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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : Index.
JOO CASSIANO
I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO
ndice Geral
CASSIANO
MOISS
CASSIANO
MOISS
CASSIANO
MOISS
GERMANO
MOISS
GERMANO
MOISS
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.1.
Joo Cassiano
I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO
O Abade Moiss e o Escopo e o Fim do Monge
- condensado da traduo de D. Timteo Amoroso Anastcio -
Dilogo entre o Abade Moiss e os monges Cassiano e Germano
CASSIANO
No deserto de Scete moravam os mais ilustres Pais de monges e de
toda a perfeio. Entre todas aquelas exmias flores, rescendia de
modo mais suave, tanto pela ascese quanto pela contemplao, o abade
Moiss.
Desejoso de ser formado sua escola, fui sua procura no deserto,
em companhia do santo abade Germano. Com este, desde os primeiros
exerccios da milcia espiritual, vivi em to estreita companhia,
tanto no mosteiro como no deserto, que todos diziam, para
significar a nossa amizade e comum propsito, que ramos um s esprito
e uma s alma em dois corpos.
Juntos, rogamos com muitas lgrimas ao mesmo abade uma conversa
de edificao. Bem conhecamos o seu rigor e sabamos que no consentia
em abrir as portas da perfeio seno queles que a desejavam com f e a
procuravam de corao contrito. Pois no devia acontecer que a
mostrasse a quem no a queria ou que s mornamente a desejasse,
expondo, assim, a indignos, que as acolheriam com fastio, aquelas
realidades necessrias que s devem ser reveladas a quem tem sede de
perfeio, pois, do contrrio, pareceria ele incorrer no vcio de
vanglria ou mesmo no crime de traio.
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.1.
Cansado de nossos rogos, ele, afinal, comeou a falar.
n
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.2.
MOISS
Toda arte e toda a disciplina tem um escopo, ou fim particular,
e um "telos", isto , um fim prprio. fixando neste os olhos, que o
zeloso pretendente de qualquer arte sustenta, sem perturbao e de
boa vontade, todos os trabalhos, perigos e prejuzos.
O lavrador, por exemplo, arrostando os raios ardentes do sol ou
geadas e neves, infatigavelmente rasga a terra e com o vai-e- vem
do arado amanha as glebas bravias. Assim fazendo, ele conserva o
seu escopo, que purgar a terra de todas as saras e libert-las de
ervas daninhas, at que a torne, pelo seu trabalho, fina e solta
como areia. Ele no espera conseguir de outro modo o seu fim, que
consiste em searas copiosas e colheitas abundantes, para que possa,
da em diante, levar uma vida segura ou aumentar o seu patrimnio. De
bom grado, esvazia o celeiro cheio de gros e com instante trabalho
os semeia nos sulcos amolecidos. Contemplando as futuras searas,
ele no sente a diminuio de agora.
Tambm os que vivem do comrcio, no temem os azares do mar nem se
apavoram com qualquer perigo, quando, alados pela esperana do vo
ligeiro, so provocados ao lucro, que o seu fim.
O mesmo acontece com os que se inflamam com a ambio da carreira
militar, ao divisar ao longe o seu fim, que so as honras e o poder.
So insensveis aos perigos e s mortes das campanhas e no se deixam
abater pelos sofrimentos e riscos atuais, nem pelas aflies e
guerras do momento, pois ambicionam a dignidade, que o fim que se
propem.
Assim tambm, a nossa profisso. Ela tem igualmente o seu escopo e
o seu fim prprio. Por este fazemos todos os trabalhos, sem cansao e
at com alegria. Para obt-lo, no nos fatiga a privao dos jejuns,
achamos prazer na lassido das viglias, no nos enfastia a contnua
leitura e meditao das Escrituras, nem nos deixamos assustar pelo
trabalho incessante, pela nudez e privao de tudo, nem pelo horror
desta vastssima solido.
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.2.
, sem dvida, por causa deste mesmo fim, que abandonastes o afeto
dos pais e desprezastes a ptria e as delcias do mundo, atravessando
tantas regies para chegar at ns, homens rsticos e ignorantes, que
vivemos na aspereza deste ermo.
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.3.
CASSIANO
Como insistisse em nossa resposta, dissemos que tudo isso
tolervamos por causa do reino dos cus.
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
MOISS
Muito bem, disse ele, falastes corretamente sobre o fim. Mas,
antes de mais nada, deveis saber qual o nosso escopo, isto , a
firme determinao a que devemos aderir sem cessar, para podermos
atingir o nosso fim.
Em toda arte e disciplina, como j disse, tem precedncia um certo
escopo, isto , um propsito da alma, uma incessante inteno da mente.
Se algum no o guardar com perseverante empenho, no poder chegar ao
fim desejado.
Pois, como eu disse, o lavrador, tendo por fim prprio viver do
proveito de colheitas abundantes com segurana e largueza, exerce o
seu escopo ou determinao ao purgar de saras e ervas inteis o seu
campo, s confiando em atingir o fim almejado, a opulncia, se, antes
de obt-lo j de algum modo o possua em seu trabalho e sua
expectativa.
Igualmente o mercador. No abandona o desejo de adquirir
mercadorias, pois por seu intermdio que pode mais rendosamente
acumular riqueza. Em vo cobiaria o lucro, se no tomasse o caminho
que a ele conduz.
Os que ambicionam as honras deste mundo, atravs de determinadas
dignidades, escolhem antes os cargos e carreiras a que devem
dedicar-se para poder chegar, pelo caminho certo, ao fim que a
desejada dignidade.
Assim, o fim ltimo da nossa via o reino de Deus. Mas, qual seja
o escopo, deve-se cuidadosamente procurar. Se no o soubermos com
clareza, em vo nos cansaremos em nossos esforos, pois os que viajam
sem caminho certo, s conseguem o labor da jornada, no o avano.
O fim ltimo da nossa profisso, como j dissemos, o reino de Deus
ou dos cus. Quanto ao nosso escopo, a pureza de corao sem a qual
impossvel algum alcanar aquele fim.
Portanto, fixando neste escopo o olhar que nos dirige,
orientamos a nossa corrida por uma linha certa, de modo que se
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
o nosso pensamento se desviar um pouquinho, ns o retificamos,
voltando logo a contempl-la, como a uma norma. Revertendo os nossos
esforos a esse signo nico, ele nos avisar imediatamente, caso o
nosso esprito se desvie ainda que pouco da direo proposta.
como os que so hbeis no manejo de armas de arremesso. Quando
querem demonstrar sua percia diante de um rei deste mundo,
esforam-se por lanar dardos ou flechas em pequenos escudos onde so
pintados os prmios. Esto certos de no poder alcanar o seu fim, o
prmio cobiado, seno visando diretamente ao alvo. Ganharo o prmio se
puderem realizar o escopo proposto. Se este lhes for subtrado da
vista, seja qual for o desvio que afaste o olhar imperito da direo
correta, eles no percebero que se apartaram daquela linha, porque
lhes falta o sinal certo que lhes aprove a correo do tiro ou acuse
a sua falha.
E assim, ao lanarem no ar e no vcuo seus inteis arremessos, esto
impedidos de distinguir por que erraram ou se enganaram, pois
carecem de qualquer indicao do desvio, e o seu olhar confuso no
pode ensinar como, desde ento, corrigir ou recuar a linha
acertada.
Assim tambm a nossa profisso. seu fim, segundo o Apstolo, a vida
eterna, conforme, suas prprias palavras:
"Tendes por fruto
a santidade, e por fim
a vida eterna".
Rom. 6, 22
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
Quanto, porm, ao nosso escopo, a pureza de corao, que ele
merecidamente chama de santidade, sem a qual aquele fim no poderia
ser atingido. como se dissesse em outras palavras:
`Tendes o vosso escopo
na pureza
de corao,
e o vosso fim na vida
eterna'.
Falando, alis, desse escopo, o mesmo Apstolo emprega o prprio
termo, isto , escopo, de modo bem significativo:
"Esquecendo o que est para trs, e lanando-me para
frente, eu sigo sem
parar at o fim, para a
recompensa a que fui
chamado do alto".
Fil. 3,13-14
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
O texto grego mais claro ainda, trazendo: "kat skopn diwko",
isto : "eu sigo at o fim, segundo o escopo", vale dizer, segundo a
determinao que me propus, como se dissesse:
"Por este propsito, pelo qual esqueo o que ficou para trs, isto
, os vcios do
velho homem, eu me esforo por chegar ao meu fim,
que a recompensa
celeste".
Assim sendo, devemos abraar com toda a energia o que pode nos
encaminhar ao escopo da pureza de corao, e evitar tudo que dela nos
separa, como pernicioso e nocivo.
ela a razo de tudo que fazemos e suportamos. por ela que
abandonamos parentes, ptria, honrarias, riqueza, delcias e qualquer
prazer deste mundo, para guardar continuamente a pureza de
corao.
Se nos propomos esta inteno, os nossos atos e pensamentos sempre
iro direto sua conquista. Mas se ela no estiver constantemente
diante dos nossos olhos, no s os nossos trabalhos se tornaro vazios
e instveis e sem nenhum proveito, mas tambm se levantaro
pensamentos de toda sorte e contrrios entre si.
Pois inevitvel que a alma, no tendo a que voltar e a que se
fixar de preferncia, mude a cada hora e a cada minuto, ao sabor da
variedade dos impactos que sofre, e logo se transforme, em virtude
das influncias de fora, na disposio que primeiro lhe
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
ocorra.
Da vem que j vimos que muitos, depois de ter deixado as maiores
riquezas, no s em quantias de ouro e prata, mas igualmente em
propriedades magnficas, se deixam perturbar, depois disso, por
causa de um canivete, um estilete, uma agulha, uma pena de
escrever. Se tivessem mantido o olhar invariavelmente fixo naquela
pureza de corao, jamais teriam admitido em coisas to pequenas o que
radicalmente rejeitaram em bens considerveis e preciosos.
Pois acontece muitas vezes que no poucos guardam com tanto cime
um volume, que no permitem a ningum sequer de leve o ler ou tocar.
E assim encontram ocasio de impacincia e de morte onde eram
estimulados a ganhar a recompensa de pacincia e de caridade. Depois
de terem distribudo todos os seus bens por amor de Cristo, eles
retm em coisas mnimas o antigo afeto do seu corao e se deixam por
elas, muitas vezes, encher-se de fortes cleras, como os que, no
tendo a caridade do Apstolo, se tornam de todo infrutuosos e
estreis. O santo apstolo o previa, em esprito, quando disse:
"Ainda que eu
distribusse todos os
meus bens para o
alimento dos
pobres, e entregasse meu corpo
s chamas,
se eu no tiver a
caridade, de nada
me serve".
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
I Cor 13, 3
Prova-se, assim, com clareza, que no se alcana de imediato a
perfeio pelo simples despojamento e pela renncia de toda riqueza e
honraria, seno houver aquela caridade cujos membros descreve o
Apstolo, pois s na pureza de corao que ela consiste.
Pois o que no invejar, no se encher de orgulho, no se irritar,
no agir mal, no ir atrs do prprio interesse, no ter prazer com a
injustia, no levar em conta o mal (I Cor. 13,4ss) e o resto, seno
oferecer sempre a Deus um corao perfeito e sincero, e guard-lo
imune de quaisquer perturbaes?
, portanto, pela pureza do corao que tudo devemos fazer e
apetecer. Por ela, temos de ir atrs da solido. Por ela, saibamos
que nos cumpre assumir jejuns, viglias, trabalhos, despojamento,
leitura e outras virtudes, para, graas a isto, tornar e conservar
livre de ms paixes o nosso corao, galgando por estes degraus a
perfeio da caridade.
E se eventualmente no pudermos, em virtude de alguma legitima e
necessria ocupao, realizar o ritual dos nossos rigores costumeiros,
no vamos por motivos de tais observncias cair na tristeza ou na ira
ou indignao, pois para vencer tais coisas que teramos feito o que
foi omitido. No to grande o lucro do jejum, quanto os dispndios da
ira; nem tanto o fruto que se colhe com a leitura, quanto o dano
que sofremos com o desprezo de um irmo.
Convm, portanto, fazer por causa do nosso escopo principal, isto
, a pureza do corao, que a caridade, todas aquelas coisas
secundrias, jejuns, viglias, anacorese, meditao das Escrituras, e
no desbaratar por causa delas esta virtude principal, pela qual, se
a guardarmos intacta em ns, nada nos poder fazer mal, ainda que se
omita por necessidade algo secundrio.
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
De resto, no nos servir de nada fazer todas as coisas, se nos
deixarmos privar daquela que chamamos principal e para cuja aquisio
tudo deve ser feito.
Se algum, com efeito, se apressa a arranjar e preparar as
ferramentas de qualquer arte, no para as possuir ociosas nem para
fundar na mera posse dos instrumentos o fruto deles esperado, mas
sim para adquirir realmente, por seu servio, a maestria e o produto
daquela arte, de que so eles os meios.
Assim, os jejuns, as viglias, a meditao das Escrituras, o
despojamento e a privao de todos os recursos no constituem a
perfeio, mas so instrumentos da perfeio, pois se no neles que est o
fim dessa disciplina, por eles que se chega ao fim.
, portanto, em pura perda que algum multiplicar tais exerccios,
se neles detiver a inteno do seu corao, como se fossem o sumo bem,
deixando de fixar no fim pelo qual se justificam aquelas prticas,
todo o esforo da sua virtude. Possuiriam os instrumentos daquela
disciplina, mas ignorariam o seu fim, no qual consiste todo o
fruto.
Tudo, pois, que pode perturbar a pureza e a tranqilidade da
mente, ainda que parea til e necessrio, deve ser evitado como
prejudicial . Com esta norma poderemos escapar disperso dos
pensamentos extravagantes e atingir, seguindo a justa direo, o fim
querido.
Este, portanto, deve ser para ns o principal esforo, esta a
invarivel inteno do corao, para que a mente sempre esteja fixa em
Deus e nas coisas divinas. Tudo o que disto se afasta, mesmo que
seja grande, deve ser julgado secundrio ou mesmo nfimo, ou por
certo nocivo. De modo muito belo, o Evangelho traa uma figura deste
esprito e deste modo de agir, no episdio de Maria e Marta.
Enquanto Marta prestava um servio absolutamente santo, pois era
ao prprio Senhor e a seus discpulos que ela ministrava, e Maria,
somente atenta doutrina espiritual, estava fixa aos ps de Jesus,
que ela, beijando, ungia com o perfume duma boa confisso, ela a
preferida pelo Senhor, por ter escolhido a
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
melhor parte, e uma parte que no lhe podia ser tirada.
Marta, com efeito, toda ocupada nos piedosos cuidados do seu
servio domstico, vendo-se incapaz de cumpri-lo sozinha, pede ao
Senhor a ajuda da irm:
"No te importas
que minha
irm me deixe servir
sozinha? Dize-lhe,
pois, que me ajude".
Lc. 10, 40
No era a uma obra vil, mas a um louvvel ministrio, que ela
chamava Maria. E, no entanto, que resposta ouviu do Senhor?
"Marta, Marta, ests
preocupada e te
perturbas por muitas coisas. No
h necessidade
seno de poucas, e
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
at mesmo uma s basta. Maria
escolheu a boa parte,
que no lhe ser tirada"
Lc. 10, 41-42
Vedes, portanto que o Senhor colocou o bem principal s na
"theoria", isto , na contemplao divina. Segue-se que as outras
virtudes, ainda que as proclamemos necessrias e teis e boas, ns a
julgamos de segundo grau, porque todas so praticadas para a obteno
desta s. Dizendo o Senhor:
"Ests preocupada
e te perturbas por muitas coisas; no
h necessidade
seno de poucas e
at mesmo uma s basta";
ele colocou o sumo bem no na ao, embora louvvel e abundante de
frutos, mas na contemplao dEle mesmo, que , na verdade, simples e
una. Ele afirmou que poucas coisas so necessrias para a perfeita
bem-aventurana, isto , aquela
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.4.
"theoria" que comea pela considerao do exemplo de uns poucos
santos.
Elevando-se desta contemplao, aquele que ainda se acha em
progresso, chegar tambm a esse nico assim chamado, isto , viso de
Deus s, com a sua graa. Ultrapassando, com efeito, os atos e
ministrios maravilhosos dos santos, ele j passa a nutrir-se da
beleza e do conhecimento de Deus:
"Maria escolheu
a boa parte,
que no lhe ser tirada".
preciso considerar isto mais cuidadosamente. Quando Ele disse:
"Maria escolheu a boa parte", embora se cale a respeito de Marta e
no parea censur-la, ao louvar aquela, declara esta inferior. E
quando diz "que no lhe ser tirada", mostra que desta pode-se tirar
a sua parte, um servio corporal no pode perseverar sempre com o
homem, ao passo que a ocupao de Maria, esta, como Ele ensina, em
tempo algum pode findar.
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.5.
CASSIANO
Ficamos muito perturbados com esta palavra. Pois que, dissemos
ns, ento o labor dos jejuns, a solicitude da leitura, as obras de
misericrdia, de justia, de piedade e afeio humana, nos sero tiradas
e no permanecero com os seus autores? Mas, sobretudo, no foi o
prprio Senhor que prometeu o reino dos cus em retribuio a tais
obras, ao dizer:
"Vinde, benditos do meu
Pai, entrai na posse do reino que
est preparado para vs desde a origem
do mundo. Pois tive fome, e
me desde de comer;
tive sede, e me
deste de beber".
Mt. 25, 34-35
file:///D|/Documenta%20Chatolica%20Omnia/99%20-%20...0Library/001%20-Da%20Fare/01/CASSIANUSPRIMUS-5.htm
(1 of 2)2006-06-02 10:20:04
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.5.
E o resto? Como enfim, ser tirado o que introduz no reino os
seus praticantes?
file:///D|/Documenta%20Chatolica%20Omnia/99%20-%20...0Library/001%20-Da%20Fare/01/CASSIANUSPRIMUS-5.htm
(2 of 2)2006-06-02 10:20:04
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.6.
MOISS
Eu no disse, respondeu o abade Moiss, que o prmio da boa obra
nos deva ser tirado, porque o mesmo Senhor declara:
"Aquele que der a um desses
pequeninos um clice de gua fresca, porque um
dos meus discpulos, em verdade
vos digo, no perder
a sua recompensa",
Mt. 10, 42
mas sim que lhe ser tirada a ao, atualmente exigida pela
necessidade corporal, pelos ataques da carne ou pelas desigualdades
deste mundo.
A assiduidade da leitura e as aflies do jejum para purificar o
corao e castigar a carne, s tem utilidade na vida presente,
enquanto
"a carne tem concupiscncia
contra o esprito".
file:///D|/Documenta%20Chatolica%20Omnia/99%20-%20...0Library/001%20-Da%20Fare/01/CASSIANUSPRIMUS-6.htm
(1 of 6)2006-06-02 10:20:05
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.6.
Gal. 5, 17
Vemos, alis, que no raro esse exerccio j nesta vida cessa para
aqueles que esto esgotados pelo excessivo trabalho, ou pela doena e
pela velhice, e no podem ser perpetuamente praticados.
Quanto mais cessaro no futuro, quando
"este corpo corruptvel se
revestir de corruptibilidade",
I Cor. 15, 53
e esse corpo agora "animal" ressuscitar "espiritual" (I Cor. 15,
44), e a carne comear a no mais ter concupiscncia contra o
esprito?
Sobre isto, igualmente, o Apstolo se pronuncia com clareza:
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(2 of 6)2006-06-02 10:20:05
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.6.
"O exerccio corporal
tem utilidade limitada,
mas a piedade,
( a caridade,
sem dvida,
que deve-se
entender), til para tudo,
pois ela tem a
promessa da vida
presente e futura".
I Tim. 4, 8
Dizer que tem uma utilidade limitada, declarar claramente que
ela nem se pratica todo o tempo, nem pode por si s conferir, a quem
se esfora, a suma perfeio. O limite, com efeito, pode referir-se s
duas coisas, vale dizer, tanto brevidade do tempo, j que o exerccio
corporal no pode ser coeterno ao homem nem na vida presente nem na
futura; como, igualmente pouca utilidade obtida pelos exerccios
corporais, porque a macerao corporal produz um certo comeo de
progresso, mas no a prpria perfeio da caridade, e esta que tem a
promessa da vida atual e futura.
file:///D|/Documenta%20Chatolica%20Omnia/99%20-%20...0Library/001%20-Da%20Fare/01/CASSIANUSPRIMUS-6.htm
(3 of 6)2006-06-02 10:20:05
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.6.
Julgamos, pois, necessrio o exerccio dessas obras, porque sem
elas impossvel subir ao cume da caridade.
As obras de caridade e misericrdia, como as chamais, so tambm
necessrias neste tempo, enquanto ainda reina a desigualdade. Mas
dessas obras nem mesmo seria de esperar a sua prtica, se no
houvesse, aqui em baixo, um numero muito grande de pobres,
necessitados e enfermos, produzido pela injustia dos homens,
daqueles, quero dizer, que retiveram para o seu uso exclusivo, sem
contudo, realmente servir-se delas, as coisas que o criador comum
concedeu a todos.
Enquanto, pois, grassar neste mundo uma tal desigualdade, aquela
ao to necessria aproveitar a quem a exercer, dando ao bom corao e
benevolncia fraterna o prmio da herana eterna. Mas no sculo futuro,
reinando a igualdade, ela cessar. J no mais haver ali diferenas que
exijam a sua prtica, mas todos passaro da multiplicidade da ao
caridade de Deus e contemplao das coisas divinas, numa perptua
pureza de corao.
a isto que, desde este sculo, se dedicam com todas as foras,
aqueles que s querem cuidar da cincia e da purificao de sua mente.
Consagrando-se, enquanto se acham na condio carnal e corruptvel, ao
ofcio em que havero de permanecer depois de a ter deixado, eles
atingem aquela promessa ao Senhor, nosso Salvador, que diz:
"Bem-aventurados os puros de
corao, porque vero a Deus".
Mt. 5, 8
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.6.
Por que vos admirais da transitoriedade daqueles servios acima
enumerados? O prprio Apstolo nos descreve como passageiros at os
mais sublimes carismas do Esprito Santo. Somente a caridade, como
ele nos indica, permanece sem fim:
"As profecias
sero abolidas, as lnguas cessaro; a cincia
ser destruda".
I Cor. 13, 8
Mas, quanto caridade, diz ele:
"A caridade
no passar jamais".
I Cor. 13, 8
Todos os dons, com efeito, nos so dados em razo da utilidade e
da necessidade, por algum tempo, devendo, sem dvida,
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.6.
desaparecer logo que se consumar a presente economia. A
caridade, porm, no ser jamais interrompida. No s neste mundo que
ela opera em ns de modo til, mas tambm no futuro. Depois de deposto
o fardo das necessidades corporais, ela permanecer ainda mais
eficaz e mais excelente, para que, sempre imune de qualquer
desgaste, possa aderir a Deus, na eterna incorruptibilidade, de
modo ainda mais ardente e mais intenso.
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.7.
GERMANO
Quem que pode, na fragilidade da carne, ser sempre to preso a
essa contemplao que nunca pense na chegada de um irmo, na visita de
um doente, no trabalho manual, ou na hospitalidade devida aos
peregrinos ou s pessoas que chegam? E, afinal, quem no solicitado a
prover s necessidades e cuidados do corpo? Muito gostaramos de
aprender como e em que medida pode a mente unir-se a esse Deus
invisvel e incompreensvel.
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
MOISS
Unir-se a Deus sem interrupo e ficar-lhe inseparavelmente unido
pela contemplao, como dizeis, impossvel ao homem na fragilidade da
carne.
Mas precisamos de saber onde devemos ter fixa a inteno da nossa
mente e para qual objetivo reconduzir constantemente o olhar da
nossa alma. Se a mente puder guard-la, alegre-se; se se deixar
distrair, deplore e suspire.
E saiba que decaiu do bem supremo, todas as vezes que se
surpreender esquecida daquela contemplao. Julgue ser uma prostituio
todo afastamento, ainda que momentneo, da contemplao do Cristo.
Quando, pois, o nosso olhar se desviar dele um pouco, voltemos de
novo para ele os olhos do corao e reapliquemos como em linha reta a
fora da mente.
Tudo, na verdade, se tem na profundeza da alma. Se da foi
expulso o demnio, e se os vcios no mais a reinam, conseqentemente
se funda em ns o reino de Deus, como diz o Evangelista:
"O reino
de Deus
no vir de
modo visvel.
No diro: ei-lo
aqui ou ali. Em
verdade, eu vos digo, o reino
de
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
Deus est
dentro de
vs".
Lc. 17, 20-21
Ora, dentro de ns no pode existir seno o conhecimento ou a
ignorncia da verdade e o amor dos vcios, pelos quais preparamos em
nosso corao um reino para o demnio ou para o Cristo. O Apstolo, por
sua vez, assim descreve a qualidade desse reino:
"O reino
de Deus no
comida ou
bebida, mas
justia, paz e
alegria no
Espirito Santo"
Rom. 14, 17
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
Se, portanto, o reino de Deus est dentro de ns, e se ele justia,
paz e alegria, quem mora nessas virtudes, est, sem dvida, no reino
de Deus. E, pelo contrrio, quem vive na injustia, na discrdia e na
tristeza que produz a morte, est no reino do demnio, no inferno e
na morte, pois por esses indcios que se discerne o reino de Deus ou
do diabo.
E, de fato, se, elevando o olhar da mente, considerarmos aquele
estado em que vivem as potncias celestes que esto verdadeiramente
no reino celeste, como que devemos julg-lo, seno a perptua e
continua alegria? Que , pois, mais prprio e mais conveniente
verdadeira bem-aventurana, do que a tranquilidade constante e a
alegria eterna?
E para aprenderdes com maior certeza que assim como dizemos, no
por minha conjetura, mas pela autoridade mesma do Senhor, escuta-o
descrevendo claramente a natureza e o estado daquele mundo:
"Eis que eu crio novos cus e
uma nova terra; as coisas antigas
no sero mais
lembradas, nem
subiro mais ao corao.
Mas gozareis de uma
alegria e exultao eterna no
que eu criar".
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
Is. 65, 17-18
E ainda:
"Nela se encontraro o gozo e a
alegria, ao de graas e
cantos de louvor. E isto ser de ms a ms, de
sbado a sbado".
Is. 51, 3; 66, 23
E mais uma vez:
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
"A alegria e
a exultao
eles tero, a dor e o gemido fugiro".
Is. 35, 10
Se desejais conhecer com clareza ainda maior o que so a vida e a
cidade dos santos, prestai ateno ao que diz a voz do Senhor,
falando a Jerusalm:
"Eu te darei por visita a paz e como autoridade a justia.
No se ouvir mais
falar de iniqidade
em tua terra, nem
de devastaes e de runas
em tuas fronteiras, e a salvao
cobrir teus muros e o louvor as
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
tuas portas.
Para ti no haver
mais o sol para luzir durante o dia, nem o esplendor da lua
te
iluminar, pois o prprio Senhor
ser a tua luz eterna, e Deus a
tua glria. Teu sol no se por, e a tua lua no diminuir, e
terminaro os dias do teu luto".
Is. 60, 17-20
Por isto o santo Apstolo no declara que qualquer alegria, de um
modo geral e simplesmente, seja o reino de Deus, mas somente aquela
que no espirito, como ele assinala e especfica (Rom. 14, 17). Ele
sabe que existe uma outra alegria, que censurvel, da qual se
diz:
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
"Este mundo
se alegrar".
Jo. 16, 20
E ainda:
"Ai de vs que rides,
porque chorareis".
Lc. 6, 25
O reino dos cus, sem dvida, deve ser entendido em trs sentidos.
Ou que os cus, isto , os santos, ho de reinar sobre os outros
homens submetidos a eles, conforme esta palavra:
"Tu governars
cinco cidades, e tu a dez",
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
Lc. 19, 17-19
e esta outra dirigida aos discpulos:
"Assentai-vos-eis sobre doze
tronos e julgareis as doze tribos de
Israel".
I Cor. 15, 28
Outro sentido que os prprios cus tornar-se-o o reino de Cristo,
quando tudo lhe for submetido e Deus comear a "ser tudo em todos"
(I Cor. 15, 28). Ou, enfim, que os santos reinaro nos cus com o
Senhor.
Por este motivo, saiba cada um desde agora, enquanto se acha
neste corpo, que lhe caber aquele lugar e ministrio do qual na vida
presente ele se mostrar um membro devotado. E no duvide, tambm, que
no sculo ele ter a mesma sorte daquele cujo servio e companhia
tiver agora preferido. a sentena do Senhor que diz:
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
"Se algum me quer servir,
me siga, e onde
eu estou, l estar o meu
ministro".
Jo. 12, 26
Quanto contemplao de Deus, esta pode entender-se de muitos
modos.
Pois Deus, ns o conhecemos no s pela admirao da sua essncia
incompreensvel, que ainda se acha escondida na esperana da
promessa, mas tambm pela grandeza das suas criaturas, ou se
consideramos a sua justia ou do auxlio cotidiano da sua providncia.
Assim quando repassamos, de mente muito pura, tudo o que ele fez
por seus santos ao longo de cada gerao. quando admiramos, de corao
a tremer, a fora com que governa, modera e rege todas as coisas,
bem como a imensidade da sua cincia e o seu olhar ao qual no escapa
nem o segredo dos coraes. Ou quando pensamos que o numero das
areias e das ondas do mar ele contou e conhece. E quando
contemplamos, cheios de estupefao, que so presentes ao seu
conhecimento as gotas das chuvas, os dias e as horas dos sculos, o
passado e o futuro. E quando vemos, num transporte de admirao, a
inefvel clemncia com que suporta, sem que a sua longanimidade se
canse, os crimes inumerveis cometidos a cada momento diante dos
seus olhos. E a vocao a que nos chamou, pela graa da sua
misericrdia e sem quaisquer mritos precedentes. E ainda quantas
ocasies de salvao ele concede aos que vai adotar como filhos!
Pois ele nos fez nascer de tal modo que, desde o bero, a sua
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.8.
graa e o conhecimento da sua lei nos fossem dados. E, vencendo
em ns ele prprio o adversrio, ao preo apenas do consentimento da
nossa boa vontade, nos agracia com a eterna bem-aventurana e prmios
sem salvar, o plano de sua incarnao, e dilatar entre os povos as
maravilhas dos seus mritos.
So, alis, inumerveis outras contemplaes do mesmo gnero, que
podem nascer em nossas faculdades, segundo a qualidade da nossa
vida e a pureza do corao, e nas quais Deus visto ou possudo em
puras intuies. Ningum, no entanto, as poderia reter perpetuamente,
se nele ainda vive algo dos afetos carnais. Porque
"no poders
ver a minha face",
diz o Senhor,
"nenhum homem
pode me ver e
viver",
Ex. 33, 20
Isto , para este mundo e as afeies terrenas.
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.9.
GERMANO
Como que pensamentos suprfluos, mesmo contra a nossa vontade e
at mesmo sem sabermos, se insinuam em ns de modo to sutil e
escondido, que temos no pequena dificuldade no s para os repelir,
mas tambm para os conhecer e descobrir? Pode a mente ver-se, um
dia, livre deles e no ser mais atacada por iluses desta espcie?
file:///D|/Documenta%20Chatolica%20Omnia/99%20-%20Pro...s%20Library/001%20-Da%20Fare/01/CASSIANUSPRIMUS-9.htm2006-06-02
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
MOISS
impossvel, sem dvida, que a mente no seja perturbada por
pensamentos. Mas a quem se empenha, possvel os acolher ou rejeitar.
Se, de um lado, o seu nascimento no depende inteiramente de ns, j a
sua aprovao e acolhida est em nossas mos.
E se dizemos ser impossvel mente no ser assaltada por
pensamentos, nem por isso se deve tudo atribuir s suas investidas
ou aos espritos malignos que nos tentam sugeri-los. Se assim no
fosse, nem sobraria ao homem o livre arbtrio, nem nos restaria o
empenho da nossa prpria correo.
Eu digo, ao contrrio, que depende de ns, em grande parte,
melhorar a qualidade dos nossos pensamentos, e influir na sua
formao em nossos coraes, se santos e espirituais ou carnais e
terrenos.
a este fim, portanto, que se prendem a leitura freqente e a
constante meditao das Escrituras: proporcionar a memria das coisas
espirituais.
Este o motivo do canto repetido dos Salmos: alimentarmos a
continua compuno, e afinarmos de tal modo a mente, que ela perca o
sabor das coisas terrenas e possa contemplar as celestes. Se,
voltando atrs, e levados por uma sorrateira negligncia, cessarmos
tais exerccios, inevitvel que a mente obscurecida pela impureza dos
vcios se incline logo para o lado da carne e a se precipite.
Este exerccio do corao bem se pode comparar m que as guas dum
canal, tombando, fazem rodar com rapidez. Sempre a dar voltas ao
impulso das guas, ela no pode, de nenhum modo, cessar o seu
trabalho. Entretanto, est no poder daquele que se acha testa do
moinho, escolher o que vai moer, se o trigo, a cevada ou o joio. O
que fora de dvida, que s mi aquilo que o responsvel tiver
fornecido.
Ora, o mesmo acontece com a alma. Posta em movimento pelas
torrentes de tentaes que a investem de todos os lados atravs
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
dos choques da vida presente, ela no poder ficar vazia da mar
dos pensamentos. A seu zelo e diligncia cabe ver quais deve admitir
ou procurar.
Se, pois, como dissemos, recorremos meditao assdua da Escrituras
e levantamos a nossa memria lembranas das coisas espirituais, ao
desejo da perfeio e esperana da futura bem aventurana, inevitvel
que os pensamentos da nascidos sejam espirituais e faro que nossa
mente se detenha naquilo que meditamos.
Se, pelo contrrio, vencidos pela preguia ou pela negligncia, nos
deixamos invadir pelos vcios e conversas ociosas, ou nos embaraamos
com cuidados mundanos e preocupaes suprfluas, a espcie de ciznia
que da nasce sobrecarregar o nosso corao com um trabalho nocivo. E
segundo a sentena do nosso Salvador, onde estiver o tesouro das
nossas obras e de nossa inteno, l permanecer necessariamente o
nosso corao (Mt. 6, 21).
Uma coisa importante devemos, antes de tudo, saber. Trs so os
princpios dos nossos pensamentos, isto , Deus, o demnio e ns
mesmos.
So, com efeito, de Deus, quando ele se digna de nos visitar por
alguma iluminao do Esprito Santo, elevando-nos a progresso mais
alto; tambm, quando ele nos castiga por uma compuno salutar, se
avanamos menos ou nos deixamos vencer, agindo com relaxamento; ou,
ainda, ao descobrir-nos os celestes mistrios e quando atrai a nossa
vontade e propsito a atos ainda melhores (Est. 6, 1 ss).
como aconteceu com o rei Assuero quando, castigado pelo Senhor,
foi levado a consultar os anais e estes lhe trouxeram memria os
benefcios de Mardoqueu. Ele ento o exalta com as maiores honras e
revoga de imediato a crudelssima sentena de morte contra o povo
judeu.
O mesmo se d com o profeta, ao recordar:
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
"Escutarei o que me
fala o Senhor Deus".
Sl. 84, 9
E este outro que afirma:
"Assim falou o anjo
que falava
em mim",
Zac. 1, 14
ou como quando o filho de Deus promete vir com o Pai e fazer em
ns a sua morada (Jo. 14, 23).
Ou ainda quando ele diz:
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
"No sois vs que
falais, mas o Esprito
do vosso
Pai que fala em
vs",
Mt. 10, 20
e tambm quando diz o vaso da eleio, S. Paulo:
"Procurais uma
prova de que Cristo
que fala em mim".
II Cor. 13, 3
Do demnio, por outro lado, nasce uma srie de pensamentos, quando
se esfora por derrubar-nos tanto pela atrao dos vcios, como por
ocultas ciladas, pondo em ao a sua
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
sutilssima esperteza para nos apresentar fraudulentamente o mal
como bem e transfigurar-se a nossos olhos em anjo de luz (II Cor.
11, 14).
Ou, como conta o evangelista:
"E acabada a ceia,
como j o
demnio tinha
posto no corao
de Judas, filho de
Simo, o Iscariota,
o propsito de trair o Senhor",
Jo. 13, 2
e, logo a seguir:
"Depois do
bocado, entrou nele
Satans".
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
Jo. 13, 27
O mesmo disse Pedro a Ananias:
"Por que
Satans tentou o teu
corao, para
mentires ao
Esprito Santo?"
At. 5, 3
Acrescentemos ainda o que lemos no Evangelho, mas que muito
antes o Eclesiastes predizia:
"Se o esprito do que tem o poder
se levanta contra ti, no deixes
teu lugar".
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
Ecl. 10, 4
Igualmente, o que pela boca do esprito imundo se diz a Deus
contra Acab, no Terceiro Livro do Reis:
"Eu sairei e
serei um esprito
mentiroso na boca de todos os seus
profetas".
III Reis 22, 12
Quanto aos pensamentos que vm de ns, so os que nascem quando nos
lembramos naturalmente de tudo que estamos fazendo, ou fizemos ou
ouvimos. a estes que se refere o bem aventurado Davi, quando
diz:
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
"Eu pensei
nos dias antigos, e
tive na mente os
anos eternos, e meditei, de noite, quando
me exercitava
no meu corao e examinava
o meu esprito".
Sl. 76, 6-7
E tambm:
"Os pensamentos
dos justos so justia".
Pr. 12, 5
E, nos Evangelhos, diz o Senhor aos Fariseus:
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
"Porque pensais o
mal em vossos
coraes?"
Mt. 9, 4
Devemos, portanto, sempre ter em vista esta causa trplice dos
nossos pensamentos e examinar com sagaz discernimento todos os que
emergem em nosso corao.
preciso indagar desde o princpio as suas origens, causas e
autores, a fim de podermos considerar, segundo o mrito do que
sugerem, como os devemos acolher. Assim nos tornaremos cambistas
peritos, segundo o preceito do Senhor (Mt. 25, 27).
Sua arte e percia, com efeito, consiste em reconhecer o que ouro
purssimo e o que foi menos purificado pelo fogo no cadinho. No seu
bem atilado discernimento, ele no se deixa enganar, se uma pea vil
de cobre tenta imitar, com as aparncias de ouro brilhante, uma
moeda preciosa. Pois no s sabe reconhecer as peas cunhadas com a
efgie de tiranos, mas tambm discernir com a percia mais sagaz as
que. embora trazendo a imagem dum rei verdadeiro, so dinheiro
falsificado. Finalmente, investigam cuidadosamente, ao exame da
balana, se nada lhes falta do legtimo peso.
Tudo isto ns tambm devemos observar espiritualmente, como nos
mostra em exemplo, com este nome de cambista, a palavra do
Evangelho.
Assim que nos cumpre, em primeiro lugar, examinar com maior
cuidado tudo o que se introduz sorrateiramente em nossos coraes, ou
qualquer preceito que nos seja apresentado, a ver se no , acaso,
algo ligado superstio judaica ou proveniente da orgulhosa filosofia
do sculo, que
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
apresenta uma piedade de mera superfcie. Isto poderemos fazer,
se cumprimos aquela palavra do Apstolo:
"No creias
em qualquer esprito,
mas provai
os espritos se so
de Deus".
I Jo. 4, 1
Nesta espcie de erros caram, enganados, aqueles que, depois de
ter feito profisso de monge, se deixaram iludir por belas palavras
e certas sentenas de filsofos que, primeira vista, lhes soavam com
sentido piedoso e de acordo com a religio. Enganadoras em seu
brilho exterior de ouro, elas deixaram para sempre nus e miserveis
aqueles a quem seduziram por sua aparncia, como moedas de cobre vil
e falsificadas, seja fazendo-os voltar ao barulho do mundo, seja
por arrast-los a erros herticos ou a opinies orgulhosas.
Foi o que sofreu Acor, como lemos no livro de Josu, filho de
Nave. Tomado pela cobia, ele furtou um lingote de ouro do
acampamento dos Filisteus, merecendo por isto ser punido de antema
e condenando morte eterna.
Em segundo lugar, convm observar com todo cuidado que, ligado ao
ouro purssimo das Escrituras, uma falsa interpretao no nos engane
por causa do metal precioso. Foi
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JOO CASSIANO: I CONFERNCIA DOS PADRES DO DESERTO : C.10.
neste ponto que o demnio, muito esperto, tentou enganar o nosso
Salvador, como se se tratasse de um simples homem. Corrompendo com
uma interpretao maliciosa o que deve ser entendido das pessoas dos
justos em geral, ele tenta explic-lo de modo especial quele que no
precisava da guarda dos anjos:
"Ele ordenou a seus anjos
por causa de ti, que
guardem em todos os
teus caminhos; e
eles te transportaro
em suas mos, para
que no batas o teu
p contra as pedras".
Mt. 4, 6; Sl. 90, 11-12
Como se v, ele assim transmuda, por uma astuta interpretao, as
preciosas palavras da Escritura, torcendo-as num sentido contrrio e
nocivo, para nos apresentar, sob as cores do ouro falso, a imagem
dum tirano usurpador.
O mesmo acontece, quando ele se esfora por nos iludir com moedas
falsas, aconselhando, por exemplo, alguma obra de
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piedade que no provem da cunhagem legitima dos antigos e, sob
pretexto de virtude, nos leva ao vcio. So jejuns imoderados e
inoportunos, viglias excessivas, oraes desordenadas, leituras
inconvenientes com que nos logra e arrasta a um fim desgraado.
Outras vezes, ele nos persuade a fazer intervenes e visitas
piedosas, a fim de nos tirar da clausura espiritual do mosteiro e
do segredo duma paz amiga. Ou tambm nos leva a assumir os cuidados
e assuntos de religiosas destitudas de recursos, para que o monge,
prisioneiro desses laos de que no pode soltar-se, se veja dividido
por preocupaes perniciosas. Embora tais coisas sejam contrrias
nossa salvao e profisso, como, no entanto, se cobrem de certo vu de
misericrdia e piedade, facilmente enganam os inexperientes e
incautos.
Elas imitam as moedas do rei verdadeiro, pois, parecem, primeira
vista, cheias de piedade, mas no foram cunhadas pelos legtimos
moedeiros, isto , os padres catlicos e aprovados, nem procedem da
oficina do seu firme e autorizado ensinamento. So moedas
clandestinas, fabricadas em fraude pelos demnios e passadas, com
grande dano, aos inexperientes e ignorantes.
Conquanto paream no momento teis e necessrias, se, contudo,
comeam depois a ser contrrias solidez da nossa profisso e a pr em
risco, de certo modo, todo o corpo do nosso propsito, importa nossa
salvao cort-las e lan-las fora, como a um membro que, embora
necessrio, nos escandaliza, mesmo que nos parea exercer a funo de
mo ou p direito. prefervel, de fato, ter um membro a menos, isto ,
privar-se da realizao e do fruto de um preceito, e continuar so e
firme quanto aos outros, para depois entrar amputado no reino dos
cus, a cair, com todos os mandamentos completos, em algum escndalo.
Transformado em pernicioso hbito, ele nos separaria da regra de
austeridade e da disciplina do projeto de vida que abraamos para
lanar-nos numa tal runa que, sem poder compensar os danos futuros,
expor ao fogo do inferno todos os nossos frutos passados e o corpo
inteiro das nossas obras (Mt. 18, 8).
Deste gnero de iluses o livro dos Provrbios fala bem a
propsito:
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"H caminhos
que parecem retos ao homem, mas o
seu final o
fundo do inferno".
Pr. 16, 25
E tambm:
"O maligno prejudica quando se une
ao justo".
Pr. 11, 25
Vale dizer, o demnio engana, quando se cobre com as cores da
santidade.
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"Ele odeia a palavra
que protege",
Pr. 11, 25
isto , o vigor da discrio que procede das palavras e conselhos
dos antigos.
Agora, a ltima tarefa do cambista perito. Dissemos acima que o
exame do peso. Ela se cumprir, se o nosso pensamento refletir sobre
as coisas que tivermos a fazer, revolvendo-as com o maior escrpulo
para que, depois de coloc-las na balana do nosso corao, as possamos
pesar com a mais perfeita exatido. Assim apuraremos se so completas
segundo a dignidade da nossa regra comum, se so de peso em razo do
temor de Deus e irrepreensveis quanto ao sentido; ou se so levianas
por ostentao humana ou alguma novidade presunosa, e se a vanglria
no lhes teria diminudo ou arruinado o peso de seu mrito.
Desta maneira, ns as examinamos numa balana autorizada,
conferindo-as com os atos e os ensinamentos dos profetas e dos
Apstolos, de modo que possamos ou guard-las, se so coisas integras
e perfeitas e de peso igual a tais ensinamentos, ou recus-las com
toda a cautela e diligncia, se defeituosas e nocivas e no conformes
ao mesmo padro.
, pois, preciso examinar, sem cessar, as profundezas do nosso
corao e, com o farol mais sensvel, seguir o rastro dos que ali
entram, para no acontecer que alguma fera espiritual, leo ou drago,
passando por l, deixe em segredo a marca de seus passos perniciosos
e permita, pela negligncia quanto aos ensinamentos, o acesso de
outros ao santurio intimo da nossa alma.
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