialmente selectivo, constante e cumulativo, no se
podendo deixar de
fora a escola na explicao deste fenmeno.
Nos pases desenvolvidos que resolveram problemas extremos de
subdesenvolvimento, de fome e sade, de nvel de vida e
escolaridade, o insucesso no
desapareceu. Assim, este continua a ser um fenmeno importante e
selectivo, embora
em percentagens mais baixas em relao s percentagens dos pases
que ainda sofrem
de tais problemas.
Gomes (1987) refere que durante o sculo XIX o sistema educativo,
dando como
exemplo o ensino secundrio, estava organizado em bases
estritamente classicistas, ou
seja, existiam diferentes tipos de educao secundria
administrando ensinos sociais e
escolares muito diferentes. Como consequncia, no final dos
estudos reproduzia-se a
diviso social do trabalho e a estrutura de classes igualmente
diferenciadas e
hierarquizadas. Refere ainda que em Portugal os liceus forneciam
populao escolar
das classes mdia e superiores um ensino do tipo acadmico,
proporcionando-lhes o
ingresso nas universidades. Por outro lado, para as classes mdia
e baixa existiam
escolas tcnicas comerciais e industriais que davam acesso aos
sectores secundrios e
tercirios. Como salienta Gomes (1987), argumentando com a ideia
de Becker,
introduz-se, deste modo, o conceito de cliente ideal do aparelho
escolar.
Para Becker, citado por Gomes (1987, p.32), a diversidade
sociocultural que
caracteriza a populao escolar arrasta consigo srios problemas de
adaptao ou
ajustamento para os profissionais do ensino, j que se vem
envolvidos numa situao
em que so obrigados a interagir com uma clientela escolar que,
em certos casos, se
afasta ostensivamente dos seus padres e ideias.
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Cabe escola fomentar e assegurar a mudana. A escola tem de se
organizar de
forma a proporcionar a todos os alunos oportunidade de se
realizarem. Mais do que
nunca tem de assumir as suas funes sociais interagindo numa
reciprocidade com o
meio. Compete-lhe ser dinmica de modo a identificar e
ultrapassar obstculos,
actuando de forma realista e adequada em cada momento e em todas
as situaes.
Os professores/educadores devero construir uma escola que
conduza todos os seus
intervenientes alunos, pais, professores a uma realizao
individual e social.
Como se acabou de referir, existem vrias teorias que propem
explicaes para o
insucesso escolar dos alunos. A abordagem psicolgica do
insucesso escolar parte do
pressuposto que este tem como causa principal as diferenas
individuais de cada
criana. A abordagem sociolgica explica o insucesso escolar
atravs das componentes
sociais e, assim, surge a famlia como principal responsvel, j
que as crianas so as
herdeiras da cultura familiar de onde so oriundas. A criana tem
uma viso inicial do
mundo no seio da famlia, onde inicia o seu processo de
socializao atravs da
aquisio de atitudes e valores indispensveis sua vida social
futura.
Segundo Marques (1992), quando os valores da escola coincidem
com os valores da
famlia, quando no existem rupturas culturais, a aprendizagem
d-se com mais
facilidade. Mas, hoje em dia, cada vez mais as escolas tm uma
comunidade estudantil
heterognea, onde os pais e professores apresentam razes
culturais bem diversas. No
ter em conta este factor, desconhecer os valores da famlia, pode
significar no perceber
uma criana em risco, levando-a ao insucesso.
Na abordagem scio-institucional, o insucesso atribudo s relaes
de classe.
Neste contexto, surge a escola e mais especificamente o
professor como o principal
responsvel pela fraca aprendizagem das crianas na escola. Outras
causas exteriores
criana tm peso no insucesso, as quais tm a ver com a prpria
famlia da criana e
com a escola.
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O insucesso escolar afinal um fenmeno relacional que envolve
factores de
natureza poltica, cultural, institucional, sociopedaggica e
psicopedaggica,
dependente das relaes que a escola estabelece com os alunos
social e culturalmente
diversos. Essas relaes vo desde a rede escolar, desigual no pas,
aos critrios social e
culturalmente dominantes na escola, das normas e dos
comportamentos esperados e
exigidos, at s prticas escolares e pedaggicas que nela se
desenvolvem.
Em jeito de concluso, e numa viso geral das trs teorias, pode-se
dizer que
inicialmente as origens do insucesso escolar residiam apenas no
aluno. Pela ausncia de
capacidades, ele no transitava, no era aprovado, tinha de
repetir para tentar uma nova
oportunidade, muitas vezes sem resultados positivos.
Numa fase posterior, as causas de insucesso escolar centraram-se
na origem scio-
cultural dos alunos, no abrangendo, porm, as expectativas da
escola. Para atenuar as
diferentes origens scio-culturais, foram implementadas
actividades com o intuito de
minorar as lacunas que o aluno trazia logo entrada na escola
Finalmente, a escola tambm posta em causa e investe-se na
transformao da
prpria escola, nas suas estruturas, contedos e prtica,
procurando adapt-la, s
necessidades dos diversos pblicos que a frequentam. (Benavente,
1989, citado em
Ministrio da Educao, 1992, p.8).
2.5. Factores de insucesso escolar
O no acompanhamento pelo aluno das aprendizagens desencadeia
alguma
repugnncia e muitas vezes constrangimento para os pais, alunos,
professores e at
mesmo prpria instituio de ensino, e por conseguinte ao Estado.
Onde estar a
origem deste problema? difcil chegar a um consenso, pois os
interesses e
perspectivas dos envolvidos, directa ou indirectamente, so muito
divergentes.
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Na realidade existe um leque diversificado de factores
responsveis pelo fraco
desempenho escolar, e muitas vezes este insucesso socialmente
inaceitvel, quer numa
perspectiva individual quer colectiva.
Antes de invocar os factores do insucesso escolar, considera-se
oportuno aduzir,
mesmo que de forma muito superficial, os indicadores do
insucesso escolar, que podem
ser internos ou externos.
De entre os indicadores internos, o Ministrio da Educao (1992)
aponta a
repetncia, os resultados dos exames, a distribuio dos alunos por
diversas vias de
ensino, o atraso escolar, o absentismo, o abandono e o
sentimento pessoal. Refere como
indicadores externos a distribuio dos alunos pelos cursos
ps-escolaridade
obrigatria, dificuldades de insero na vida activa, desemprego
dos jovens,
analfabetismo e iletrismo e, por fim, a delinquncia e o abuso de
drogas.
Trs dessas manifestaes permitem averiguar a prpria eficcia do
sistema
educativo, sendo elas: o abandono escolar antes de terminar o
ensino bsico; as
reprovaes sucessivas que originam uma grande discrepncia entre a
idade cronolgica
do aluno e o nvel escolar, podendo os nveis de fracasso ser a
todas ou quase todas as
disciplinas, ou a nvel parcial numa ou duas disciplinas; e a
escolha dos alunos por tipos
de ensino menos exigentes, que o encaminham para aprendizagens
profissionais
imediatas, mas distanciando-o do ingresso no ensino
superior.
Sendo assim, pode dizer-se que o insucesso escolar pe em causa a
vida escolar dos
alunos e pode eventualmente alterar, at mesmo prejudicar, o
desenvolvimento integral
do aluno.
De acordo com estudos realizados por vrios autores, entre eles
Iturra (1990), Lurat
(1978) e Pires, Fernandes e Formozinho (1991), as causas do
insucesso escolar so
mltiplas e por vezes contraditrias, mas quase todas se
relacionam com factores
ligados ao prprio aluno, ao nvel scio-econmico e cultural da sua
famlia, escola
enquanto instituio e aos elementos que nela trabalham,
designadamente o professor.
-
29
Neste quadro, sero analisados em seguida tais factores de modo a
permitir uma
viso mais pormenorizada da questo.
2.5.1. Aspectos relativos ao aluno
Durante muito tempo a responsabilidade do sucesso/insucesso foi
atribuda apenas
ao aluno. Cada aluno tem as suas prprias caractersticas que,
como Piaget referiu, tm
influncia no ritmo da sua aprendizagem. O aluno muitas vezes
alvo de determinadas
carncias que influenciam negativamente o seu aproveitamento
escolar. Vamos,
seguidamente, abordar alguns factores que explicam a origem do
insucesso no aluno.
Para Avanzini (s.d.) existem vrios factores que podero conduzir
a situaes de
insucesso escolar. Entre o conjunto dos factores referidos por
este autor, alguns
atribuem a origem do insucesso ao prprio aluno. O aluno pode ter
dificuldades por
apresentar insuficincia intelectual, devendo-se esta
insuficincia a causas de tipo
neurolgico ou podendo ser uma consequncia de um meio de origem
pouco
estimulante do ponto de vista do desenvolvimento cognitivo,
tendo assim a insuficincia
intelectual um carcter social.
Tambm Le Gall (1978) refere como origem do insucesso escolar do
aluno o seu
quociente intelectual. Nesta mesma linha de pensamento, Pires,
Fernandes e
Formozinho (1991, p.189) indicam a inexistncia de aptides do
aluno, que podem
ser de origem psicossomtica (alunos deficientes) como de origem
intelectual
(determinada atravs de quocientes de inteligncia). Peixoto
(1999) aponta igualmente
o nvel intelectual como um aspecto ligado ao insucesso escolar
quando diz que
medida que caminhamos do alto para o baixo nvel intelectual
diminui a percentagem de
sujeitos com zero reprovaes (p.138).
A preguia outro dos factores apresentado por Avanzini (s.d.).
Nesta ptica, este
autor procurou encontrar motivos que permitissem compreender o
porqu deste
comportamento. Um dos motivos prende-se com a obrigatoriedade
das tarefas escolares,
que provavelmente, muitas delas, no fazem parte do leque de
interesses do aluno. Por
-
30
outro lado, a lentido, ou mesmo recusa, na realizao das tarefas
escolares poder ser
uma forma de irritar o adulto, bem como ser um indcio de uma
atitude de desinteresse
pelo trabalho, podendo permanecer durante a idade adulta.
Avanzini (s.d.) refere ainda
que a preguia poder ser um efeito de situaes de insucesso
escolar.
A auto-estima outro aspecto considerado como um factor
relacionado com o
insucesso escolar. Segundo um estudo feito por Peixoto (1999,
p.130), medida que
caminhamos da alta para a baixa auto-estima diminui a
percentagem de sujeitos com
zero reprovaes.
A diferena de atitudes e comportamentos dos alunos em contexto
escolar, segundo
Fontaine (1990), interfere, directa ou indirectamente, na
realizao e satisfao
escolares (p.95). A capacidade intelectual geralmente
apresentada como o principal
factor explicativo das diferenas de rendimento escolar dos
alunos. No entanto, este
factor no explica mais do que a quarta parte da variao dos
resultados escolares,
segundo a mesma autora. Assim, algumas razes que poderiam
explicar essas diferenas
de rendimento escolar estariam relacionadas com atitudes, tais
como a falta de
participao e interesse, ansiedade durante a avaliao, uma
alimentao deficiente dos
alunos e faltas de cuidados de sade, sobretudo no que diz
respeito aos olhos, ouvidos e
dentes; fraca frequncia escolar, deficincias congnitas e mentais
e o prprio
desinteresse e baixa auto-estima do aluno constituem tambm para
Lurat (1978)
factores a ter em conta no insucesso dos alunos a Matemtica.
Ainda Pires, Fernandes e Formozinho (1991, p.189) sublinham os
factores
socioculturais como as principais causas das carncias do aluno
que acede educao
escolar numa situao de desvantagem, relacionando a causa do
insucesso escolar com
factores como a cultura informal da famlia e do meio ambiente,
habitat do aluno
(cidade/campo), nvel econmico da famlia (p.189).
Le Gall (1978, p.15) atribui uma grande percentagem de
insucessos escolares
inadaptao da personalidade da criana s exigncias escolares,
referindo que a
-
31
personalidade desempenha um papel de causa adjuvante e que as
diferentes instituies
de ensino no souberam adaptar-se aos condicionamentos
sociopsicolgicos da
populao escolar. Aponta, ainda, que esta adaptao deveria ser
realizada pelo aluno e
professor, indo cada um ao encontro do outro e a escola devia
encaminhar tais aces de
forma convergente.
Destes factores, muitos deles exercem influncia mesmo antes do
aluno iniciar a sua
escolarizao e prolongam os seus efeitos ao longo de toda a sua
escolaridade. Deste
modo, h desde logo uma desigualdade de oportunidades, quer no
acesso educao
escolar quer no sucesso escolar do aluno.
Outro aspecto a referir o perodo de gestao, em que o prprio
estado psicolgico
da me, ansiedades, depresses, etc., pode ter repercusses, por
vezes graves, no
sistema neurovegetativo, assim como alguns factores hereditrios
podem estar na
origem do insucesso escolar.
O facto do aluno rejeitar o professor, no permitindo a criao de
laos de amizade,
pode influenciar a sua aprendizagem, assim como a estruturao
morfopsicolgica e
fsiolgica da criana, timidez, inibio, falta de autoconfiana, ser
muito introvertida,
ser em demasia preocupada com aspectos de vria ordem, levam
desconcentrao,
nervosismo, etc. Tambm deficincias a nvel dos sentidos, pouca
memria visual e
dislexia podem explicar dificuldades de aprendizagem.
Pode afirmar-se que o insucesso escolar pode advir de tantas
causas que se revelam,
em muitos casos, interdependentes umas das outras, tornando-se
numa miragem
procurar definir uma causa simples e objectiva para justificar o
insucesso escolar do
aluno.
2.5.2. Aspectos relativos ao sistema escolar
Outros aspectos que podem estar na origem do insucesso escolar
do aluno situam-se
ao nvel da estrutura escolar.
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32
Pires, Fernandes e Formozinho (1991, p.189) referem um conjunto
de factores
escolares que podem estar na origem do insucesso escolar, como
tipo de cursos e
currculos, estruturas e mtodos de avaliao, formas de agrupamento
dos alunos,
preparao cientfica e pedaggica dos professores.
Martins (1991) tambm considera que o insucesso escolar pode ter
origem no
prprio Sistema Escolar. Este autor refere ainda que as causas
socioculturais e culturais
so as maiores responsveis pelo insucesso escolar massivo dos
alunos provenientes
das classes mais desfavorecidas (p.14). A explicao para a grande
incidncia destas
causas prende-se com o facto de a escola privilegiar os saberes
acadmicos, no
incluindo convenientemente nos planos de estudos saberes mais de
acordo com a
realidade de muitos alunos. Os saberes acadmicos obrigam ainda a
uma abstraco que
no est de acordo com os cdigos lingusticos e posturas das
classes mais baixas ou
marginais ao sistema de valores dominante (Martins, 1991, p.14).
As dificuldades ou
mesmo a incapacidade que os alunos tm em perceber as mensagens
vo assim criar
obstculos aprendizagem e conduzem ao insucesso dos alunos. De
igual modo, a
reprovao no parece apresentar vantagens para o aluno, pois que
este ir desenvolver
comportamentos especficos e desenvolver uma imagem que no
propcia ao bom
aproveitamento escolar.
O insucesso escolar tem tambm sido atribudo, por pais e muitos
professores,
utilizao do mtodo tradicional. Segundo Avanzini (s.d.), este
mtodo tradicional no
toma em linha de conta a realidade especfica de cada criana. A
iniciativa na
organizao de todas as actividades, nomeadamente a nvel do
programa e separao
das disciplinas, assumida unicamente pelo professor. Assim, este
mtodo encarado
como factor explicativo para situaes de insucesso escolar por se
basear unicamente
em interesses extrnsecos aos alunos. Para contrariar esta
situao, o professor deve
utilizar metodologias variadas e inovadoras, as quais necessitam
ser dinmicas, tornar
-
33
os contedos o mais reais possvel, a comunicao aliciante e
acalorada, de modo a
corresponder a todas as necessidades psicolgicas dos alunos.
No que se refere ao programa, Jacinto (1991) defende que este
privilegia os alunos
dos meios mais favorecidos, pois os seus contedos vo ao encontro
da sua cultura, da
experincia do seu meio, colocando automaticamente em situao de
desvantagem os
restantes alunos. Partindo deste pressuposto, cabe perguntar: At
que ponto a
organizao e seleco dos programas no ser um factor de insucesso
escolar?
Muitas vezes os programas encontram-se desfasados da realidade
onde so aplicados
e revela-se importante ter em conta determinados aspectos na
planificao dos
programas. Concretamente, considerar a utilizao de objectivos
nacionais, regionais
ou, mais precisamente, peculiares escola ou classe pode ser um
meio eficaz de
melhorar o ensino ao centrar a ateno sobre certos domnios
precisos e ao ligar ensino
e avaliao (OCDE, 1992, p.213). Benavente (1990), numa entrevista
que fez a um
professor, destacou o facto deste se referir aos programas como
todos iguais, tanto para
filhos de engenheiros como de operrios (p.289) e que as crianas
favorecidas esto j
bem dispostas para a aprendizagem, tm outros meios, outro
conforto, outras condies,
(...) podem acertar mais facilmente as matrias que se trabalham
na escola . Os
programas e os manuais so, muitas vezes condicionadores das
prticas desenvolvidas
nas salas de aula, as planificaes so formais concebidas a partir
do programa e das
necessidades educativas dos alunos. Porm, os programas no podem
ser rgidos mas
adaptveis s constantes mudanas e necessidades.
Os professores tambm se sentem inseguros na medida em que os
programas so
alterados com alguma frequncia e no so acompanhados de
estruturas de apoio que os
ajudem a ultrapassar dificuldades intrnsecas s mudanas
(Benavente, 1990).
No mesmo estudo j referido, Benavente verificou que 61% dos
professores
inquiridos sentiu dificuldades no domnio dos novos programas,
nomeadamente em
expresso plstica, msica, sade, etc. por no terem tido qualquer
formao, a nvel
-
34
material, pela falta de meios inerentes concretizao dos
programas e a nvel da gesto
do prprio programa face diversidade dos alunos.
Grande parte dos professores continuam a trabalhar isoladamente,
ainda que no
mesmo espao fsico, pelo que a interpretao dos programas parece
estar ao critrio de
cada um. Esta situao, em certos casos, poder levar ao insucesso
motivado pela
diversidade de gesto e exigncias dos professores. A estas
dificuldades, juntam-se
ainda o medo de no se cumprir o programa face sua extenso.
Referindo-se ao professor, Avanzini (s.d.) defende que este
dever ser para os
alunos um modelo de identificao, tal como os pais. Deste modo,
no acesso profisso
docente a personalidade deveria ser tida em conta, tal como a
preparao cientfico-
pedaggica. Professores com uma personalidade indiferente,
frustrada, severa ou
inferiorizada no se revelam hbeis no estabelecimento de um bom
relacionamento com
os alunos. Mart e Guerra (dir.) (1997, p.21) mencionam que tem
vital importncia as
bases humanas que formam o perfil do bom professor. H qualidades
como a
maturidade pessoal [entre outras] que, sobretudo na juventude,
constituem um elemento
de referncia necessrio para um desenvolvimento equilibrado.
Assim, o domnio
relacional revela-se de considervel importncia para o sucesso
escolar, pelo que as
competncias relacionais e a estrutura de personalidade deveriam
ser aspectos a tomar
em considerao na prtica pedaggica e na seleco de professores. A
este respeito,
Sprinthall e Sprinthall (1993, p.21) afirmam que o ensino algo
de intensamente
pessoal. Como possvel pensar num professor separado dos seus
alunos, como um
estrangeiro no pas dos alunos? (...) O ensino um processo
interpessoal. Tem de
envolver o corao e a alma, e no apenas a mente. De acordo com a
OCDE (1992,
pp.214-215), quatro objectivos se impem para se ser um bom
professor: atrair bons
elementos; dar uma melhor formao aos novos docentes; tomar
medidas para manter
a competncia dos docentes em exerccio; de uma forma geral,
procurar melhorar o seu
moral e a sua motivao.
-
35
Gomes (1987) e Luart (1978) so unnimes em considerar que
vulgarmente um
professor no incio das aulas faz uma classificao das crianas em
bons e maus alunos,
e segundo estas expectativas que vai agir. De facto, ao rotular
os alunos o professor,
ainda que indirectamente, pode promover o insucesso. Esta
atitude naturalmente
indesejvel, pois deste modo estar a seleccionar os melhores (do
seu ponto de vista) e
no a educar igualmente todos os seus alunos.
Ao professor compete compreender os alunos, conhecer as suas
necessidades e
exigncias, ser tolerante, mas ao mesmo tempo revelar uma postura
de autoridade moral
e dominar os conhecimentos cientficos. Igualmente importante
criar com os alunos
laos de amizade e simpatia de forma a poder ajud-los a
transporem as dificuldades
que vo surgindo e a evitar determinadas causas de insucesso,
contribuir para o seu
desenvolvimento e ajud-los a tornarem-se indivduos
equilibrados.
Tavares (1998, p.40) preconiza que a escola, cuja principal razo
de ser preparar
os jovens para que a sua entrada na vida adulta se faa com
autonomia e autoconfiana
pelas qualidades de iniciativa, responsabilidade e independncia,
que dentro de um
esprito de justia e de liberdade lhes deve incutir, tem que
estar preparada para
implementar essas mesmas qualidades na prossecuo de um
desenvolvimento cultural
total, dentro do esprito democrtico consignado na Constituio,
visando o progresso
scio-econmico, moral e cientfico da Nao.
Porm, nem sempre a escola consegue preparar os alunos, sendo,
muitas vezes,
comprometida a sua funo pelo insucesso escolar, devido
especialmente forma
como est estruturada, (...) aos contedos curriculares (...),
tipo de ensino e processos de
avaliao (...), que se articulam com a origem social do aluno
(Martins, 1991, p.13).
Pires, Fernandes e Formozinho (1991, p.190) consideram que o
insucesso escolar
pode ser relacionado com a prpria estrutura social no seu
conjunto, acrescentando
que a escola um agente educativo determinado pela sociedade. Os
mesmos autores,
aprofundando nesta concepo, referem que a escola exerce uma
tripla aco:
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36
a) selecciona os alunos originrios dos estratos dominantes,
garantindo-lhes o acesso aos nveis superiores da educao escolar e
abrindo-lhes, no termo final da educao escolar, o acesso s ocupaes
sociais prestigiadas e mais bem remuneradas;
b) distribui atravs dos mecanismos de seleco e orientao
escolares os restantes alunos originrios dos estratos subordinados
para educaes escolares mais curtas e menos prestigiadas, ou
afasta-os pura e simplesmente da educao escolarnormalmente aps a
escolaridade obrigatria para ocupar os lugares subordinados que
requerem mo-de-obra menos qualificada e mesmo no qualificada;
c) finalmente, interioriza nos alunos a convico de que o seu
fracasso escolar no deriva de mecanismos de seleco escolar e de
reproduo social, mas de incapacidades naturais (p.190).
Roazzi e Almeida caracterizam o insucesso escolar como sendo
insucesso do
sistema. Ainda a este respeito, afirmam que a disjuno entre a
cultura das classes
sociais mais desfavorecidas e a cultura escolar tem sido
associada a dfices
comportamentais, que no tem sido suficientemente valorizados
pelos professores,
escola e sistemas educativos. Os docentes valorizam o
conhecimento do contexto social
e familiar dos educandos, mas esse conhecimento no se manifesta
numa alterao das
prticas pedaggicas. Nesta ptica, Medeiros (1990) recomenda um
melhor
conhecimento da cultura de cada aluno de modo a permitir uma
melhor
operacionalizao da aprendizagem, o que poder ser traduzido num
aumento do
sucesso escolar pelo recurso cultura e aprendizagens
extra-escolares. No que diz
respeito aos critrios de avaliao, Medeiros (1990) defende uma
flexibilizao dos
critrios de modo a acatar as diferenas individuais dos alunos.
Nesta continuidade de
ideias, alega ainda que a reprovao nem sempre faz com que um
aluno aprenda ou
aumenta a sua motivao. Diferentemente, a reprovao poder
contribuir para o
abandono escolar e o aparecimento de sentimentos pessoais de
incapacidade, baixa
auto-estima e fracasso generalizado. A participao de todos os
intervenientes na
recolha e anlise da informao na avaliao, assim como o reforo do
carcter
-
37
formativo da avaliao, so duas condies fundamentais para uma
escola de maior
sucesso.
2.5.3. Aspectos relativos famlia
O estrato social da famlia, a falta de estruturas sociais e
escolares, o baixo nvel
cultural e social do agregado familiar, ao no proporcionarem
meios, estmulos,
motivaes, condies de estudo e aprendizagem aos seus educandos,
so obstculos ao
normal funcionamento do processo de aprendizagem e esto na
origem do insucesso
escolar.
Martins (1991) admite que a origem econmica e cultural das
famlias dos alunos e
o nvel escolar das mesmas constituem causas dominantes de
insucesso escolar. Alm
disso, menciona ainda que a origem econmica e cultural da famlia
dos alunos se
relaciona com aspectos como a distncia entre a casa e a escola e
a zona de residncia.
Em relao ao primeiro aspecto, forar os alunos a deslocaes longas
ou cansativas
reduz o tempo e a disposio para dedicao ao estudo em casa ou a
actividades ldicas;
em relao ao segundo aspecto, a residncia em zonas degradadas
pode ter tambm
consequncias negativas para o aproveitamento escolar.
Decorrente do seu nvel scio-econmico, as diferentes classes
sociais tm formas
diferenciadas de satisfazer necessidades bsicas (alimentao,
vesturio, habitao),
bem como possibilidades distintas de acesso a bens de cultura.
Por outro lado, o
rendimento econmico familiar fraco pode conduzir ao abandono
escolar devido
necessidade de reduzir as despesas e aumentar o rendimento
familiar atravs de um
novo ordenado. Todos estes aspectos, na perspectiva de Martins
(1991), desenvolvem
nos alunos aspiraes e atitudes diferenciadas (p.14), que de
certo modo influenciam,
quer o nvel do desenvolvimento cognitivo, quer as opes escolares
e profissionais e o
prprio sucesso escolar. As classes mdia e mdia alta tendem a
incutir expectativas
mais elevadas aos seus filhos e a orient-los para profisses mais
valorizadas, enquanto
-
38
que as classes mais baixas procuram objectivos mais imediatos em
profisses pior
remuneradas e menos prestigiadas socialmente.
A perspectiva de Avanzini (s.d.) est de acordo com a de Martins
(1991) ao afirmar
a importncia do clima cultural familiar no aproveitamento
escolar, o qual seria mais
relevante que o prprio nvel econmico familiar. Nas famlias em
que a cultura no
valorizada, no esto criadas as melhores condies para um empenho
dos alunos nas
actividades escolares, pois os valores econmicos so percebidos
como mais relevantes
para a afirmao social. Porm, as famlias que valorizam a cultura
criam melhores
condies para um melhor empenho dos filhos nas actividades
escolares,
independentemente do estatuto econmico familiar. Contudo,
considera-se importante
salientar que quando existe um nvel econmico satisfatrio h mais
facilidade no
acesso a bens de cultura, o que poder influenciar positivamente
o aproveitamento
escolar.
Avanzini (s.d.) refere-se igualmente ao meio scio-cultural nas
situaes de
insucesso escolar. Este factor exerceria influncia significativa
por contribuir para as
expectativas e aspiraes de futuro. Em pessoas com expectativas
baixas quanto ao
nvel scio-econmico associado sua profisso futura, o ensino
torna-se pouco
interessante, comparando-o com um ensino de carcter preparatrio
para o exerccio de
uma profisso. Deste modo, e devido predominncia das disciplinas
de carcter
terico, relativamente s de carcter prtico, compreensvel que
sejam encontrados
casos de desinteresse que podero originar situaes de insucesso
escolar devido
correspondncia entre a realidade escolar e as expectativas
quanto ao futuro
profissional. Pelo contrrio, alunos que pertenam a meios
socioculturais mais
favorecidos tero expectativas de futuro mais elevadas e
encontram uma relao mais
objectiva entre a realidade escolar e expectativas de
futuro.
O clima afectivo familiar constitui tambm para Avanzini (s.d.)
um factor
importante para um bom aproveitamento escolar. Em famlias que se
verifiquem
-
39
situaes como desentendimentos conjugais, cimes, comportamento de
agressividade
dos pais relativamente aos filhos e comportamentos de
infantilismo haver mais
possibilidades de ocorrerem situaes de insucesso escolar. A este
respeito, Muiz
(1993, p.76) conta que
quando o casal no funciona adequadamente, os interesses da
criana so reabsorvidos pelos conflitos familiares, pelos receios
deles derivados e, portanto, a capacidade de se interessar e de
enfrentar problemas e dificuldades escolares fica diminuda e imbuda
da problemtica familiar.
O equilbrio familiar constitui uma condio necessria para uma boa
adaptao
escolar. Ainda na perspectiva de Avanzini (s.d.), uma famlia que
tenha educado as suas
crianas num clima de equilbrio afectivo t-las- preparado melhor
e de um modo mais
eficiente para enfrentar a realidades escolares e as outras
realidades.
2.6. Solues e medidas especficas contra o insucesso escolar
Revela-se tarefa rdua e impossvel focar todas as medidas
especficas de combate
ao insucesso escolar, at seria demasiado pretensioso devido sua
complexidade e aos
nveis de abrangncia desta problemtica. Contudo, a sua preveno
sem dvida uma
tarefa urgente e, como tal, procuraremos neste espao mencionar
algumas medidas de
preveno do insucesso escolar .
Comearemos por enunciar algumas estratgias de interveno
preconizadas pelo
Ministrio da Educao (1992) e algumas das linhas de interveno da
Unio Europeia,
citadas pelo Ministrio da Educao (s.d.).
As estratgias e linhas de interveno desenvolvem-se a diversos
nveis e esto
relacionadas com as polticas estruturais, a escola, o professor,
a famlia e o aluno.
Passamos, seguidamente, a falar um pouco de cada medida.
De acordo com o Ministrio da Educao (1992, p.13), no mbito das
polticas
estruturais, ambiciona-se:
-
40
Generalizar a pr-escolaridade, medida unanimemente considerada
de importncia fundamental.
. Adequar o ritmo escolar s necessidades das crianas e dos
jovens, sublinhando a importncia da repartio equilibrada dos tempos
de trabalho e de lazer no dia, na semana, no ano escolar.
. Tornar o horrio flexvel, adaptando a organizao do ensino s
caractersticas de vida da comunidade em que a escola se insere.
. Reduzir as rupturas entre os vrios ciclos, quer desenvolvendo
um tronco comum, quer considerando cada ciclo um todo, diminuindo a
frequncia dos momentos de seleco. (...)
. Facilitar as aprendizagens bsicas, como as da linguagem e as
da matemtica.
. Utilizar novos equipamentos e mtodos pedaggicos com recurso
aos muitos canais de difuso de conhecimentos, para estimular as
aprendizagens e desenvolver o potencial de cada aluno.
. Recorrer a novos sistemas de avaliao adequados aos novos
objectivos da educao. Preferncia marcada pelos sistemas que atendem
prioritariamente aquisio de competncias, permitindo implicar o
aluno na sua avaliao e respeitar o seu ritmo e estilo de
aprendizagem.
. Disponibilizar apoio ao jovem, no campo da orientao, tanto ao
longo do percurso escolar, como na escolha profissional, quando se
verifica a passagem para o mundo do trabalho.
2.6.1. Escola
No que concerne escola, de acordo com o estipulado pelo
Ministrio da Educao
(1992), procura-se:
melhorar a articulao com o ambiente, permitindo instituio
escolar uma
mudana de acordo com o meio em que est inserida, pois a escola,
para alm dos
conhecimentos que transmite, amplia a socializao e a capacidade
para interpretar o
meio;
aumentar a autonomia, o que favorece uma adaptao dos programas
ao contexto
especfico e diversidade dos seus alunos, permite um melhor
aproveitamento dos
recursos de que dispe e pode desenvolver iniciativas no sentido
de envolver toda a
comunidade educativa e social;
-
41
uma maior cooperao com a famlia em actividades escolares e
para-escolares,
pois no s a escola mas tambm a famlia so grandes pilares da
educao das
crianas. Ambos devem visar os mesmos objectivos e apoiar-se
mutuamente, actuando
de modo coordenado;
melhorar a vida escolar, enaltecendo o desempenho dos
professores no sucesso
escolar, oferecer um acolhimento adequado no incio do ano
escolar e estabelecer um
mediador que auxilie o aluno na sua relao com a escola.
2.6.2. Professor
Relativamente ao professor, este desempenha uma funo crucial na
reduo do
insucesso. Segundo o Ministrio da Educao (1992), a teoria
segundo a qual cabe ao
professor um papel fundamental no combate ao insucesso do aluno
defendida por
todos os Estados-Membros da Unio Europeia. Estes reconhecem que
o xito e a
eficcia das medidas a serem postas em prtica dependem, em grande
parte, da
capacidade de envolvimento do professor. Da, a importncia que
assume a sua
formao, quer inicial quer contnua, para uma permanente adaptao
das suas
competncias tcnico-cientficas em constante mudana.
De facto, como pressuposto bsico relativo s funes e
responsabilidades
profissionais do educador, importa salientar a sua formao
permanente com seminrios
e cursos de especializao, que lhe permitem exercer correctamente
a sua tarefa dentro
da comunidade educativa (Mart e Guerra (dir.), 1997, p. 21).
O Ministrio da Educao (s.d.) refere ainda que, em Portugal, o
Programa de
Educao para Todos (PEPT), criado em 16 de Maio de 1991,
lanou um projecto de Centro de Recursos para a Escolarizao Ano
2000, que visa nomeadamente animar uma unidade de informao e formao
contnua de professores e de outros agentes, numa perspectiva de
preveno do abandono escolar, com vista criao de uma cultura de
escolarizao prolongada (p. 92).
Atendendo a que o professor muitas vezes o suporte scio-afectivo
de grande parte
da vivncia diria de uma criana, em processo de desenvolvimento,
considera-se
-
42
tambm urgente que se tomem medidas na sua formao terica e
prtica,
nomeadamente ao nvel da educao em geral, da pediatria e da
psicologia do
desenvolvimento e da aprendizagem. Assim, o docente deve
usufruir de uma autonomia
e incumbe-lhe saber utiliz-la de forma adequada ao processo de
ensino-aprendizagem
dos seus alunos.
A complexidade crescente que caracteriza a misso do professor,
sobretudo no
quadro do combate ao insucesso escolar, s poder ser
verdadeiramente assumida por
este se, para o efeito, puder contar com o apoio e a colaborao
dos restantes parceiros
da comunidade educativa. nesta perspectiva que se enquadra o
trabalho cooperativo
entre professores de uma mesma escola e pela cooperao estreita
entre os docentes de
estabelecimentos de diferentes nveis escolares. Esta cooperao
tem vindo a ser
desenvolvida por alguns sistemas educativos; cooperao
reconhecida como eficaz, mas
que encontra ainda resistncias por parte de alguns professores
(Ministrio da
Educao, s.d.).
2.6.3. Famlia
Em relao famlia, h acordo de que esta desempenha um importante
papel no
processo educativo, e por conseguinte no combate ao insucesso
escolar.
O Ministrio da Educao (s.d.) considera que a interveno da famlia
no processo
educativo, e mais especificamente na luta contra o insucesso
escolar, em larga escala
reconhecida, pelo menos teoricamente, na maioria dos
Estados-Membros da Unio
Europeia. Neste sentido, o empenho da famlia torna-se muito
desejvel uma vez que se
reconhece que os factores/causas do insucesso dos alunos em
geral, e mais
especificamente em Matemtica, residem para muitas crianas, no no
contexto escolar,
mas no seio da prpria famlia.
Nesta ptica, aponta-se para a participao dos pais na gesto da
escola, participao
essa assegurada principalmente atravs do Conselho de Turma.
Porm, raramente
encontramos as famlias associadas a trabalho de fundo capaz de
afectar o projecto de
-
43
escola. Poderemos mesmo adiantar que o nvel da sua participao
depender do grau
de autonomia de que as escolas gozam (Ministrio da Educao, s.d.,
p. 87).
No entanto, cada vez mais a famlia convidada a envolver-se no
processo
educativo dos filhos, quer a nvel de actividades escolares ou
mesmo para-escolares.
Actualmente, j existem inmeras iniciativas de preveno do
insucesso dos alunos
a Matemtica no 2 ciclo, nomeadamente projectos-piloto dirigidos
aos jovens com
dificuldades, visando concretamente o reforo da participao dos
pais no processo
Educativo dos seus filhos (Ministrio da Educao, s.d., p. 88).
Por exemplo, o
projecto Northamptoushire, na Gr-Bretanha, introduziu novas
metodologias tendentes
a encorajar as famlias a participar mais activamente em
determinadas actividades
escolares.
Segundo Medeiros (1990), uma das medidas a ser tomada
prende-se
fundamentalmente com o ciclo de desenvolvimento da criana pela
interveno das
interaces familiares, isto num registo complexo que toca a
gravidez, a relaes
precoces at constituio de grupos de pais (p.304).
Em resumo, tm-se feito esforos para apoiar a famlia, integr-la
nos rgos de
gesto e envolv-las nas actividades escolares, porque o
conhecimento do modo como
se desenvolvem as aprendizagens na classe, auxlio no
desenvolvimento do gosto das
crianas pela leitura, utilizao de bibliotecas para pais,
cooperao na procura de
solues para as dificuldades dos filhos (Ministrio da Educao,
1992, p. 15) pode ser
essencial na aco contra o insucesso.
2.6.4. Aluno
Em relao ao aluno, Fonseca (1999, p.532) diz que para superar o
insucesso
necessrio comear por algo que a criana possa aprender e no
aguardar que,
milagrosamente, a criana aprenda sem possuir pr-aptides e
pr-requisitos, donde os
alunos devem ter experincias pedaggicas muito gratificantes e
que se adaptem a ele.
-
44
De facto, muitas so as pedagogias que podem favorecer o
desenvolvimento pessoal
e o interesse pela frequncia escolar. A este respeito, o
Ministrio da Educao (1992,
p. 15-16) aponta algumas delas:
a pedagogia por grupos de nvel visando a adaptao s
caractersticas individuais e permitindo um diagnstico preciso das
dificuldades de cada um;
a pedagogia diferenciada que se fundamenta no princpio de que no
h via nica para o conhecimento; paralelamente, pela avaliao
formativa, o aluno guiado na sua formao pela ajuda identificao das
suas finalidades e procura do modo de as resolver;
a pedagogia de projecto, j que aprendizagem implica aco. O
projecto, levado a cabo por um grupo de alunos e animadores, supe
esprito de cooperao e abordagem interdisciplinar dos objectivos,
desenvolve uma pedagogia activa fundada numa relao constante entre
a prtica e a teoria e acentua a criatividade e a expresso livre dos
alunos.
Ainda o Ministrio da Educao (1992, p.16) refere que a maior
parte dos Estados-
Membros
dispe de um dispositivo de despiste de dificuldades, como exames
mdicos, psicolgicos, cognitivos, permitindo a utilizao de
dispositivos de apoio adequados: tipo de ensino, ritmo adequado,
orientao, actividades de recuperao. Destaca os dispositivos de
educao global, pois atribui ao aluno em dificuldade uma maior
responsabilizao no mbito de projectos ligando estreitamente a
escola, a famlia e o meio.
Outro aspecto focado pelo Ministrio da Educao (1992, p.16) para
recuperao
dos alunos com insucesso o recurso colaborao das empresas
procurando por
iniciativa, quer central, quer local, a formao que facilite aos
jovens a insero
profissional ou mesmo, numa perspectiva mais ambiciosa, que
visando a sua educao
integral os habilite a uma autntica insero social.
Deste modo impossvel separar a conquista de caminhos de luta
contra o insucesso
escolar da prtica educativa. As tentativas de combate ao
insucesso acarretam
necessariamente a construo de uma melhor escola e melhorar a
formao dos alunos
em dificuldade significa afinal melhorar o conjunto das tcnicas
pedaggicas e a
qualidade do ensino. (Reunio de Altos Funcionrios da Educao
sobre o Insucesso e
-
45
o abandono Escolar nos Sistemas Educativos nota para debate
preparada a pedido da
Presidncia. Citado em Ministrio da Educao, 1992, p. 16).
De uma forma geral, procura-se juntar diversos esforos a nvel da
Comunidade
tendo em vista a troca de informaes, o apoio ao desenvolvimento
de projectos e
estudos que ajudem a descortinar e a compreender o problema do
insucesso, a utilizao
dos programas existentes para debate do problema e, por fim,
estabelecer laos entre
diferentes organizaes internacionais.
Tambm foram acordadas algumas linhas de fora para o
desenvolvimento de
estratgias visando o sucesso educativo em cada um dos
Estados-Membros, entre estas
realam-se as trs ltimas linhas apontadas:
A oferta de educao deve ser flexvel e diversificada, para
permitir a cada estudante encontrar um caminho adequado aos seus
talentos e objectivos. (...)
O potencial das novas tecnologias e os instrumentos para educao
distncia devem ser explorados no sentido de se enriquecerem os
contedos da educao.
Devem ser desenvolvidos sistemas de informao e de avaliao para
aprofundar o conhecimento destes problemas, para ajudar cada
estudante a fazer as suas opes e para possibilitar administrao o
controlo do insucesso e do abandono. (Ministrio da Educao, 1992, p.
18).
Numa outra viso, e olhando a escola no mago do insucesso,
surgem-nos os alunos
em que os seus interesses e resultados so profundamente
influenciados pelo clima ou
esprito particular de cada escola. Assim e numa linha de
procurar solues, a OCDE
(1992, pp.218-219) aponta dez caractersticas, consideradas de
carcter fundamental
para atingir bons resultados escolares:
I) o desejo de alcanar normas e finalidades definidas claramente
e de comum acordo;
II) uma planificao em colaborao, uma comum tomada de decises e
um trabalho colegial empreendido num esprito de experimentao e de
avaliao;
III) uma direco dinmica para o pr em prtica e a manuteno do
melhoramento;
IV) a estabilidade do pessoal;
-
46
V) uma estratgia de formao permanente e de aperfeioamento do
pessoal que corresponda s exigncias de cada escola no plano da
pedagogia e da organizao;
VI) a aplicao de um programa de estudos meticulosamente
elaborado e coordenado que permita a cada aluno adquirir os
conhecimentos tericos e prticos essenciais;
VII) um alto nvel de participao e de apoio da parte dos
pais;
VIII) o reconhecimento dos valores peculiares do estabelecimento
e a adeso a estes valores mais do que aos valores individuais;
IX) uma explorao mxima do tempo escolar;
X) o apoio dinmico e slido da autoridade escolar competente.
Outras medidas urgentes a tomar no mbito da preveno do insucesso
dos alunos
so tambm referidas por Medeiros (1990):
Intensificar a aco mdica escolar;
Intensificar a aco social escolar;
Fornecer uma rede de escolas adequadas s necessidades
psicopedaggicas nas crianas, sem descurar a componente esttica;
Fornecer materiais pedaggicos e de suporte s escolas ou um fundo
de maneio compatvel;
Promover a figura do psiclogo na escola que, funcionando como
uma antena e em conjunto com o professor, possa identificar grupos
de alto risco e proceder ao seu encaminhamento para as estruturas
de apoio, como os Centros de Apoio Mdico-Psicopedaggicos;
Promover a figura do pedagogo que, em conjunto com o professor e
o psiclogo, poder delinear programas de interveno ao nvel pedaggico
para os grupos de baixo risco de insucesso escolar.
luz da Lei de Bases do Sistema Educativo, as medidas a
implementar para
promover o sucesso escolar e educativo na escolaridade
obrigatria so:
a) actividades de acompanhamento e complemento pedaggicos;
b) servios de psicologia e orientao escolar e profissional;
c) aco social escolar;
d) servios especializados dos centros comunitrios de sade.
(Artigos 24 a 28)
Na realidade, as medidas tomadas para minorar o insucesso so
inmeras e todas
colocam a escola, professores, famlia e alunos em paridade como
meio de ultrapassar
-
47
esta situao. Porm, as medidas s sero eficazes se os valores da
escola coincidirem
com os valores da famlia e, por conseguinte, do aluno, pois s
assim a aprendizagem se
desenvolver com mais facilidade e sucesso.
2.7. O insucesso escolar em Matemtica
Includo na temtica do insucesso, o insucesso na disciplina de
Matemtica reveste-
se de uma importncia particular, pois a Matemtica uma
disciplina-chave no sistema
de ensino (Oliveira, 1996, p.18). Se nos reportarmos aos
pressupostos da Lei de Bases
do Sistema Educativo Portugus de 14 de Outubro de 1986,
deparamos com os
princpios orientadores da reforma educativa, em que est implcita
a ideia de que a
Matemtica e o Portugus so reas fulcrais na formao global do
aluno e,
consequentemente, na do cidado. Por conseguinte, e porque a
Matemtica sem
dvida essencial ao desenvolvimento de quase todos os sectores,
seno de todos, se os
cidados no aprenderem Matemtica e no desenvolverem a sua
inteligncia
certamente os pases tero muitas dificuldades em competir e
absorver as contnuas
revolues tecnolgicas.
Embora no sendo exclusivo da disciplina de Matemtica, o
insucesso escolar
tornou-se uma preocupao para o sistema educativo portugus, o
qual no deu ainda
respostas concretas e eficazes para solucionar este problema. Em
conformidade com o
que ouvimos com frequncia de geraes anteriores, o insucesso em
Matemtica j
existe desde h muito tempo, embora s a partir da dcada de 50 se
comece a sentir as
suas primeiras grandes manifestaes e actualmente reveste-se de
uma preocupao
constante, tanto para os professores como para os pais.
Frequentemente, encontramos
pessoas, mais ou menos jovens, que manifestam uma atitude
claramente negativa
perante a matemtica, provavelmente relacionada com experincias
escolares negativas,
com uma frustrante incapacidade para as actividades matemticas
mais elementares do
-
48
dia-a-dia ou associadas a actividades profissionais. Nas nossas
escolas acontece o
mesmo, de tal modo que professores e pais j esto habituados a
atitudes passivas e
desinteressadas acerca desta disciplina.
Segundo Ponte (2003, p.1), o insucesso na disciplina de
Matemtica
uma realidade incontornvel. Reconhece-se no s pelos maus
resultados dos alunos em testes e exames, mas muito especialmente
pela sua generalizada dificuldade na resoluo de problemas, no
raciocnio matemtico, s vezes nas tarefas mais simples e, sobretudo,
no seu desinteresse crescente em relao Matemtica. O insucesso no s
existe como tende a agravar-se.
Oliveira (1996, p.17) afirma que o que contribui para as
dificuldades escolares dos
alunos na disciplina de Matemtica
a generalizao a um largo nmero de alunos e o seu carcter de
maior ou menor irreversibilidade com o avanar na escolaridade. As
bases insuficientes dos alunos e o seu auto-conceito na
aprendizagem e na realizao desta disciplina podem associar-se a
tais dificuldades. Tambm as dificuldades dos professores na
materializao dos contedos matemticos ou no partir de situaes
quotidianas dos alunos para a leccionao desta disciplina tm tambm a
sua quota parte de responsabilidade em tal insucesso.
Tambm acrescenta que, para alm dos alunos e professores, o
sistema educativo d
a sua contribuio ao permitir que os alunos transitem anualmente
sem aproveitamento
numa dada disciplina, sendo-lhes progressivamente exigidos
conhecimentos
curriculares dos anos transactos que se sabe no possurem.
Tratando-se do caso da
Matemtica, o Sistema , claramente, (re)produtor destas
dificuldades (id. 1996,
p.17).
Foi publicado um artigo no Pblico (14.04.2001), onde se afirma
que um tero (32
por cento) dos alunos do 9 ano passam com negativa a Matemtica,
o que nos leva a
questionar de onde advm esta falta de xito dos alunos em
Matemtica.
O estudo internacional PISA (Project for Internacional Student
Assessment) revelou
resultados preocupantes dos alunos portugueses em literacia de
leitura, matemtica e
cincias:
Os alunos portugueses de 15 anos tm um desempenho modesto em
literacia de leitura, matemtica e cincias, comparativamente com os
seus pares da OCDE,
-
49
revela o estudo internacional PISA (Programme for International
Student Assessment) ( Fernandes e Rocha, 2001, p.51).
Do total de 265 mil participantes, em Portugal estiveram
envolvidos 4604
estudantes, frequentando desde o 5. ao 11. anos de escolaridade,
e pertencentes a 149
escolas seleccionadas.
Relativamente aos resultados obtidos pelos alunos de 15 anos, em
literacia de
leitura, matemtica e cincias, verificou-se que:
Os piores resultados so apresentados pelos alunos que, aos 15
anos, frequentam nveis de escolaridade entre o 5. e o 9. ano. Daqui
se pode inferir que, ficar para trs um ou mais anos, no percurso
escolar, pode condenar ao insucesso. (Alves, 2001, p. 4);
Os jovens portugueses com maiores nveis de literacia em leitura,
cincias ou matemtica so, em mdia, piores do que os colegas com
melhor desempenho nos restantes pases;
H grandes diferenas regionais: os jovens de Lisboa e Vale do
Tejo obtiveram resultados mdios superiores aos do espao da OCDE; os
jovens das ilhas, Alentejo e Algarve apresentam os resultados mais
fracos. O GAVE (Gabinete de Avaliao Educacional) do Ministrio da
Educao reconhece que so situaes problemticas para as quais urge
encontrar solues. (Alves, 2001, p. 4);
As notas que os professores de Portugus deram aos alunos
testados no mbito do PISA tm pouco a ver com os resultados que
estes vieram a obter nos testes de literacia, concluindo o GAVE que
o que apreciado na avaliao que se faz nas nossas escolas tem pouco
a ver com as competncias implicadas. (Alves, 2001, p. 4);
Em Portugal, as diferenas entre as escolas esto dentro da mdia.
Contudo, h disparidades significativas dentro do mesmo
estabelecimento, o que leva a crer que, nas salas de aula, convivem
alunos muito bons com alunos muito fracos.
Os resultados obtidos na primeira fase deste estudo colocam os
nossos alunos numa
posio bastante modesta, alcanando uma mdia de 454, bastante
abaixo da mdia
alcanada pelos alunos japoneses (557) e inferior mdia da OCDE
(500). Se olharmos
para a mdia obtida pelos alunos, o decrscimo acentua-se medida
que o nvel de
escolaridade baixa (Fernandes e Rocha, 2001).
-
50
Assim, e mais do que na leitura, na literacia matemtica e na
literacia cientfica
que os alunos portugueses de 15 anos mais perdem em comparao com
os seus
parceiros da OCDE.
Perante tais circunstncias, revela-se urgente tomar medidas de
combate ao
insucesso escolar em Matemtica. Neste sentido, Ponte (2003,
pp.4-5) nomeia algumas
solues para o combate ao insucesso escolar em Matemtica,
afirmando que
necessrio:
A criao duma imagem diferente da Matemtica, como actividade
humana multifacetada, susceptvel de proporcionar experincias
desafiantes a todas as pessoas;
A divulgao duma viso mais ampla do que so os processos de
pensamento e as competncias prprias da Matemtica;
A formao dos professores, virada no apenas para a actualizao
cientfica e pedaggica geral, mas sobretudo para uma nova viso da
Matemtica e das formas de trabalho que favorecem a sua apropriao
pelos alunos;
A reformulao dos currculos, com uma efectiva valorizao da
componente metodolgica e, no ensino secundrio, uma adequada
diferenciao entre os programas de alunos de diversas reas;
O enriquecimento das prticas pedaggicas, valorizando-se o
trabalho de grupo, a realizao de projectos, as actividades
exploratrias e de investigao, a resoluo de problemas, a discusso e
a reflexo crtica;
A diversificao das formas e instrumentos de avaliao, quer
formativa quer sumativa;
A alterao do sistema de acesso ao ensino superior,
diversificando-se os indicadores de seleco.
Uma outra medida a ser tomada, por forma a diminuir o insucesso
dos alunos a
Matemtica, prende-se com a estruturao do ensino. De facto, o
papel do professor no
combate ao insucesso dos alunos nesta disciplina, s poder ser
verdadeiramente
assumido por este se tiver um determinado grau de autonomia para
poder conceber
percursos escolares mais individualizados e utilizar
metodologias de ensino e de
-
51
avaliao mais adequados heterogeneidade da turma (Ministrio da
Educao, s.d., p.
93).
Neste sentido, considera-se tambm importante citar as estratgias
como uma
medida a ter em linha de conta na problemtica do insucesso dos
alunos na disciplina de
Matemtica. , pois, neste contexto que o Ministrio da Educao
(s.d., p.94) se refere a
uma multiplicidade de estratgias de preveno ou de remediao das
dificuldades de
aprendizagem do aluno: estratgias de despistagem precoce de
dificuldades logo a
partir das primeiras aprendizagens; estratgias especificamente
concebidas para
estimular o desenvolvimento pessoal e escolar do aluno, que
incluem os grupos de
nvel, o ensino diferenciado, a pedagogia da mestria, a pedagogia
do projecto, a
pedagogia expressiva e criativa, etc.; metodologias que todas
elas, implicam
obrigatoriamente prticas de avaliao mais ajustadas ao ritmo de
progresso prpria de
cada aluno.
Assentando nesta ideia, Oliveira (1996, p.195) diz que os
professores devem
munir-se de estratgias de interveno para ajudar os alunos a
desenvolver padres
atribucionais o mais adequados possvel no seu confronto com as
situaes de insucesso
na disciplina de Matemtica. necessrio um esforo por parte dos
professores no
sentido de actuarem sobre as convices dos alunos de modo a
impedir que eles entrem
em desnimo e consolidem ideias de incapacidade face matemtica,
estimulando neles
o desenvolvimento de confiana nas suas capacidades e eficcia,
contribuindo, deste
modo, para a promoo do sucesso na disciplina de Matemtica.
Tudo isto requer por parte do professor esforo e empenho para
que as suas prticas
lectivas sejam produtivas e propcias a um ensino de sucesso.
Neste sentido, Jesus
(1998, p.112) refere que um nvel de dedicao ou de motivao
equilibrada, crenas e
expectativas realistas, atitudes positivas face s situaes
profissionais e formas de
actuao adequadas constituem uma base fundamental para o sucesso
e realizao
profissional do professor.
-
52
Prosseguindo na mesma ptica, o professor ter de implementar a
sua prtica
pedaggica direccionando-a para os actuais interesses dos alunos,
porque para um aluno
gostar de matemtica necessrio sentir desejo em saber, mais do
que executar umas
simples operaes, pois
tambm Pascal estudou a geometria de Euclides muito precocemente
e com paixo. Esta experincia afectiva determinante. No se pode
gostar de matemtica se no se tiver, num momento ou noutro, sentido
entusiasmo pela leitura de um livro de matemtica ou por uma
descoberta matemtica, mesmo que limitada. Este entusiasmo decorre
do contexto no qual este acto realizado. Essencialmente, necessrio
que seja desejado, quer por si prprio, quer por razes exteriores
(Lobrot, 1992, p.47),
podendo estas ltimas ser despertadas pelo professor.
O insucesso escolar no s uma falha do aluno, muitas vezes
causado pelo
professor, isto , em inmeras situaes o professor no se apercebe
das lacunas dos
alunos, dos seus problemas iminentes e no planifica nem
sistematiza com
individualizao. Assim e de acordo com investigaes realizadas
neste domnio,
citadas por Fonseca (1999, p.514), chegou-se s seguintes
concluses:
Os professores que obtm melhores resultados so os que
proporcionam s crianas um ensino individualizado e adequado s suas
necessidades;
Os resultados escolares tendem a melhorar se os mtodos no forem
expositivos mas participando ao nvel de interaces: professor-grande
grupo; professor-pequeno grupo; criana-professor; criana-pequeno
grupo; criana-grande grupo;
A criana tende a melhorar as suas funes receptivas auditivas,
visuais e quinestsicas se se utilizar processos hierarquizados,
sistemticos e intensivos de aprendizagem;
O professor no deve utilizar apenas a palavra como media, deve
fazer recursos a projectores, gravadores, jogos, fichas de trabalho
e dever igualmente adoptar vrias estratgias educacionais:
quebra-cabeas, materiais de composio e de construo, explorao de
materiais de aprendizagem, cartes e fichas coloridas, quadros
magnticos, lotos e domins simblicos, blocos lgicos e
discriminativos, etc...
Fortificando a convico de que o aluno tem de lidar com a
matemtica utilizando as
suas prprias capacidades e o professor deve oferecer
possibilidades diversas
utilizao do raciocnio, Hole (1977, p.12) sublinha que
-
53
cada aluno deve aprender a pensar, com independncia, sobre a
matemtica. Um ensino desta disciplina, exclusivamente dirigido
transmisso de factos e, quando muito, sua deduo, s com dificuldade
poder exercer a essencialidade da sua funo: a preparao de situaes
de aprendizagem, na qual se possam originar formas independentes e
transferveis de raciocnio.
O autor termina, considerando que este o caminho mais indicado
para a eficcia, na
conquista dum slido saber matemtico.
Outro factor a acrescentar o reforo positivo, pois o insucesso
deve ser
equacionado em termos construtivos e no em termos
humilhantes.
Em sntese, o professor deve utilizar metodologias diversas e
inovadoras, as quais
necessitam ser dinmicas, os contedos torn-los o mais reais
possvel, a comunicao
aliciante e acalorada correspondendo a todas as necessidades
psicolgicas dos alunos. O
docente deve, tambm, procurar compreender os alunos, as suas
necessidades e
exigncias.
Parafraseando Werneck: diante de voc h uma tela em branco
apoiada num
cavalete. Ela a sua vida profissional. A paisagem voc j escolheu
a sua profisso.
Agora cabe a voc dar o colorido que quiser e a iluminao que
desejar (1996; citado
em Jesus, 1998, p. 111). Consequentemente, em termos de ensino,
cabe ao professor
fazer brilhar as suas prticas lectivas.
2.7.1. Actividades extra sala de aula de Matemtica
Dentro das actividades extra sala de aula de Matemtica vamos
referir-nos aos
clubes de matemtica e laboratrios de matemtica, pois so espaos
onde se podem
desenvolver actividades que desabrochem nos alunos o gosto pela
matemtica.
Os clubes de matemtica tm, segundo Duarte e Gonalves (1996, p.
65) o
objectivo de desenvolver as capacidades dos alunos ao nvel do
clculo mental e das
operaes lgicas. Outros objectivos pretendidos com os clubes so
desenvolver, no
aluno, o gosto pela matemtica, utilizar diversos materiais
manipulveis e informticos
visando um ambiente de aprendizagem estimulante. Considerando as
lacunas dos nossos
alunos e as imensas dificuldades que estes apresentam na
aprendizagem da disciplina de
-
54
Matemtica, os clubes podem ser uma porta aberta para uma
matemtica mais ldica,
com jogos, mais real e aplicvel, alterando a viso enraizada, nos
alunos, de uma
disciplina inatingvel. Como refere Duarte e Gonalves (1996, p.
77), se a matemtica
nas aulas tem de cumprir o programa, nos Clubes pode ser ldica,
pode ser um jogo, ou
pode ser aplicada na construo de modelos escala.
Os clubes podem contribuir para transparecer a importncia da
matemtica na vida
real, desde a actividade mais bsica de ir s compras, fsica,
construo civil,
mecnica, etc., despertando nos alunos o interesse por saber
matemtica.
Tambm, neste espao, seria muito aliciante os alunos poderem
inventar jogos,
problemas e situaes que envolvam a matemtica e concretizar tais
situaes.
No entanto, de salientar que um grande contributo para o clube
de matemtica a
utilizao da informtica, pois est no primeiro nvel dos interesses
dos alunos e sem
dvida uma ferramenta fundamental para o futuro, visto a
informtica estar presente em
muitas das actividades profissionais. Tambm, com o computador,
podem realizar
exerccios e jogos em CD-ROM, podem investigar na Internet
aspectos relacionados
com a histria da matemtica, etc. Programas de computador podem
tambm constituir
uma ajuda a nvel de processamento de texto, do estudo da
estatstica, da construo de
representaes grficas, etc.
Outra inovao fulcral nas nossas escolas, para o sucesso em
Matemtica, seria a
criao do laboratrio de matemtica. O seu objectivo criar condies,
na escola, para
o ensino-aprendizagem da Matemtica; desenvolver, no discente, o
gosto pela
matemtica; constituir um espao prprio da disciplina onde o
professor pudesse levar
os seus alunos para estes poderem investigar, usufruir dos
diversos materiais,
equipamentos, computadores, calculadoras, etc., apresentar ao
aluno actividades
experimentais diversificadas. Assim este espao proporcionaria ao
aluno uma
aprendizagem mais activa, significativa e til, despertando o seu
interesse e incutindo
novas concepes sobre a matemtica. De acordo com Dias, Coelho,
Raposo e Saraiva
-
55
(1998, pp.125-126) os laboratrios de matemtica so vistos como um
espao
facilitador da experimentao e da descoberta,..., e ao qual est
associado, para alm de
uma sala prpria, todo um conjunto diversificado de equipamentos,
nomeadamente as
calculadoras e as TIC (Tecnologias de Informao e Comunicao).
Outro elemento a acrescentar seria a possibilidade de esta sala
ter um horrio dirio
na escola, e sempre com um ou dois professores de Matemtica para
permitirem aos
alunos um complemento de aprendizagem, para continuarem o
trabalho iniciado na aula
de Matemtica, ou ainda para colmatarem dvidas relativamente a
determinado assunto
de Matemtica, ou mesmo para os apoiarem na utilizao dos
programas de
computador. Aqui a informtica imprescindvel, pois
muitos programas computacionais dinmicos permitem a experimentao
e facilitam a descoberta. Caractersticas como as possibilidades de
repetio e de observao de invarincias nos objectos matemticos
criados e em jogo, para alm da grande capacidade grfica, so teis
para o sucesso da actividade matemtica dos alunos (Dias, Coelho,
Raposo e Saraiva.1998, p.126).
Seguindo a ideia apresentada por Dias, Coelho, Raposo e Saraiva
(1998, p.126), o
que est em causa toda uma actividade matemtica dos alunos (...),
qual est
subordinado todo um conjunto de opes tcnicas, e no o contrrio,
ou seja, sujeit-la
existncia destas. Os mesmos autores acrescentam que a sala de
aula de Matemtica
tambm pode funcionar como laboratrio de matemtica e, to bem
quanto este, apenas
necessrio o professor desejar e empenhar-se, propondo aos seus
alunos tarefas que
os motivem e lhes permitam uma experimentao matemtica com
sucesso (p. 126).
Perante este quadro rico de como se pode trabalhar a matemtica,
tanto nos clubes
como os laboratrios de matemtica podem desempenhar um papel
preponderante no
combate ao insuce