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Desenho Urbano: por uma definição FAUUSP AUP0573 – Desenho Urbano: da teoria ao projeto Prof. Dr. Eduardo Nobre 2º semestre 2011 1
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Desenho Urbano:

por uma definição

FAUUSP

AUP0573 – Desenho Urbano: da teoria ao projeto

Prof. Dr. Eduardo Nobre

2º semestre 2011

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2 FAUUSP - AUP0573 Desenho Urbano: da teoria ao projeto – Prof. Dr. Eduardo Nobre

A partir da II Guerra Mundial ocorreu a consolidação do Urbanismo e da Arquitetura Modernos em vários países do mundo.

Essa consolidação se deu através da criação do aparato de planejamento urbano racionalista e da reconstrução das cidades destruídas, com a promoção de vários conjuntos habitacionais, seguindo os preceitos modernistas dos CIAMs e da Carta de Atenas.

Do ponto de vista político-econômico, a reconstrução do Pós-Guerra ocorreu através da ação de um Estado forte e intervencionista, baseado nos princípios Keynesianos e na promoção do Bem-Estar Social

1. Antecedentes ao surgimento do Desenho Urbano Contemporâneo:

a consolidação da Arquitetura e do Urbanismo Modernos

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Na Europa

1944 Patrick Abercrombie elabora o Plano para a Grande Londres (Greater London Plan)

1946 Construção da Unidade de Habitação de Marselha de Le Corbusier. No Reino Unido é instituída a Lei das Cidades Novas (New Towns Act)

1947 A nova Lei de Planejamento Urbano e Rural (Town & Country Planning Act) consolida os mecanismos do planejamento racionalista

1951 Le Corbusier elabora o plano de urbanização de Chandigard

1954 São criadas as zonas de urbanização prioritária – ZUP (Zone a Urbaniser en Priorité) permitindo a desapropriação de terrenos para a construção de grandes conjuntos habitacionais (Grands Ensembles)

1958 É promulgado o primeiro código de urbanismo francês que institui o planejamento urbano (Code de l'Urbanisme et de l'Habitation)

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Nos Estados Unidos

1949 A Lei da Habitação (Federal Housing Act) é aprovada

1949/1960 Robert Moses, o "corretor do poder", gasta US$ 267 milhões na vasta reformulação da região metropolitana de Nova Iorque em programas de erradicação de cortiços, renovação urbana, construção de vias expressas e parques

1955 O conjunto habitacional de Pruitt Igoe é construído em St. Louis

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No Brasil

1937/1945 O Estado Novo de Vargas.

1945 O edifício do Ministério da Educação é finalizado no Rio de Janeiro.

1948 É construído o Conjunto Habitacional de Pedregulho RJ

1950 Moses elabora o Programa de Melhoramentos para São Paulo.

1955/1960 Juscelino institui o Plano de Metas e constrói Brasília

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2. A Reação à Arquitetura e ao Urbanismo Modernos: o “surgimento” do Desenho Urbano

A partir da década de 60 começa a haver um questionamento da arquitetura e do planejamento urbano modernos.

A destruição da forma urbana pré-existente e a remoção das comunidades instaladas, geralmente de baixa renda, acabaram por ocasionar fortes reações populares.

Estudos urbanos e de sociologia começaram a ser feitos, criticando os efeitos e conseqüências do urbanismo e da arquitetura modernos.

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Foi nesse contexto que a jornalista norte-americana Jane Jacobs escreveu o livro, que se tornaria o ícone de várias teorias urbanísticas recentes até os dias de hoje (The Death and Life of Great American Cities. Nova York, Random House, 1961).

Moradora e ativista urbana do SoHo, em Nova York, Jacobs preocupou-se com os impactos que o planejamento urbano baseado no rodoviarismo e na especulação imobiliária ocasionavam sobre as cidades.

Estabeleceu uma série de parâmetros para o seu desenvolvimento, que até hoje é considerada importante por vários urbanistas.

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Chamou a atenção para a destruição da diversidade urbana que o planejamento e o projeto urbanos modernistas ocasionaram.

Segundo ela, essa diversidade era essencial para a vida urbana e a sua destruição ocasionava a 'morte' da cidades, pois a diversidade de usos e social aumentava a segurança das ruas, ocasionava a otimização do uso da infra-estrutura e viabilizava a presença de atividades econômicas.

Como resultado de seu ativismo, Jacobs conseguiu evitar a construção de grandes obras viárias nos Estados Unidos.

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Em função desse contexto, o modelo de intervenção urbana no final da década de 1960 e na década seguinte se modificou.

Nos Estados Unidos, o governo federal, pressionado pelos revoltas urbanas e a Marcha pelos Direitos Civis reviu a sua política urbana e lançou o programa das "Cidades Modelo", que previa auxílio às cidades e a grupos comunitários para revitalizar e provir de serviços áreas deterioradas ocupadas por populações de baixa renda.

Na Europa, novos estudos urbanísticos e a formação de grupos comunitários mudaram o processo de planejamento e renovação urbana que vinha ocorrendo em cidades como Bolonha (Itália), Amsterdã (Holanda) e Madri (Espanha).

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3. A Conceituação do Desenho Urbano

Para Jonathan Barnett (1982) os planejadores estão preocupados com a distribuição de recursos, parcelamento e uso do solo; enquanto os arquitetos projetam edifícios e tem responsabilidade legal por isso.

Contudo, existe um meio-termo entre essas duas profissões que fica sob responsabilidade de ninguém, já que planejadores não pensam tridimensionalmente e arquitetos não influem no projeto além do terreno

Dessa forma surgiu o campo do desenho urbano nos Estados Unidos com a função de preencher esse vazio, ao que Barnett denomina o "processo de desenhar as cidades, sem desenhar os seus edifícios".

Já Vicente Del Rio (1990) define o DU como:

“Campo disciplinar que trata a dimensão físico-ambiental da cidade, enquanto conjunto de sistemas físico-espaciais e sistemas de atividades que interagem com a população através de suas vivências, percepções e ações cotidianas.”

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Ele afirma que o “Desenho Urbano” é um campo do conhecimento que surge nos países anlgo-saxônicos na década de 1960.

Visto em que nesses países, os cursos de arquitetura (Architecture) e de planejamento urbano (Town Planning) são separados, surge nessa época a necessidade de criar um curso que fizesse a ponte entre esses dois campos do conhecimento.

Surge assim o curso de “Urban Design”, cuja tradução mais próxima do significado real seria “Projeto Urbano”.

Na década de 1980, a comunidade acadêmica brasileira divulga esse campo do conhecimento como o do “Desenho Urbano”, através de uma série de reuniões e eventos científico-acadêmicos, que ocorreram no período.

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Para Hamid Shirvani (1985) o DU é um campo multidisciplinar, que engloba o planejamento urbano, o paisagismo, a arquitetura, engenharia de transportes, psicologia ambiental, desenvolvimento imobiliário, direito urbanístico etc., sendo seus elementos essenciais componentes:

1. Uso do solo – deve propor o "mix" de usos compatíveis que ocasionem a maximização do uso da infra-estrutura instalada

2. Forma e volumetria do espaço construído – a relação das novas construções com o ambiente natural e construído, entre o novo e o velho (recuos, coeficientes urbanísticos, gabaritos, cones visuais, "envelope" da construção, relações de forma e proporção

3. Circulação viária e estacionamento – essenciais para a vitalidade das atividades econômicas na cidade

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4. Espaço público – vias, ruas, calçadas, praças, parques e espaços recreacionais

5. Circulação de pedestres – essencial para a vitalidade do comércio varejista e dos espaços públicos, diminui a necessidade do uso de automóveis.

6. Atividades de apoio – são todas as atividades que animam o espaço público, como o comércio varejista, barzinhos etc.

7. Mobiliário urbano – sinalização, arborização, iluminação pública, equipamentos tais como bancos, telefones públicos, etc.

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4. O Projeto Urbano Contemporâneo: crise econômica mundial e pós-modernismo nas

cidades.

O crescimento sustentado da economia mundial do Pós-Guerra manteve-se até a década de 70. Contudo, as sucessivas crises do petróleo e o rompimento do tratado de Bretton Woods mergulharam o mundo numa crise econômica sem precedentes.

As transformações político-econômicas decorridas dessa crise tiveram grandes implicações na política urbana de várias cidades do mundo.

A decadência econômica dos antigos centros industriais dos países de capitalismo avançado ocasionou à reformulação das políticas urbanas em várias dessas cidades.

Governos locais e grupos empresariais mobilizaram-se para atrair capitais, estimulando o mercado imobiliário, através de grandes projetos de renovação urbana em antigas áreas industriais abandonadas pelo paradigma pós-fordista.

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Com a clara intenção de reverter o processo de decadência econômica e de atrair novos investimentos, num período de grande concorrência, as cidades desenvolveram estratégias políticas, econômicas e culturais, numa tendência que foi denominada de "marketing urbano".

Em muitas cidades houve uma mudança no controle ao desenvolvimento urbano, que em vez de colocar empecilhos à aprovação dos empreendimentos, passaram a incentiva-los, com o grau de incentivo e a escala dos empreendimentos variando muito de caso a caso.

O Paradigma do planejamento e projeto urbanos mudou, passando do controle à produção de um ambiente construído balanceado para um enfoque "mercadológico" de estímulo ao crescimento econômico e à criação de empregos.

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Antigas áreas industriais, terrenos vagos e áreas decadentes deram lugar a grandes complexos imobiliários, seguindo várias estratégias, que variaram de cidade para cidade, tais como:

1. Criação de novos centros comerciais e de negócios (Berlim, Londres, Nova Iorque e Paris)

2. Promoção de eventos internacionais e espetáculos (Baltimore, Barcelona e Lisboa)

3. Construção de novos centros governamentais (Berlim)

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A cidade transformou-se num produto a ser visto, visitado e vendido através da utilização das técnicas de marketing e propaganda.

Os principais beneficiários desse processo foram os proprietários, comerciantes, empreendedores imobiliários e do ramo do turismo.

A atração de uma população abastada para o consumo desse espaço ocasionou um processo de valorização imobiliária e elitização, que ficou conhecido pelo termo inglês gentrification (gentrificação).

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5. Considerações Finais

O Desenho Urbano é um campo multidisciplinar do conhecimento, que se desenvolveu a partir da década de 1960 em muitos países, como reação ao urbanismo e à arquitetura modernistas e à “destruição” a comunidades e a tecidos urbanos tradicionais que esse paradigma ocasionou.

Por outro lado, os Projetos Urbanos Contemporâneos surgiram a partir das circunstâncias político-econômicas do último quartel do século XX, resultando em vários exemplos pelo mundo, trazendo de volta os mesmos problemas da época do Modernismo.

Dessa forma, é importante ressaltarmos as diferenças do campo disciplinar do Desenho Urbano e dos objetivos que o fizeram surgir, e as práticas recentes que se utilizam da conceituação e de parte da teoria desse campo do conhecimento para a sua promoção, mas que de fato ocasionam problemas iguais ou piores do que aqueles que o fizeram surgir.

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6. Referências Bibliográficas

BARNETT, J. (1982) An Introduction to Urban Design. Nova Iorque: Harper & Row Publishers.

DEL RIO, V. (1990) Introdução ao Desenho Urbano no Processo de Planejamento. São Paulo: Pini.

HALL, P. (1995). Cidades do amanhã: Uma História Intelectual do Planejamento e do Projeto Urbanos no Século XX. São Paulo: Perspectiva.

HARVEY, D. (1993) A Condição Pós-Moderna: Uma Pesquisa sobre as Origens da Mudança Cultural. São Paulo: Edições Loyola.

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JACOBS, J. (1961) The Death and Life of Great American Cities. Nova Iorque: Random House.

NOBRE, E. A. C. (1994) Towards a better approach to urban regeneration. Dissertação (mestrado). Oxford: Joint Centre for Urban Design, Oxford Brookes University.

NOBRE, E. A. C. (2000) Reestruturação Econômica e Território: expansão recente do terciário na marginal do rio Pinheiros. Tese de Doutorado. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.

SHIRVANI, H. (1985) The Urban Design Process. Nova Iorque: Van Nostrand Heinhold.

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7. Lista de figuras

Figura 1: Plano da Grande Londres. Fonte: ABERCROMBIE, P. (1945) Greater London Plan. Londres: HMSO. Acervo da Biblioteca da FAUUSP.

Figuras 2 a 5 e 10:Unidade de habitação de Marselha; conjunto residencial francês; Roberto Moses e maquete de Nova Iorque; Conjunto Residencial de Pruitt Igoe, EUA e sua demolição em 1970. Fonte: http://en.wikipedia.org

Figuras 6, 7 e 9: edifício do Ministério de Educação, RJ; Conjunto Residencial de Pedregulho, RJ e Plano de Brasília. Fonte: http://www.vitruvius.com.br

Figura 8: Corte da proposta da via-parque. Fonte: MOSES, Robert (1950) Programa de Melhoramentos Públicos para São Paulo. Nova Iorque: International Basic Economic Corporation. Acervo da Biblioteca da FAUUSP.

Figura 11: Projeto de intervenção em quadra de Bolonha. Fonte: DEL RIO (1990). Op. Cit.

Figura 12: Canary Wharf, Londres. Fonte: DAVIES, Colin (1992) "Critique: on the Waterfront". Progressive Architecture, v. 73, n. 4, abril, p. 122-124.

Figura 13 e 14: passeio marítimo de Barcelona e edifício do “Bundestag” em Berlim. Fonte: o autor, 1994 e 2002.