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 Ata r d e z i n h ade s á b a do, um pou c oc i nzent a , um pou c o f ria, parec e n ãop o ssu i r nad a de mu i t op art i cu l ar pa r an i n gu ém . O sau t omóvei sdesl iz am; asp ess oasen tr am esaem do s ci n em as; osn amor ad oscon ver sam p or aqu i epor al i ; osba r esf u n ci on am at i vamente, n u maf ab u l osap r od u çãod es an d u í ch es ecacho rros- qu en t es. A p esar d af r esqu i d ão, as moci n h ast r aze m n os péss an l i asdou r ad as, enqu an t oagas al h am acabeç aem echa r p es de mu i t as vol tas. Tu d o isso é rot i n a. H á u m cer to ar d e monotoni a p or t od a p arte. Ob on d i n ho d o P ão de A çú car l á vai cu m p r i ndo o seu d est i n o t u r í stico, e moços  be m fala n tes ex p l i c a m, de l á p i s n a mã o, e m seus esc r itó r i os color i d o s e e n v i d r a d o s, ap art amen t os qu e vão se r con struí d os em po u cos m eses, com t an tos an da res, vi st a para t od os os l ad os, ves t í b u l os d e mármore, t an t o d e en tr ad a, mai s t an t as p rest açõ es, sem reaj u st amen t o— omelhor em p r egodecap it al j amai soferecido! E m al gu maru azin h a si m tica, com árv ores e sosse go, ai n da h á cri an ças desl u mb r ad as a comer em aquel e al god ão d e açúcar qu e de re p en t e col oca n a p aisagem cari oca u ma p i n cel ad a o ri en t al. E h áosavósdeol h os l osó cos, acon d u zi r em p el amãoa n eti n h aqu eensa i aosp r i mei r os p assei os, como u ma b ai l ari n a pri n ci p i an t e a equ il i b r ar- se n as p on t as d os sa p ati n h os  b rancos. ( E xt r d o d e t ard e d e sá b ad o, d e C ecí l iaMeir el es)
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Tipo Textual-gênero Textual

Feb 14, 2018

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LiaConstantina
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7/23/2019 Tipo Textual-gênero Textual

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 A tardezinha de sábado, um pouco cinzenta, um pouco fria, parece não possuir nada de

muito particular para ninguém. Os automóveis deslizam; as pessoas entram e saem dos

cinemas; os namorados conversam por aqui e por ali; os bares funcionam ativamente,

numa fabulosa produção de sanduíches e cachorros-quentes. Apesar da fresquidão, as

mocinhas trazem nos pés sandálias douradas, enquanto agasalham a cabeça em

echarpes de muitas voltas. Tudo isso é rotina. Há um certo ar de monotonia por toda

parte. O bondinho do Pão de Açúcar lá vai cumprindo o seu destino turístico, e moços

 bem falantes explicam, de lápis na mão, em seus escritórios coloridos e envidraçados,

apartamentos que vão ser construídos em poucos meses, com tantos andares, vista para

todos os lados, vestíbulos de mármore, tanto de entrada, mais tantas prestações, sem

reajustamento — o melhor emprego de capital jamais oferecido! Em alguma ruazinha

simpática, com árvores e sossego, ainda há crianças deslumbradas a comerem aquele

algodão de açúcar que de repente coloca na paisagem carioca uma pincelada oriental. E

há os avós de olhos filosóficos, a conduzirem pela mão a netinha que ensaia os primeiros

passeios, como uma bailarina principiante a equilibrar-se nas pontas dos sapatinhos

 brancos.

(Extraído de tarde de sábado, de Cecília Meireles)

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 AUTOPSICOGRAFIA

O poeta é um fingidor

Finge tão completamente

Que chega a fingir que é dor

 A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,

Na dor lida sentem bem,

Não as duas que ele teve,

Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda

Gira, a entreter a razão,

Esse comboio de corda

Que se chama coração.

Poesias. Fernando Pessoa.