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O mnimo existencial e a Tributao indireta:
Possibilidades hermenuticas na proteo de vulnerveisThe Minimum
Core In Taxation:
Hermeneutic possibilities in the protection of vulnerableSUMRIO:
1 Neoconstitucionalismo e normatividade da Constituio; 1.1
Supremacia e filtragem constitucional; 1.2 A norma e suas espcies;
1.3 O Neoconstitucionalismo no direito tributrio; 2. O suporte
ftico da norma tributria no novo paradigma; 3 A intributabilidade
do mnimo existencial; 4 Possveis horizontes para a proteo dos
vulnerveis; Consluso.
Resumo: O presente estudo tem por escopo analisar a teoria
clssica da norma jurdica tributria em cotejo com a Constituio da
Repblica de 1988, no intuito de verificar sua compatibilidade com
os fundamentos e objetivos definidos pelo constituinte originrio.
Nesse sentido, o foco do trabalho se volta para a questo da
tributao sobre o consumo, cuja hiptese ftica de incidncia recai
sobre o mnimo existencial daqueles que no ostentam capacidade
contributiva.
A metodologia a ser empregada ser sistemtico-dedutiva, partindo
dos pressupostos lgicos de incidncia da norma tributria,
funcionalizados pelos princpios e objetivos delineados pela
Constituio da Repblica de 1988, pretende-se demonstrar a
incompatibilidade da teoria clssica, de cunho positivista, na
resoluo de questes ligadas tributao sobre o consumo, bem como
propor novas possibilidades de atuao nessa sera.Palavras Chave:
norma jurdica tributria, capacidade contributiva, mnimo
existencial, tributao sobre o consumo.Abstract: The present study
aim to analyze the classical theory of legal tax rule in comparison
with the Constitution of 1988 in order to verify its compatibility
with the reasons and objectives defined by the original
constituents. In this sense, the focus of the work turns to the
issue of taxation on consumption, whose factual hypothesis
incidence falls on the minimum existential those which do not have
ability to pay.
Key words: tax rule of law, fiscal capacity, existential
minimum, tax on consumption.
Introduo
cedio que o novo regime democrtico institucionalizado pela
Constituio da Repblica de 1988 implicou significativas mudanas
estruturais em todo os sistema jurdico positivo. No af de construir
uma sociedade livre, justa e solidria, a Repblica surge para
erradicar a pobreza e a marginalizao, reduzir as desigualdades
sociais e regionais, bem como para promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raa, sexo, cor, idade e quaisquer outras
formas de discriminao.Destarte, para concretizar seus objetivos, a
Repblica Federativa do Brasil no optou por um modelo econmico
liberal nos moldes do laissez faire, laissez passer e, tampouco por
estatizar os meios de produo e extinguir a propriedade privada no
estilo marxista.
O artigo 170, CRFB, determina os parmetros para o
desenvolvimento da atividade econmica, que tem por fim assegurar a
todos existncia digna. Nessa cadeia produtiva situa-se o direito
tributrio, exercendo suas exaes com a finalidade de arrecadar
recursos para financiar os custos da realizao dos direitos
fundamentais garantidos pelo artigo 5, CRFB.Entretanto, verifica-se
que o Brasil um pas de extrema concentrao de renda e grandes
desigualdades sociais e econmicas, razo pela qual o constituinte
originrio optou por garantir ao cidado limites interveno do estado
sobre o seu patrimnio. Assim, o art. 150, CRFB, no seu inciso II,
determina a incidncia do princpio da igualdade na relao jurdica
tributria, j em seu inciso IV, determina a proibio de utilizao do
tributo com efeito de confisco.
Essas determinaes constitucionais passam despercebidas na teoria
clssica do direito tributrio, que se funda num modelo positivista
excludente, o qual se constri sob a falsa percepo de que as
imposies constitucionais se dirigem apenas ao legislador. Sob a
falcia da tripartio dos poderes e da segurana jurdica se constroem
verdades lgicas, as quais, sob aparente neutralidade cientfica,
escondem uma rede de poder e troca de favores, maquiados por lobbys
e concretizados no sistema de isenes fiscais.Na primeira parte do
trabalho apresenta-se o novo paradigma do direito, centrado na
Constituio e na promoo dos direitos fundamentais, considerados em
sua normatividade, para ento construir o conceito de norma jurdica
tributria e suporte ftico. J na segunda parte, faz-se o cotejo com
a doutrina clssica do direito tributrio e seu conceito de norma
jurdica tributria, buscando-se demonstrar sua insuficincia, para
construir um suporte ftico com elementos normativos do tipo que
centralize a proteo dos valores constitucionais no conceito de
efeito confiscatrio.
Ao final, pretende-se oferecer novas perspectivas operacionais
para a proteo de vulnerveis que no ostentam capacidade contributiva
para financiar os gastos do Estado, bem como propor uma atuao mais
incisiva do Ministrio Pblico de das Defensorias Pblicas nesse
setor, vislumbrando-se a possibilidade do manejo de Inquritos Civis
Pblicos, Aes Constitucionais e Ao Civil Pblica.
1 Neoconstitucionalismo e normatividade da Constituio
Os efeitos do segundo ps-guerra transformaram a concepo do
constitucionalismo contemporneo de tal sorte que parte da doutrina
nacional e estrangeira tem denominado o fenmeno de
neoconstitucionalismo, ou neoconstitucionalismo(s). O
reconhecimento da fora normativa e vinculante da constituio, a opo
por um sistema de regras e princpios, a filtragem constitucional, a
aplicao horizontal dos direitos fundamentais e sua eficcia
irradiante, bem como a superao do positivismo e do mtodo
exclusivamente silogstico, so exemplos deste novo cenrio.
Na acepo de Daniel Sarmento:
O Direito brasileiro vem sofrendo mudanas profundas nos ltimos
tempos, relacionadas emergncia de um novo paradigma tanto na teoria
jurdica quanto na prtica dos tribunais, que tem sido designado como
"neoconstitucionalismo". Estas mudanas, que se desenvolvem sob a
gide da Constituio de 88, envolvem vrios fenmenos diferentes, mas
reciprocamente implicados, que podem ser assim sintetizados: (a)
reconhecimento da fora normativa dos princpios jurdicos e valorizao
da sua importncia no processo de aplicao do Direito; (b) rejeio ao
formalismo e recurso mais freqente a mtodos ou "estilos" mais
abertos de raciocnio jurdico: ponderao, tpica, teorias da
argumentao etc.; (c) constitucionalizao do Direito, com a irradiao
das normas e valores constitucionais, sobretudo os relacionados aos
direitos fundamentais, para todos os ramos do ordenamento; (d)
reaproximao entre o Direito e a Moral, com a penetrao cada vez
maior da Filosofia nos debates jurdicos; e (e) judicializao da
poltica e das relaes sociais, com um significativo deslocamento de
poder da esfera do Legislativo e do Executivo para o Poder
Judicirio.
O modelo terico neoconstitucionalista, constri-se a partir da
compreenso de trs marcos fundamentais que refletem a mudana de
paradigma e a evoluo do direito constitucional, so eles o histrico,
terico e o filosfico.O marco histrico do novo direito
constitucional, na Europa continental, foi o constitucionalismo do
2 ps-guerra, especialmente na Alemanha e na Itlia. J no Brasil, o
processo de redemocratizao impulsionado pela promulgao da
Constituio da Repblica de 1988. Conforme Lus Roberto Barroso:
A reconstitucionalizao da Europa, imediatamente aps a 2 Grande
Guerra e ao longo da segunda metade do sculo XX, redefiniu o lugar
da Constituio e a influncia do direito constitucional sobre as
instituies contemporneas. A aproximao das idias de
constitucionalismo e de democracia produziu uma nova forma de
organizao poltica, que atende por nomes diversos: Estado democrtico
de direito, Estado constitucional de direito, Estado constitucional
democrtico.
O marco filosfico caracterizado pela sntese de duas correntes:
(1) A do jusnaturalismo e da filosofia do direito natural, cujo
fundamento compreendia a crena em princpios jurdicos universalmente
vlidos que traduziriam direitos inerentes a prpria natureza humana,
fundamentando-se como ordem supra legal; (2) e sua anttese o
positivismo, cujo fundamento era a norma hipottica fundamental,
derivada do poder mais eficaz, que determinava a validade do
direito por meio de um sistema escalonado de regras sem a preocupao
com o contedo da norma.
No ps-positivismo h uma reformulao da teoria da norma e os
princpios passam a ter outra funo no sistema jurdico. Assim, o
constitucionalismo contemporneo atribuiu fora normativa Constituio,
a qual deixou de ser considerada apenas um documento essencialmente
poltico, destinado a orientar a produo legislativa.
1.1 Supremacia e filtragem constitucional
Atualmente, no h como se aplicar o direito de forma vlida sem
que se faa aluso Constituio da Repblica, alm das grandes questes,
ela tambm influncia a resoluo de pequenos conflitos; invocada em
quase todas as disputas judiciais, no Congresso Nacional, na
doutrina especializada dos diversos ramos do direito e, at mesmo,
para encampar bandeiras ideolgicas.
A ideia de supremacia da Constituio atravessa o seu prprio
conceito polissmico, analisada sob seus aspectos formais
verifica-se que a lei fundamental do Estado brasileiro, situada no
pice do ordenamento jurdico, conferindo validade a todas as outras
espcies normativas. Na qualidade de norma primria sobre a produo
jurdica a Constituio tem importantes funes: (1) identifica as
fontes do direito; (2) estabelece os critrios de validade e eficcia
de cada uma das fontes; (3) determina a competncia das entidades
que revelam normas de direito positivo
Portanto, trata-se de um conjunto de normas, que regula a
organizao, o funcionamento e as competncias de um Estado, assim
como tambm garante os direitos fundamentais de seus cidados.
Sob o aspecto material deve ser compreendida como uma aquisio
histrica da sociedade que pretende regular, pois positiva
importantes conquistas sociais, opes polticas fundamentais e
estabelece fins a serem atingidos. Nesse sentido, diz-se que a
Constituio traz em seu contedo as diretrizes mais importantes de
uma comunidade, protegidas por um procedimento mais rigoroso de
alterao.
Nessa esteira Jos Afonso da Silva pontifica:
Da rigidez emana, como primordial conseqncia, o princpio da
supremacia da constituio que, no dizer de Pinto Ferreira, reputado
como pedra angular, em que assenta o edifcio do moderno direito
poltico. Significa que a constituio se coloca no vrtice do sistema
jurdico do pas, a que confere validade, e que todos os poderes
estatais so legtimos na medida em que ela os reconhea e na proporo
por ela distribudos. em fim a lei suprema do Estado, pois nela que
se encontram a prpria estruturao deste e a organizao de seus rgos;
nela que se acham as normas fundamentais de Estado.
Nessa perspectiva, ao voltar-se para produo normativa, a
Constituio tambm adquire fora normativa, isto , capacidade de
vincular e de conformar condutas, dando segurana s expectativas de
comportamento. Assim, compreendida como ordem-quadro da Repblica,
pois o carter indeterminado de muitas de suas normas obriga o
legislativo, o executivo, o judicirio, bem como toda a sociedade
civil a preencher e concretizar o seu contedo de acordo com
conjectura que se apresente.Nas Lies do ilustre J.J. Gomes
Canotilho:
A fora normativa da constituio visa exprimir, muito
simplesmente, que a constituio sendo uma lei como lei deve ser
aplicada. Afasta-se a tese generalizadamente aceita nos fins do
sculo XIX e nas primeiras dcadas do sculo XX que atribua constituio
um valor declaratrio, uma natureza de simples direo poltica, um
carter programtico despido de fora jurdica actual caracterizadora
das verdadeiras leis. (...)
Se a constituio uma lei como as outras, em alguma coisa se
distingue delas. O carter aberto e a estrutura de muitas normas da
constituio obrigam mediao criativa e concretizadorados intrpretes
da constituio, comeando pelo legislador (primado da competncia
concretizadora do legislador) e pelos juzes, sem esquecermos hoje o
primordial papel concretizador desempenhado pelo governo quer na
sua qualidade de rgo que dirige, superintende e/ou tutela a
administrao pblica.
Atualmente prtica comum utilizar argumentos de ordem
constitucional em praticamente todos os processos judiciais, seja
na rea civil, penal, trabalhista, previdenciria etc. O fenmeno no
se restringe apenas aos processos judiciais, pois fomentam os
debates parlamentares, reivindicaes da sociedade civil, ideologias
de grupos minoritrios e at mesmo omisses estatais.
Para Daniel Sarmento a constituio tornou-se ubqua. Ao referir-se
a ubiqidade constitucional o autor conduz a ideia de onipresena da
Constituio Federal, ou seja:
[...] a constitucionalizao do Direito vai desafiar antigas
fronteiras como Direito Pblico/Direito Privado e Estado/sociedade
civil. Isto porque, numa ordem jurdica constitucionalizada, a
Constituio no apenas a lei fundamental do Estado. Ela a lei
fundamental do Estado e da sociedade. Nenhum ramo do Direito escapa
completamente s suas malhas. Se, por um lado, a pluralidade e
complexidade dos interesses presentes numa sociedade cada vez mais
heterognea continuam justificando e demandando uma crescente
especializao no mbito jurdico, por outro, h agora um centro de
gravidade, capaz de recolher e juridicizar os valores mais
importantes da comunidade poltica, no af de conferir alguma unidade
axiolgica e teleolgica ao ordenamento.
Assim, outro efeito fundamental da constitucionalizao
corresponde filtragem constitucional, que impe a releitura de
antigos institutos a luz da Constituio, resultando muitas vezes em
mudanas de paradigmas nos mais diversos ramos do direito.1.2 A
norma e suas espcies
Inicialmente, necessrio fixar o conceito de norma, para ento
analisarmos a suas espcies, j que este novo conceito implica num
dos principais efeitos do direito constitucionalizado. Normas,
portanto, so produtos da interpretao dos textos. Exemplo: as normas
gramaticais que podem ser extradas a partir da leitura de um livro.
A norma contm um dever-ser. Como tal, estabelece como deveria ser
uma situao. Contrape-se s descries, que se destinam a analisar a
realidade como ela . O direito destina-se a estabilizar
expectativas de comportamento que no se adquam s frustraes, devendo
ser estabilizadas de modo normativo. Isto , seleciona
comportamentos a partir dos dados da experincia e atribui carter
deontolgico a esses tipos de comportamento, os quais devero ser
observados por todos, sob pena de uma consequncia jurdica.
Nesse sentido, Friederich Mller ao discorrer sobre
normatividade, norma e texto da norma, afirma que a normatividade
pertence norma segundo o entendimento veiculado pela tradio, isto ,
no produzida pelo seu texto, antes resulta de dados extralingsticos
de tipo estatal-social, do funcionamento efetivo e da atualidade
concreta do ordenamento constitucional, perante motivaes empricas
em sua rea de atuao.Assim, no h como fixar todo o sentido da norma
apenas em seu texto.
Inocncio Mrtires Coelho sintetiza:
Alm disso, conclui Mller, mesmo no mbito do direito vigente a
normatividade que se manifesta em decises prticas no est orientada,
linguisticamente, apenas pelo texto da norma jurdica concretizada;
muito pelo contrrio, todas as decises so elaboradas com a ajuda de
materiais legais, de manuais didticos, de comentrios e estudos
monogrficos, de precedentes e subsdios do direito comparado, quer
dizer, com a ajuda de numerosos textos que no so nem poderiam ser
idnticos ao teor literal da norma e,at mesmo, o transcendem
Da interpretao surge um dever-ser, ou seja, uma norma. H trs
modalidades bsicas de dever-ser, conhecidos como modais denticos:
obrigatrio, permitido ou proibido. Em geral, a maior parte das
normas est ligada a um desses casos, embora existam outras
modalidades, inclusive no mbito dos direitos fundamentais, que
permitam algo a algum ou imponham dever a outros.
Essa distino entre texto e norma extremamente importante na
metdica atual e se coloca como verdadeiros topos na literatura
jurdica. A nova hermenutica jurdica tem como dogma a no identificao
entre texto e norma, logo no h no ordenamento jurdico, solues
prontas e acabadas para cada problema.
A norma, portanto, produzida pelos interpretes. Interpretar o
direito uma relao entre duas expresses: a primeira que porta uma
significao que o objeto da interpretao; e a segunda, denominada
interpretao. O texto um signo e para ter significado carece da ao
de um sujeito cognoscente. Assim, o Professor e ex-ministro Eros
Grau, costumava utilizar um exemplo analgico muito elucidativo para
este fenmeno, diz ele que as artes so ou alogrficas, ou
autogrficas, a proza e a pintura so tipos de arte autogrfica, no
sentido de que para obter emoo esttica no se necessita da
intermediao de um intrprete. L-se um poema e frui-se, olha-se um
quadro e obtm-se imediatamente emoo esttica. A completude da obra
de arte se d to s pela ao do artista que escreveu ou pintou. Nas
artes alogrficas, ao contrrio, para obter emoo esttica necessita-se
da mediao de um intrprete, a msica e uma pea de teatro so apenas
textos, ainda que se saiba ler uma partitura ou uma pea, a
completude da arte no se transmite apenas pelos escritos, necessria
a ao do artista, que d vida a este tipo de arte.
O eminente ex-ministro defende, nessa estrutura, que o direito
alogrfico, porque o texto normativo no se completa apenas no
sentido expresso pelo legislador. Segundo ele, a completude do
texto somente atingida quando o sentido por ele expressado
produzido pelo intrprete, constituindo assim, a norma.
A definio extremamente importante, uma vez que ao retirar do
texto em si apenas o incio e o limite do seu carter normativo,
considerando-o completamente adquirido apenas aps o processo
interpretativo, torna-se compreensvel que um enunciado comporte uma
ou vrias normas (fenmeno que ocorre na interpretao conforme a
Constituio), bem como possvel obter uma mesma norma mediante
aglutinao de diferentes enunciados normativos (dilogo das fontes),
ou ainda, uma norma sem necessidade de recurso a um texto escrito.
o que ocorre em sede de atribuio de sentido a preceitos
fundamentais. Mediante um procedimento interpretativo dialtico
constri-se uma norma para tutelar um direito fundamental, a exemplo
do que ocorreu com o direito a unio homoafetiva no Brasil, em
04/06/2011, por meio da ADI 4277 e ADPF 132 reconhecendo, por
unanimidade, a unio estvel para casais do mesmo sexo. A distino
entre regras e princpios particularmente importante para a
compreenso da aplicao dos direitos fundamentais no ordenamento
jurdico, pois no obstante a intensa carga axiolgica a que esto
submetidas todas as normas que garantem esses direitos, algumas
assumem forma de regra, outras de princpio. Cabendo ao interprete
identificar se o caso de imposio de algo definitivo, ou se o caso
de posies jurdicas a serem realizadas na medida de suas
possibilidades fticas e jurdicas.A perspectiva adotada no presente
trabalho a preconizada por Robert Alexy e Virgilio Afonso da Silva,
onde o principal trao distintivo entre regras e princpios a
estrutura dos direitos que essas normas garantem. No caso das
regras, garantem-se direitos ou se impem deveres definitivos, ao
passo que, no caso dos princpios, so garantidos direitos ou so
impostos deveres prima facie.Entende-se que princpios so
mandamentos de otimizao isso significa que so realizados na maior
medida possvel diante das possibilidades fticas e jurdicas
existentes, ao contrrio do que acontece com as regras, que operam
de forma binria observando a lgica do tudo ou nada (all or
nothing), isto , ou so subsumidas aos fatos ou no so aplicadas. Se
um direito garantido por uma norma que tenha estrutura de uma
regra, esse direito definitivo, devendo ser realizado totalmente
caso a regra seja aplicvel ao caso concreto, pois tratando-se de
regras possvel que haja uma exceo, ou ainda, que fatores externos a
tornem inaplicvel. Por exemplo: a regra que probe a retroao da lei
penal e sua exceo (retroagir sempre para beneficiar o ru art. 5, XL
da CRFB). J no caso da atipicidade da conduta, pode-se falar em
inaplicabilidade da regra, mesmo tendo ocorrido o fato por ela
prescrito.
Tratando-se de princpios, no se pode falar em realizao sempre
total daquilo que a norma exige, pois, via de regra, essa realizao
apenas parcial. Isso ocorre porque no caso dos princpios h uma
diferena entre aquilo que garantido prima facie e aquilo que
garantido definitivamente. Nessa linha que se diz, que ao contrrio
do que ocorre no modelo de regras jurdicas, os princpios podem ser
realizados em diversos graus. O objetivo sempre chegar ao grau
mximo de realizao do direito, no entanto, esse patamar dificilmente
alcanado seja em virtude das condies fticas, ou jurdicas
ideais.
No caso das regras, verifica-se que sua aplicao no depende das
condies jurdicas do caso concreto, sendo na maioria das vezes
aplicada em abstrato por meio de subsuno do fato norma, enquanto
que aos princpios aplica-se o sopesamento. Isso no significa que
regras no caream de interpretao para serem aplicadas, pelo
contrrio, toda norma produto de uma interpretao, seja ela uma regra
ou um princpio. A aplicao se d sobre o produto da interpretao dos
textos, dispositivos e da realidade ftica, portanto, no o texto que
define a espcie normativa.1.3 O Neoconstitucionalismo no direito
tributrio
No campo direito tributrio percebe-se que a doutrina majoritria
manteve-se alheia a essas transformaes e permanece aplicando um
modelo de tributao tpico da modernidade inspirado nas noes de
segurana, certeza e previsibilidade cientfica, O qual era
perfeitamente coerente com o momento histrico de transio que se
vivia, onde a fora do soberano impunha-se sobre os sditos violando
a sua propriedade e dilapidando o seu patrimnio com a finalidade de
manter uma estrutura de privilgios para classes que no contribuam
para o processo produtivo.J no inicio da modernidade, houve um
rompimento do modelo de sociedade estamentria e a superao de uma
estratificao que financiava a nobreza e o clero com os recursos da
burguesia. Entretanto, com a centralizao do poder nas mos do
soberano emerge a idia de que tambm os governantes deveriam se
submeter a ordenamentos jurdicos estveis, pr-definidos e dotados de
racionalidade. O direito surge vinculado rbita do princpio da
liberdade, uma vez que sua finalidade era limitar o poder estatal
em favor de determinados direitos inviolveis dos sditos. No
entanto, com a quebra da unidade religiosa tambm se perdeu a
coerncia da justificativa do poder poltico alicerado na vontade
divina. Sob essa perspectiva, desenvolveram-se as teorias do
contrato social que passaram a justificar a existncia do Estado em
nome dos interesses dos indivduos. John Locke (1632 1704)
sustentava a idia de que ao celebrar o contrato social as pessoas
alienam para o Estado apenas uma parcela de sua liberdade,
conservando determinados direitos naturais e inalienveis do homem:
vida, liberdade, propriedade e resistncia.
Cumpre salientar, neste contexto, que Loke, assim como j o havia
feito Hobbes, desenvolveu ainda mais a concepo contratualista de
que os homens tm o poder de organizar o Estado e a sociedade de
acordo com sua razo e vontade, demonstrando que a relao
autoridade-liberdade se funda na autovinculao dos governados,
lanando, assim, as bases do pensamento individualista e do
jusnaturalismo do sculo XVIII, que, por sua vez, desaguou no
constitucionalismo e no reconhecimento de direitos de liberdade dos
indivduos considerados como limites ao poder estatal.
Destarte, a tributao tambm deveria obedecer aos mesmos
pressupostos lgico-filosficos derivados do princpio estruturante da
liberdade, assim o Estado s poderia intervir no patrimnio do cidado
para garantir as condies mnimas de segurana para suas transaes
comerciais, sendo certo que esta interveno s era justificada na
medida em que fosse furto da vontade popular, expressa pela
Lei.Nesse sentido, a tributao no Estado de Direito era concebida
como uma contribuio liberdade:
O Estado de Direito se caracteriza pela afirmao da liberdade
individual e a limitao do poder do Estado. Consagra-se a idia de
liberdades pblicas (crena, opinio, religio, entre outras).
garantido ao indivduo possuir crenas particulares independentes de
uma crena oficial. Esta afirmao o resultado de lutas histricas pela
afirmao dos direitos humanos e do cidado, no longo percurso que nos
traz da servido cidadania.
A tributao nessa fase no pode ser a opresso da liberdade, que o
Estado anteriormente promovia. A fiscalidade deve estar submetida a
limites claros ao poder do Estado em tributar. O patrimnio privado
nao pode estar merc dos interesses do soberano e de suas razes
secretas. A tributao deve estar limitada. Ser fruto da representao
popular e respeitar os direitos e garantias do contribuinte. O
pagamento do tributo, antes de ser um ato de servido, uma
contribuio do particular manuteno da esfera pblica de liberdade,
que garante a cidadania.
Esse modelo de Estado corresponde ao modelo de
constitucionalismo francs, que teve como marco inicial a Revoluo
Francesa iniciada em 1789. Os revolucionrios franceses no
pretendiam apenas modificaes pontuais no Antigo Regime, eles
visavam a construo de um novo Estado e de uma nova sociedade,
moldada pelos ideais iluministas da igualdade, liberdade e
fraternidade. Essa vontade de romper com o passado e instituir uma
nova ordem, conduziu a elaborao conceitual do poder constituinte,
proposta por Emanuel Sieys, que exprimia a idia de soberania da
Nao, completamente desvencilhada de quaisquer limites impostos pelo
ordenamento jurdico do passado. O poder constituinte fundaria uma
nova ordem, criando novos rgos e poderes (os poderes constitudos),
os quais permaneceriam a ele vinculados.A Constituio deve
corresponder a uma lei escrita e determinar quais os valores e
propsitos que a sociedade almeja para o futuro. Esses valores
estavam bem sintetizados na Declarao dos Direitos do Homem e do
Cidado de 1789, que definia inclusive o que era uma Constituio em
seu art.16: Toda sociedade, na qual a garantia dos direitos no
assegurada nem a separao dos poderes determinada, no tem
Constituio.
Nesse sentido, fica claro o protagonismo do Poder Legislativo no
modelo de Estado de Direito, uma vez que, teoricamente, ele quem
encarna a soberania popular.Historicamente, esta concepo deveu-se
tanto desconfiana que os franceses nutriam em relao ao Judicirio,
visto como uma instituio corrompida e associada ao Antigo Regime,
como valorizao da lei, concebida como a expresso da vontade geral
do povo. Isto levou, na prtica, a que a Constituio acabasse
desempenhado o papel de proclamao poltica, que deveria inspirar a
atuao legislativa, mas no de autntica norma jurdica, que pudesse
ser invocada pelos litigantes nos tribunais.
A funo dos juzes, ao longo do sculo XIX, estava orientada no
sentido de legitimar a atuao do legislador que possua um lugar de
destaque poltico no contexto da distribuio dos poderes
constitucionais. O afastamento do juiz do campo da poltica visava
assegurar a reproduo fiel do direito positivo legislado,
considerado expresso mxima da vontade geral popular na resoluo dos
conflitos individualizados, garantindo, desta forma, os direitos e
as liberdades individuais. Em sntese, esse tipo de configurao das
funes dos magistrados correspondia ao entendimento da tripartio dos
poderes, assegurando legitimidade e de distribuio do poder poltico
num sistema orientado pelos imperativos do liberalismo.
Na aplicao deste direito puro e idealizado, a interpretao
jurdica um processo silogstico de subsuno dos fatos norma. O Poder
Judicirio era apenas a boca da lei. Montesquieu afirmava: Os Juzes
da Nao, como dissemos, so apenas a boca que pronuncia as palavras
da lei; seres inanimados que no lhe podem moderar nem a fora, nem o
rigorAssim, vigorava o princpio da tripartio dos poderes, impedindo
o juiz de exercer qualquer papel criativo.Destarte, a proposta dos
juristas era construir um sistema jurdico cartesiano de forma
estritamente racional, ou seja, isento de qualquer juzo de valor
que pudesse levar a subjetivismos. A inteno dos positivistas era
colocar a cincia do direito a salvo de eventuais interferncias da
filosofia, da sociologia e da poltica. O positivismo jurdico
reduziu o direito a um sistema puramente lgico-dedutivo, um
conjunto de normas de comportamento hierarquicamente organizadas,
editadas pelo Estado soberano, segundo um procedimento previamente
definido e dotadas de coercibilidade. Isso significou que a
racionalidade do direito era encontrada na medida em que se
verificava se a norma era validada por outra que lhe era superior,
at culminar na norma hipottica fundamental determinada pelo Poder
Poltico mais eficaz. No se questionava se o contedo da norma era
racional, uma vez que a razo no se manifestava na avaliao objetiva
do comando prescrito. Essa matriz do direito tributrio no Brasil.2.
O suporte ftico da norma tributria no novo paradigmaA compreenso do
fenmeno jurdico envolve, necessariamente, o manuseio de conceitos
especficos da cincia jurdica. Por mais que se faa uso corrente de
significados oriundos de outras reas do conhecimento, como a
filosofia, a sociologia e a economia, o sistema jurdico sempre ir
decodific-los luz dos seus princpios intrnsecos. Sendo assim, a
partir de conceitos mais gerais, os quais possuem maior nmero de
conexes, se constroem outros mais especficos, at que se forme uma
rede de determinaes que permitem compreender o fenmeno em sua
completude e de forma coerente.
No campo do direito tributrio, o conceito-chave o de norma
jurdica tributria, a partir deste conceito que se compreende uma
srie de outros institutos como a relao jurdica tributria, a obrigao
tributria, a responsabilidade tributria, o crdito tributrio, as
isenes, imunidades e assim por diante. A doutrina clssica,
capitaneada por Geraldo Ataliba, Alfredo Augusto Becker e Paulo de
Barros Carvalho, tinha por escopo construir um sistema
jurdico-tributrio que fosse imune aos mandos e desmando do Poder
Pblico, que municiado do seu poder de imprio, alterava regulamentos
aleatoriamente, tributava vrias vezes o mesmo fato e inflacionava a
legislao de tal forma que se tornava humanamente impossvel
compreender o fenmeno da tributao.
Destarte, para alcanar seu desiderato, estruturaram um sistema
jurdico positivo, isto , imune a quaisquer ingerncias polticas e
valorativas, composto por um antecedente (fatos do mundo que
interessam ao direito) e um conseqente (hiptese de incidncia
previamente determinada), destarte, somente quando preenchidas essa
qualidades se formaria uma relao jurdica tributria e,
automaticamente, se ativariam as conseqncias jurdicas (dever de
pagar o tributo e/ou cumprir obrigaes acessrias).
Paulo de Barros Carvalho, no egocentrismo hermenutico que lhe
peculiar, chega a afirmar que o conceito de norma guarda
homogeneidade sinttica, alegando que difcil admitir que o comando
dentico jurdico deixe de revestir aquela estrutura imputativa
trabalhada por Hans Kelsen. A estrutura jurdica, para a doutrina
clssica, no contm elementos valorativos, sendo certo que:
O legislador formula conceitos sobre os fatos do mundo
real-social, escolhendo aqueles que ostentem signos presuntivos de
riqueza econmica. Entretanto, dada a multiplicidade de aspectos que
dizem respeito a todo e qualquer acontecimento, o legislador v-se
compelido a selecionar caracteres, eleger traos, indicar meios de
identificao do fato que quer juridicizar, que aparecer, ento, como
recorte daquilo que seria o fato bruto. Pontes de Miranda utilizou
suporte ftico para designar o fato bruto e o fato jurdico para
referi-se quela poro demarcada pelas notas da descrio hipottica.
Acrecentemos que o fato bruto, o suporte ftico, plurilateral; o
fato jurdico que , todo ele exclusivamente jurdico.
Note-se que os signos presuntivos de riqueza esto fora do
suporte ftico da norma, sendo uma presuno jures et de jure do
legislador. Nas palavras do supracitado PBC:
Consoante ousamos supor, no Brasil, o sistema do direito
positivo, exibe em todas as figuras tributrias conhecidas, a
observncia do princpio da capacidade contributiva absoluta, (sic!)
uma vez que os fatos escolhidos so aqueles que denotam signos de
riqueza. Em outras palavras, por capacidade contributiva deve
entender-se apenas a absoluta e, mesmo assim, como dado pr-jurdico.
Realizar o princpio da capacidade contributiva quer significar,
portanto, a opo a que se entrega o legislador, quando elege para
antecedente das normas tributrias fatos de contedo econmico que,
por terem essa natureza, fazem pressupor que as pessoas que deles
participam apresentam condies de colaborar com o Estado mediante
parcelas de seu patrimnio.
O conceito de norma jurdica tributria fundamental para os
operadores do direito, pois compreende diversos elementos que no se
resumem apenas ao texto legal. Entretanto, sua estrutura foi
desenvolvida segundo o pensamento do direito penal clssico, sem
considerar os elementos normativos do tipo, desenvolvidos a partir
da escola Neokantista, os quais, atualmente, se encontram no
conceito estratificado de crime. Assim, para os tributaristas que
adotam o modelo lgico-formal, a hiptese de incidncia se comporta
como um tipo penal, fattispecie, em italiano, ou tatbestand, para a
doutrina germnica, mas no modelo do sculo XIX.Esse um ponto crucial
para o direito tributrio e merece ser atualizado, assim como a
prpria idia de crime foi re-conceitualizada pela doutrina
garantista. Os penalistas ampliaram o instituto do fattispecie, e
desenvolveram uma espcie de tipicidade conglobante, cujo conceito
envolve os elementos formais do crime (conduta, nexo de
causalidade, dolo e culpa) aliados a elementos valorativos que
demonstram a real ofensa ao bem jurdico tutelado (lesividade,
fragmentariedade, insignificncia, inexigibilidade de conduta
diversa etc..). Sob essa tica, no haveria crime se todos esses
elementos no estivessem presentes, isto , o suporte ftico no seria
preenchido, impedindo a conseqncia jurdica da imposio de
sano.Alfredo Augusto Becker chega a desenvolver bem a idia, mas
opta por no inserir o princpio da capacidade contributiva no
suporte ftico da norma tributria, talvez por no compreend-lo na sua
normatividade constitucional.A hiptese de incidncia no mnade. Para
a composio de uma nica hiptese de incidncia, entram mltiplos fatos
(atos, fatos, estados de fato), jurdicos e/ou no-jurdicos, que
podem estar reunidos na mais diversa combinao de nmero e espcie. Na
composio da hiptese de incidncia, h um fato que desempenha a funo
de ncleo e, por excluso, todos os demais fatos exercem a funo de
elementos adjetivos. Na hiptese de incidncia tributria, o ncleo o
fato escolhido para a base de clculo. Toda e qualquer hiptese de
incidncia, ao realizar-se, acontece num determinado tempo e espao.
A regra jurdica ao preestabelecer os fatos que integralizaram a
hiptese de incidncia, logicamente tambm predeterminou as
coordenadas de tempo e as de lugar para a realizao da hiptese de
incidncia.Capacidade contributiva A circunstncia daquele fato lcito
ser (ou no) um fato signo presuntivo de capacidade contributiva,
assume relevncia jurdica somente naqueles pases cujo sistema
jurdico contiver regra jurdica constitucional, juridicizando o
princpio da capacidade contributiva. Exclusivamente naqueles pases,
o legislador tem o dever jurdico de escolher para a composio da
hiptese de incidncia tributria fatos que sejam signos presuntivos
de renda ou capital acima do mnimo indispensvel.Porm, a regra
jurdica que tiver sido estruturada desta maneira, tem uma atuao
dinmica idntica da regra jurdica que estabelece juris et de jure,
isto , para ocorrer sua incidncia basta a realizao dos fatos signos
presuntivos da capacidade contributiva, ainda que, no caso concreto
individual no exista a capacidade contributiva (sic!)
Nos pases onde o princpio da capacidade contributiva no for
regra constitucional, qualquer fato lcito poder integrar a composio
da hiptese de incidncia tributria. A justia ou injustia do tributo
no invalida a regra jurdica tributria, pois problema pr-jurdico de
Poltica Fiscal (sic!).
O mtodo jurdico-formal foi de grande valia para o contexto em
que se apresentava, entretanto, atualmente mostra-se insuficiente.
Tal concluso se depreende da simples leitura do prembulo da
Constituio da Repblica de 1988, que mesmo no dotado de eficcia
jurdica, apresenta as diretrizes de uma hermenutica que se volta
para a proteo e promoo da dignidade da pessoa humana em suas
mltiplas dimenses. Ademais, diante da fora normativa da Constituio
e considerando o regime geral dos direitos fundamentais,
caracterizado pela proteo diferenciada do art. 60, 4, IV em cotejo
com a clusula de aplicabilidade imediata do art. 5, 1, da CRFB e a
respectiva extenso do catlogo conferida pelo 2 deste mesmo artigo,
verifica-se que existem outros elementos no sistema, de contedo
valorativo, que devem integrar o suporte ftico da norma
jurdico-tributria, por expressa determinao Constitucional.Essa a
proposta do pensamento sistemtico no direito tributrio, que passa a
compreender a Constituio como um sistema de regras e princpios
orientados promoo da dignidade da pessoa humana e aos objetivos da
Repblica.Na viso de Pulo Caliendo: O desafio est posto em entender
a Constituio no apenas como conceito original ou norma superior,
mas como um sistema integrado, de tal forma que o prprio Direito
Tributrio no possa ser entendido sem sua referncia princpios que
perpassam a todo sistema tributrio. A Constituio no seria, assim,
mera fonte formal ou elemento de estruturao e unidade, mas
constitutinte da estrutura semntica das normas tributrias. O tema
constitucional, ao perpassar todo o discurso jurdico-tributrio,
garantindo-lhe coerncia, consistncia e conformidade, determina
tanto a estrutura sinttica necessria (regra matriz de incidncia
tributria), quanto a estrutura semntica suficiente (argumento). E o
elemento integrador de todo o sistema tributrio ser a noo de
direitos fundamentais do contribuinte, com base na idia de justia
fiscal
Com efeito, verificamos que o art. 150 da Constituio trata das
limitaes ao poder de tributar, isto , condies que, caso
implementadas, impedem o preenchimento do suporte ftico do dever
fundamental de pagar tributos, inviabilizando a produo de sua
conseqncia jurdica, ou seja, o prprio nascimento da relao jurdica
tributria. Sob uma perspectiva sistemtica, verifica-se que a
maioria das imunidades e dos princpios tributrios, so autnticas
especializaes dos direitos e garantias fundamentais do art.5,
assim, a seo das limitaes do poder de tributar comporta fragmentos
normativos que integram a hiptese de incidncia da norma tributria.
Ademais, pela leitura do art. 150, CRFB, observa-se a abertura do
sistema de garantias, significando que as limitaes decorrem de
vrios dispositivos da Constituio, fora do Sistema Tributrio, as
quais encontram-se principalmente no ttulo II (dos direitos e
garantias fundamentais) e no ttulo VII (Da ordem econmica e
financeira).O princpio da capacidade contributiva ganha densidade a
partir do princpio estruturante do Estado Democrtico de Direito que
destinado a assegurar o exerccio dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurana, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justia como valores supremos de
uma sociedade fraterna, ganha mais concretude nos termos do art. 3
da CRFB: Constituem objetivos fundamentais da Repblica Federativa
do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidria; III
- erradicar a pobreza e a marginalizao e reduzir as desigualdades
sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos
de origem, raa, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminao. Complementa-se com o art. 170: A ordem econmica,
fundada na valorizao do trabalho humano e na livre iniciativa, tem
por fim assegurar a todos existncia digna, conforme os ditames da
justia social, observados os seguintes princpios: III - funo social
da propriedade; VII - reduo das desigualdades regionais e
sociais.Todas essas diretrizes (fragmentos normativos Prembulo cc
Art.1, III cc art.3, I, III, IV cc art.170, III e VII) podem ser
agrupadas num nico conceito: tributo com efeito de confisco, que
elemento integrante do suporte ftico da norma tributria, sem o qual
no h formao da relao jurdica tributria.Art. 150. Sem prejuzo de
outras garantias asseguradas ao contribuinte, vedado Unio, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municpios:IV - utilizar tributo
com efeito de confisco;Podemos sintetizar o suporte ftico da norma
tributria em lgica formal da seguinte maneira:Njt = Hft ^ Hi ^ (EC)
OCJIsso significa que a norma jurdica tributria (Njt) composta pela
hiptese de fato antecedente (Hft), mais a hiptese de incidncia,
composta pelas imposies do Estado, utilizando-se o smbolo da
conjuno lgica (^), mais a ausncia de efeito confiscatrio (EC),
representado pelo smbolo lgico de conjuno (^) aliado ao conectivo
lgico da negao da proposio (). Portanto, a ocorrncia jurdica (OCJ)
s poder ocorrer, se e somente se () estiverem presentes todos estes
elementos. 3 A intributabilidade do mnimo existencialSem a pretenso
de exaurir o tema que comporta inmeras relaes, possvel afirmar que
existe um direito fundamental, de estrutura complexa, que garante
ao indivduo que no tenha condies de, por si s, ou com o auxlio de
sua famlia, prover a sua subsistncia, um conjunto de prestaes
estatais que lhe assegure uma vida condigna. Este direito envolve
toda a teoria geral dos direitos fundamentais, em suas mltiplas
dimenses, o que implica em funes de defesa contra a atuao invasiva
e desproporcional do Poder Pblico ou de outros particulares em seu
mbito de proteo, como tambm em funes de prestao social; prestaes
jurdicas (direito legislao), bem como funes de participao na tomada
de decises coletivamente vinculantes.Nesse sentido, so
esclarecedoras as lies de Ingo Sarlet:
Com base em tudo o que foi exposto e afastando-nos de formulao
anterior sobre esse tema, entendemos que uma classificao dos
direitos fundamentais constitucionalmente adequada e que, por sua
vez, tenha como ponto de partida as funes por eles exercidas,
poderia partir, na esteira da proposta de Alexy, da distino dois
grandes grupos: os direitos fundamentais na condio de direitos de
defesa e os direitos fundamentais como direitos a prestaes (de
natureza ftica e jurdica). O segundo grupo (dos direitos
prestacionais), dividir-se-ia igualmente em dois subgrupos, quais
sejam, o dos direitos a prestaes em sentido amplo (englobando, por
sua vez os direitos de proteo e os direitos participao na organizao
e no procedimento) e o dos direitos a prestaes em sentido estrito
(direitos a prestaes materiais sociais), salientando que a ambos se
aplica a distino entre os assim denominados direitos derivados e os
direitos originrios a prestaes(...)Para facilitar a visualizao,
oferece-se o esquema que segue (...)- Direitos fundamentais como
direitos de defesa
- Direitos fundamentais como direitos a prestaes
Direitos a prestaes em sentido amplo
Direitos proteo
Direitos participao na organizao e procedimento
Direitos a prestaes em sentido estrito
As origens desse direito denotam a idia de caridade e do combate
pobreza, que passou a se firmar ao longo do sculo XIX, com a
concepo de Estado de Bem Estar Social, (Wellfare-State) encontrando
sua primeira afirmao textual na Constituio da Repblica de Weimar,
na Alemanha, em 1919, onde foi associada a noo do mnimo existencial
idia de dignidade da pessoa humana. Na doutrina do segundo
ps-guerra, se destaca a obra de Otto Bachof, que, em meados da
dcada de 50, afirmou que o princpio da dignidade da pessoa humana
no reclama apenas a garantia de liberdade, mas tambm um mnimo de
segurana social, uma vez que sem os recursos materiais mnimos para
a subsistncia, a prpria idia de dignidade perde o sentido.
No acampo terico, atualmente existem duas vertentes sobre o
contedo do mnimo existencial, a primeira delas capitaneada por
Ricardo Lobo Torres afirma que o mnimo existencial corresponde ao
ncleo essencial dos direitos sociais, partindo de uma concepo de
limites imanentes, o jurista sustenta que este direito compreendido
como o conjunto de prestaes materiais indispensveis para assegurar
a cada pessoa uma vida digna, ncleo este blindado contra toda e
qualquer interveno por parte do Estado e da sociedade.
A segunda posio a de Ingo Sarlet, que conforme supra-exposto,
parte de uma teoria geral dos direitos fundamentais, nos moldes de
Robert Alexy, e compreende que cada direito fundamental possui um
ncleo essencial, de contedo varivel, uma vez que todos eles esto
sujeitos a condies fticas e jurdicas ideais, bem como a limites e
restries decorrentes de eventuais colises com outros direitos. Essa
posio parece ser mais vantajosa, pois abre o conceito para alm de
um mnimo vital, sem deixar de considerar como norte interpretativo
os direitos sociais como: moradia, alimentao, sade, educao, proteo
maternidade etc.Na seara tributria, Ricardo Lobo Torres a
referncia, pois trata-se de um autor que, desde longa data, se
preocupa com a questo da tributao sobre o mnimo existencial,
afirmando que a tributao no Estado Democrtico de Direito se
processa inteiramente sob a tica do direitos fundamentais, sendo
assim ela:
[...] passa a se fazer com fundamento no princpio da capacidade
contributiva e no seu subprincpio da progressividade, que ingressam
nas Constituies da Frana e do Brasil, entre outras, o que implica a
proibio da incidncia sobre a parcela mnima necessria existncia
humana digna, que, estando alm da capacidade econmica e
constituindo reserva da liberdade, limita o poder fiscal do Estado.
(grifo nosso) Destarte, compreende-se que o mnimo existencial
desempenha, precipuamente, no direito tributrio uma funo defensiva,
que objetiva excluir do campo de incidncia tributria signos
presuntivos de riqueza que, na realidade, denotam justamente o
contrrio. Por ter acento constitucional ele representar uma
garantia fundamental do cidado que assume a forma de imunidade, na
medida em que o poder de imposio fiscal do Estado no pode invadir a
esfera de liberdade mnima daquele desprovido de capacidade para
prover o seu prprio sustento.Marciano Buffon nos d precisamente a
dimenso do conceito:
Em qualquer modelo estatal e no Estado Social principalmente
inadmissvel que o cidado desprovido de capacidade para prover o seu
prprio sustento seja compelido a contribuir para o Estado,
especialmente quando este lhe sonega aquilo de mais bsico que
prometeu prover (sade, educao, segurana, habitao, salrio digno,
etc.).
4 Possveis horizontes para a proteo dos vulnerveisApesar das
premissas levantadas e da concluso mais do que bvia, verifica-se
que o paradigma neoconstitucionalista se mostra muito ineficaz na
proteo dos vulnerveis quando se trata do tema da tributao sobre o
consumo, uma vez que esse tipo de exao se processa de forma
invisvel e sorrateira, reduzindo significativamente a economia de
famlias inteiras que destinam quase que integralidade de seus
vencimentos em despesas com alimentao, sade, moradia e educao.
Nos tributos indiretos, mormente no ICMS, IPI e ISS o sujeito
passivo da obrigao tributria repassa ao preo dos produtos e servios
o custo respectivo, sendo certo que o nus tributrio sempre
suportado pelo consumidor final.
Uma hiptese para se amenizar esse efeito se encontra na aplicao
do princpio da seletividade, mediante aplicao de alquotas menores,
ou at mesmo da alquota 0%, a bens indispensveis a subsistncia, ao
passo que bens considerados suprfluos seriam tributados com
alquotas maiores. Entretanto, na prtica, observa-se que tal
princpio no observado pelo Legislador e que as isenes funcionam
como moeda de troca para os interesses polticos mais escusos. O
ideal seria uma ampla reforma tributria, que ao modelo dos
verdadeiros Wellfare- State escandinavos, como Sucia, Dinamarca,
Sua, Finlndia e Noruega, optasse por tributar mais a renda e o
patrimnio ao invs do consumo. Uma vez que, nestes pases se constata
o menor ndice de concentrao de riquezas e desigualdades sociais.
Falar em cidadania e objetivos da Repblica com um sistema tributrio
como o brasileiro definitivamente uma utopia.
Marciano Buffon, citando a doutrina de Herrera Molina traz lume
outra alternativa:
Por isso, impe-se a busca de alternativas eficazes para, pelo
menos, preservar o mnimo existencial da imposio tributria indireta.
Conforme sustenta Herrera Molina, a soluo para garantir-se o mnimo
vital existncia humana nos tributos indiretos consistiria em duas
alternativas: a) a exonerao dos bens de primeira necessidade; b) o
pagamento de uma compensao equivalente imposio indireta suportada
por um consumo mnimo, sendo que a compensao poderia ser efetivada
atravs de um crdito a ser deduzido do imposto sobre a renda ou, nos
casos de renda abaixo de determinados nveis mnimos, atravs de um
sistema de transferncia estatal que beneficiasse esses indigentes.
De nossa parte, entendemos que no cabe ao jurista quedar-se inerte.
Um verdadeiro neoconstitucionalismo, critique-se ou no, pressupe
uma postura mais ativa do Poder Judicirio frente s omisses e
descalabros do Poder Legislativo.
Essa nova viso da Constituio, compreendida na sua fora normativa
e vinculante, operou uma verdadeira reengenharia institucional no
Poder judicirio, que ocorreu em grande medida, em decorrncia do
processo de redemocratizao do pas, proporcionado pela promulgao da
Constituio da Repblica de 1988, responsvel pela implementao de um
abrangente sistema de controle de constitucionalidade, no restrito
apenas as tradicionais Aes Direitas de
Inconstitucionalidade.Entendido como hbrido ou ecltico, ele combina
aspectos do sistema americano e europeu. Assim, desde o incio da
Repblica, adota-se a frmula americana de controle incidental e
difuso, pelo qual qualquer juiz ou tribunal pode deixar de aplicar
uma lei, em um caso concreto que lhe tenha sido submetido, caso a
considere inconstitucional. Por outro lado, tambm se faz uso do
modelo europeu pela via do controle direto da constitucionalidade,
permitindo que determinadas matrias sejam levadas em tese e
imediatamente ao Supremo Tribunal Federal. Alm disso, verifica-se a
ampliao do rol de legitimados propositura do controle, conforme
previsto no art. 103/CF, atribuindo a inmeros rgos, bem como
entidades pblicas e privadas (como as sociedades de classe de mbito
nacional e as confederaes sindicais) a faculdade de ajuizar aes
diretas.
Fora o controle pela de via Ao Direta de Inconstitucionalidade,
tambm surgiram: Ao de Descumprimento de Preceito Fundamental (art.
102, 1/CF); Ao Direta de Inconstitucionalidade por Omisso (art.
103, 2/CF); Mandado de Injuno (Art. 5 LXXI/CF); Representao
Interventiva (art. 34, VII, c/c art. 36, III/CF); alm da edio de
smulas vinculantes (Art. 103-A/CF); e a Reclamao Constitucional
(art. 102, l/CF).Ademais, verifica-se o uso de novos instrumentos
voltados tutela dos interesses transindividuais, cuja prpria
denominao foi trazida por uma das principais leis que regem tais
interesses, (Lei 8.078/90), ou seja, o denominado Cdigo de Defesa
do Consumidor (CDC).
O surgimento da tutela dos interesses difusos e coletivos se
efetivou com a Lei 7.347/85, conhecida como a Lei da Ao Civil
Pblica (LACP), reconhecida como instrumento revolucionrio no
direito processual brasileiro. Isso porque no se pode falar em
Direito Processual Coletivo antes da entrada em vigor da referida
lei. Desta forma, pode-se considerar que a LACP, o CDC e a prpria
Constituio da Repblica de 1988, representam hoje um subsistema de
tutela jurisdicional coletiva, imprescindvel defesa dos novos
direitos difusos e coletivos, uma vez que a natureza individualista
do Cdigo Processual Civil no mais adequada para essa
finalidade.
verdade que o arguto legislador retirou do cidado a
possibilidade do manejo de ACP em matria tributria, por expressa
determinao legal:Lei 7.347/85 - Art. 1 Regem-se pelas disposies
desta Lei, sem prejuzo da ao popular, as aes de responsabilidade
por danos morais e patrimoniais causados:
Pargrafo nico.No ser cabvel ao civil pblica para veicular
pretenses que envolvam tributos, contribuies previdencirias, o
Fundo de Garantia do Tempo de Servio - FGTS ou outros fundos de
natureza institucional cujos beneficirios podem ser individualmente
determinados. (Includo pela Medida provisria n 2.180-35, de 2001)A
jurisprudncia tambm est sedimentada no sentido da ilegitimidade do
Ministrio Pblico para ajuizar aes relativas matria tributria:
TRIBUTRIO. AO CIVIL PBLICA. TERMO DE ACORDO DE REGIME ESPECIAL.
TARE. ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINITRIO PBLICO. PRECEDENTES DO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA. Reconhece-se a ilegitimidade do
Ministrio Pblico para ajuizar ao civil pblica em matria tributria,
ante a vedao expressa do artigo 1, pargrafo nico, da Lei 7.347/85.
Precedentes do Superior Tribunal de Justia. (fls. 478/479, Relator
Desembargador Natanael Caetano, julgado em 2/5/2007, DJ de
31/5/2007) (grifos nossos). Na origem, o Ministrio Pblico ajuizou
ao civil pblica contra ** e o Distrito Federal com o objetivo de:
(i) anular Termo de Acordo de Regime Especial TARE, firmado entre
ambos, nos termos da Lei Distrital 1.254/96, alterada pela Lei
Distrital 2.381/99, que estabeleceu o regime especial de apurao do
Imposto sobre Circulao de Mercadorias e Servios - ICMS devido pela
empresa ou, alternativamente, anular apenas a primeira clusula do
referido ajuste; e (ii) obter a condenao desta ao pagamento do
imposto no recolhido, acrescido de juros e correo monetria, desde a
citao. Na inicial, o Parquet alegou, em resumo, que o DF, invadindo
matria reservada lei complementar federal, editou o Decreto
Distrital 20.322/99, guisa de regulamentar a citada Lei Distrital
2.381/99, autorizando o comrcio atacadista ou distribuidor a
abater, indevidamente, o montante do imposto cobrado nas operaes
anteriores, na forma de alquotas variveis. Acrescentou, ainda, que
a Secretaria de Fazenda do Distrito Federal, deixando de observar
os parmetros estabelecidos no prprio Decreto, editou a Portaria
292/99, que estabeleceu percentuais de crdito fixos para os
produtos que enumera, tanto para as sadas internas quanto para as
interestaduais, diminuindo, assim, o valor que deveria ser
recolhido a ttulo de ICMS. Disse, mais, que, ao cabo de doze meses
de vigncia do acordo, o Subsecretrio da Receita do DF descumpriu o
disposto no art. 36, 1, da Lei Complementar Federal 87/96 e nos
arts. 37 e 38 da Lei Distrital 1.254/96, porque no teria procedido
apurao do imposto devido, com base na escriturao regular do
contribuinte, apurando eventuais diferenas positivas ou negativas,
para o efeito de pagamento ou compensao RE - 576155
(AC20050111015942, Min. Rel Ricardo LEWANDOWSKI,
15/05/2014)Entretanto, quando a questo envolve direitos que no
exclusivamente tributrios, a jurisprudncia flexvel, mormente quando
se trata de questes envolvendo servios pblicos essenciais e
direitos do consumidor.
O Ministrio Pblico possui legitimidade para propor ao civil
pblica com o fim de reduzir reajuste na tarifa de transporte
coletivo. Com base nesse entendimento, a Turma negou provimento a
recurso extraordinrio interposto pelo Municpio de Santos/SP em que
se sustentava ofensa aos arts. 1; 2; 30; 34, VII, c e 129, todos da
CF, sob alegao de ilegitimidade do parquet e afronta ao princpio
federativo e autonomia municipal. Considerou-se presente o
interesse difuso, porquanto caracterizada a sua natureza
indivisvel, bem como envolvidos segmentos indeterminados da
sociedade. Asseverando tratar-se de relao de prestao de servios,
submetida ao Cdigo de Defesa do Consumidor, e no de questo
tributria, entendeu-se adequada a competncia do Ministrio Pblico
(CF, art. 129, III). Ressaltou-se, ainda, que a autonomia municipal
no obsta a preservao de direitos difusos. Precedentes citados: RE
195056/PR (DJU de 14.11.2003); RE 213631/MG (DJU de 7.4.2000); AI
491195 AgR/SC (DJU de 7.5.2004); RE 163231/SP (DJU de 29.6.2001).
RE 379495/SP, rel. Min. Marco Aurlio, 11.10.2005. (RE-379495)
Associao e Legitimidade Ativa (Transcries) (v. Informativo 346)
AI 382298 AgR/RS* RELATOR P/ ACRDO: MIN. GILMAR MENDES Voto-vista:
Cuida-se de hiptese de ao rescisria com o objetivo de desconstituir
acrdo proferido em ao civil pblica apresentada por associao na
defesa de direitos individuais homogneos. Para tanto, a agravante,
entre outros argumentos de sua ao rescisria, alegou a falta de
legitimidade ativa da associao, nos seguintes termos (fl. 14): "c.1
- no reconheceu a ilegitimidade da APADECO, como j havia acontecido
com o j citado Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor no E.
STJ, onde, considerando os interesses dos associados deste ltimo
como individuais homogneos, deu-se pela ilegitimidade ativa da
autoria e pela impropriedade da tutela face, tambm, diferena entre
contribuinte e consumidor. De tal forma, a ao civil pblica deveria
ter sido extinta, ex-vi" do art. 267, VI, do CPC; c.2 - violou o
art. 5, XXI, da Constituio Federal de 1988 e, novamente, pela
presena da ilegitimidade ativa, o art. 267, VI, do CPC - porque
entendeu desnecessria a expressa autorizao dos interessados
individuais para a representao em juzo, s dispensvel, luz do Cdigo
de Defesa do Consumidor (arts. 81 e 82) e Lei n 7.347/85 (arts. 1 e
5, II), quando se trate de ao onde se hajam de preservar interesses
difusos, inclusive de consumidores, o que no era o caso; c.3 - no
fez a devida diferenciao das relaes obrigacionais entre
"contribuintes" e "consumidores", de tal forma que, aceitando umas
pelas outras, violou os arts. 2, 3, 81 e 82, IV, do Cdigo do
Consumidor e arts. 3 e 121, do CTN, alm dos arts. 5, XXXII, e 150,
II e 170, V, da CF/88 definidores de quem consumidor e de quem
contribuinte (sujeito passivo de obrigao tributria);" (...). O
acrdo recorrido extraordinariamente definiu os limites da discusso
da seguinte forma (fl. 73): "Todos os argumentos apresentados pela
Unio, como ressaltou o ilustre membro do Ministrio Pblico Federal,
constituem decorrncias lgicas de uma nica questo jurdica: a saber
se possvel a proteo de contribuintes em sede de ao civil pblica
(fls. 118)". Verifica-se, que o cerne da questo est na qualificao
dada aos assim chamados substitudos pela associao na defesa de seus
interesses individuais homogneos: se consumidores ou contribuintes,
tendo a agravante suscitado tal questionamento inclusive sob
argumento constitucional, conforme se depreende do trecho de sua ao
rescisria acima transcrito. O acrdo recorrido extraordinariamente
entendeu que (fl. 73): "... se a lei autoriza a propositura de ao
civil pblica por associaes que incluam entre suas finalidades
institucionais, entre outras, a proteo ao consumidor ou a qualquer
interesse difuso ou coletivo e a APADECO, expressamente, tem por
finalidade essencial promover a defesa do consumidor, de acordo com
as normas do Cdigo de Defesa do Consumidor (CODECOM) e legislao
correlata, como tambm dos contribuintes e quaisquer outras pessoas,
relativamente aos danos causados ao meio ambiente e a qualquer
outro interesse difuso ou coletivo, na forma da Lei de Ao Civil
Pblica e legislao vigente, no h falar em ilegitimidade ativa. Creio
que seria quase desnecessrio ressaltar, porquanto a doutrina
posterior edio do Cdigo de Defesa do Consumidor unnime nesse
aspecto, que a ao civil pblica no se presta somente para a tutela
de interesses difusos e coletivos, serve tambm para a proteo dos
interesses individuais homogneos, como o dos consumidores de
gasolina e lcool no perodo de vigncia do Decreto-Lei n 2.288, de
1986, que foram compulsoriamente contribuintes da exao l prevista e
posteriormente considerada inconstitucional" (...). Percebe-se,
portanto, que o Tribunal de origem legitimamente decidiu as argies
trazidas pela agravante, principalmente quando explicitou, conforme
a passagem acima transcrita, que a agravada agiu na defesa dos
interesses individuais homogneos dos contribuintes da exao prevista
pelo Decreto-lei n 2.288, de 23 de julho de 1986. Dvida no subsiste
de que a legitimidade da autora para propor ao civil pblica na
matria foi apreciada*(acrdo pendente de publicao RE387990, Rel.
MIN. CARLOS VELLOSO)Concluso
Destarte, a guisa de concluses, visualiza-se a possibilidade do
uso da Ao Civil Pblica em questes que envolvam a tributao no
consumo, por representar interesse de toda uma coletividade de
pessoas carentes que no dispem de meios idneos para fazer valer o
seu direito a uma existncia digna.Nesse sentido, tambm de grande
valia o Inqurito Civil Pblico, que pode abrir as portas para um
levantamento de quais bens de consumo representam maior gravame
para a subsistncia deste grupo de vulnerveis, bem como possibilitar
a participao dos mesmos em audincias pblicas no intuito de apurar
quais as necessidades bsicas que envolvem a tributao sobre o mnimo
existencial. Feitas as devidas apuraes e pesquisas no mbito do
inqurito, nada obsta que o parquet busque a exonerao destes bens de
primeira necessidade, determinando que o Poder Pblico elabore
medidas de compensao no mbito da Lei de Responsabilidade Fiscal,
principalmente via convnio com a Unio, que registrar o aumento na
renda das Pessoas Jurdicas beneficiadas com a iseno sobre a
circulao de mercadorias no mbito dos Estados
Federados.BibliografiaALEXY, Robert. Teoria dos Direitos
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Interpretao e Aplicao da Constituio. 7 Ed. So Paulo:Saraiva,
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Livraria do Advogado, 2009.ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos
Fundamentais. So Paulo: Malheiros, 2008.
.SARMENTO, Daniel. E SOUZA NETO, Claudio Pereira de. (org.) A
constitucionalizao do Direito: Fundamentos Tericos e Aplicaes
Especficas. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2007, p.10.
Cf.BARROSO,Luis Roberto. Interpretao e Aplicao da Constituio. 7
Ed. So Paulo:Saraiva, 2009.
Cf.BARROSO,Luis Roberto. Interpretao e Aplicao da Constituio. 7
Ed. So Paulo:Saraiva, 2009, p. 203.
CANOTILHO, Jos Joaquim. Gomes. Direito Constitucional e Teoria
da Constituio. 7 Ed. Portugal, Coimbra, Almedina, 2003, p. 693.
SILVA, Jos Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.
27 Ed. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 46.
CANOTILHO, Jos Joaquim. Gomes. Direito Constitucional e Teoria
da Constituio. 7 Ed. Portugal, Coimbra, Almedina, 2003, p.1150.
.SARMENTO, Daniel. E SOUZA NETO, Claudio Pereira de. (org.) A
constitucionalizao do Direito: Fundamentos Tericos e Aplicaes
Especficas. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2007, p.113.
MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 4 Ed.
So Paulo: Saraiva, 2009,pg129.
Que no so apenas os juzes, mas todos os atores processuais.
SILVA, Virglio Afonso da. Direitos Fundamentais: Contedo
essencial, restries e eficcia.
So Paulo: Malheiros, 2009, pg 45.
Uma primeira caracterstica importante que decorre do que foi
dito at agora o distinto carterprima facie das regras e dos
princpios. Princpios exigem que algo seja realizado na maior medida
possvel dentro das possibilidades jurdicas e fticas existentes.
Nesse sentido, eles no contm um mandamentodefinitivo, mas apenas
prima facie. Da relevncia de um princpio em um determinado caso no
decorre que o resultado seja aquilo que o princpio exige para esse
caso. Princpios representam razes que podem ser afastadas por razes
antagnicas. A forma pela qual deve ser determinada a relao entre
razo e contra- razo no algo determinado pelo prprio princpio. Os
princpios, portanto, no dispem da extenso de seu contedo em face de
suas restries e das possibilidades fticas.-ALEXY, Robert. Teoria
dos DireitosFundamentais. So Paulo: Malheiros, 2008, p.103.
por exemplo: ausncia de recursos suficientes no fornecimento de
certos medicamentos para a realizao mxima do direito sade)
Possvel coliso com outros princpios, ausncia de regulamentao
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficcia dos direitos fundamentais. 10
Ed. Porto Alegre, 2009, p.40.
CALIENDO, Paulo. Direito tributrio: Trs modos de pensar a
tributao. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p.83.
SARMENTO, Daniel. Direito constitucional: Teoria, histria e
mtodos de trabalho. Belo Horizonte: Frum, 2012. p.74.
MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat. O esprito das Leis. 7
ed., So Paulo: Saraiva, 2000.
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributrio: linguagem e mtodo.
5 Ed. So Paulo: Noeses, 2013, p. 129.
Idem. P. 148.
Idem. p. 336
Cf. DELMANTO JR., Celso. Do iluminismo ao direito penal do
inimigo. In: FRANCO, Alberto Silva. E NUCCI, Guilherme de Souza.
Doutrinas Essenciais: Direito Penal. Vol.I. So Paulo: RT, 2010, p.
1117.
Cf. ZAFFARONI, Eugenio Ral. PIERANGELI, Jos Henrique.Manual de
Direito Penal Brasileiro V.1. 6 edio. So Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2006.
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributrio. 3
Ed. So Paulo: Lejus, 1998, p. 263-264.
CALIENDO, Paulo. Direito tributrio: Trs modos de pensar a
tributao. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 141.
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficcia dos Direitos Fundamentais. 10
Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 167.
_________. Mnimo Existencial e Direito Privado: Apontamentos
sobre algumas dimenses da possvel eficcia dos direitos fundamentais
sociais no mbito das relaes jurdico-privadas. In: SOUZA NETO,
Claudio Pereira de. & SARMENTO, Daniel. (org.). A
constitucionalizao do Direito: Fundamentos Tericos e Aplicaes
Especficas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
TRORRES, Ricardo Lobo. O direito ao mnimo existencial. Rio de
Janeiro: Renovar, 2009.
SARLET, Ingo Wolfgang. (Org.). Dimenses da dignidade. Ensaios de
Filosofia do Direito e Direito Constitucional, Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2005, p. 88-89.
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. So Paulo:
Malheiros, 2008.
TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional
financeiro e tributrio. Os direitos humanos e a tributao:
Imunidades e Isonomia. 3 Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. V.III,
p. 169-170.
BUFFON, Marciano. Tributao e dignidade humana: entre os direitos
e deveres fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009,
p. 181.
Cf. ESPING-ANDERSEN, Gosta. The Three Worlds of Welfare
Capitalism. Oxford: Polity Press, 1990.
Idem. p. 216.
MAZZILI, Hugo Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juzo. 22
Ed. So Paulo: Saraiva, 2009.
No que concerne ao instituto do convnio:
http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/manual_de_convenios.pdf